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2004-07-19
A introdução de mamíferos que não faziam parte da fauna local sem estudo de manejo ou laudo de impacto no ambiente do Parque Estadual da Ilha Anchieta, em Ubatuba (litoral norte de SP), pelo governo paulista em 1983 gerou um desequilíbrio ecológico que compromete populações animais na ilha, principalmente as de aves. Nos 828 hectares do parque, que recebe 60 mil visitantes por ano e é um dos principais destinos turísticos do litoral norte paulista, animais como sagüis, capivaras e cutias disputam alimento e afastam a fauna nativa -as aves acabam não se fixando-, além de afetar a recuperação de trechos degradados da mata atlântica. Para contornar o problema, o Instituto Florestal, que administra o parque, cogita até introduzir na ilha outro mamífero, possivelmente um predador felino. Por ali já não se vêem mais ninhos de arapongas, tucanos, saracuras, pintos-do-mato e papagaios de todas as espécies, devido principalmente à predação pelos sagüis. Segundo um dos principais pesquisadores que estudam a ilha, o biólogo Mauro Galetti, os sagüis já devem ter atingido seu limite de população na ilha. Galetti é professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista) e um dos responsáveis pelo projeto Bioma, que tenta fazer um censo dos animais em parques florestais com vegetação de mata atlântica no Estado de São Paulo.

Década de 80

Exatamente 95 mamíferos foram levados à ilha pela Fundação Parque Zoológico de São Paulo na década de 80, para que fosse montado um parque com animais soltos no litoral norte paulista. Segundo o biólogo Marcos Rodrigues, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), as aves não conseguem fixar ninhos no local, pois seus ovos são consumidos pelos animais estrangeiros. Pela proximidade do continente, a cerca de 500 metros da ilha, as aves podem até sobrevoar o local, mas não conseguem se estabelecer. E esse é apenas um de uma série de desequilíbrios. Os morcegos, conforme pesquisa de Ariovaldo Neto, professor de zoologia da Unesp, apresentam, em média, 20% a menos do peso de indivíduos semelhantes em outros trechos de mata atlântica. Isso porque todos se alimentam de frutas, muito escassas dada a concorrência sobretudo com os sagüis, que também atacam ninhos de pássaros. Outro animal que sofre com a falta de alimento é a cobra jararaca. Devido à extinção de ratos silvestres, os répteis são obrigados a se alimentar exclusivamente de moluscos e pequenas aves, o que acarreta um nanismo em tais espécies, segundo Galetti. No local, a atividade predatória de sagüis e quatis também deixou populações de anfíbios reduzidas.

Vegetação

A vegetação também sofre com o excesso de algumas espécies. As capivaras, por exemplo, elegeram as bromélias como alimento preferido na ilha. As cutias, em geral benéficas por serem grandes dispersoras de sementes, apesar de se alimentarem delas, não deixam muito para germinar no solo. De acordo com Galetti, a concentração de sagüis, que pode chegar a até 1.200 indivíduos espalhados pela ilha, é seis vezes superior à maior já encontrada em áreas de mata atlântica. Além da renovação da mata, o uso de sementes como alimento pode ser responsável pelo retardo da recuperação de partes da ilha que foram desmatadas no passado. O local se tornou reserva ambiental em 1977, mas antes havia sido desmatado. A mata original deu lugar à criação de caprinos. De acordo com Galetti, áreas semelhantes de mata atlântica já apresentam floresta secundária hoje, ou seja, estão bem adiante no processo de recuperação da cobertura vegetal. (Folha de São Paulo, 18/07)

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