Mercado de carbono e Protocolo de Kyoto
2004-07-14
Desde o primeiro lançamento de fumaça de uma chaminé no início da Revolução Industrial, em pleno século XVIII, o acúmulo de gases tóxicos decorrentes de atividades humanas na atmosfera vem crescendo de forma assustadora. Esses gases funcionam como bloqueadores, impedindo que parte dos raios infravermelhos se disperse pela atmosfera, gerando um aumento na temperatura da Terra, o que é denominado efeito estufa.
O aquecimento global, uma preocupação mundial, foi a alavanca para discussão das mudanças climáticas do planeta. Nesse cenário, surge o Protocolo de Kyoto, que tem como escopo estabelecer as obrigações em termos de redução da emissão dos gases estufa, no período de 2008 até 2012. O Protocolo estabelece que os países contidos no anexo I -- países desenvolvidos - deverão reduzir em 5% a emissão dos referidos gases, uma meta ousada, dada a preocupante condição ambiental presente.
Os países constantes do anexo I eram responsáveis por 55% das emissões globais em 1990. Para entrar em vigor, o Protocolo deve ser ratificado por pelo menos 55% dos países do Anexo I - o que ainda não ocorreu. Os Estados Unidos já declararam que não irão ratificá-lo, fazendo com que a Rússia, com 17% das emissões mundiais, seja o único país que possa dar efetividade ao Protocolo. Há que se considerar que as emissões russas, entretanto, tiveram uma queda extraordinária em função da desorganização de sua economia que se seguiu ao fim do comunismo.
O Protocolo de Kyoto definiu mecanismos que possibilitam a redução da emissão dos gases pelos países listados no Anexo I, dentre eles, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O MDL, exposto no artigo 12 do protocolo, permite que os países do referido anexo implementem projetos que reduzam, não emitam ou seqüestrem a emissão nos países não listados no referido anexo. Este resultado será convertido em Certificados de Emissões Reduzidas (CERs). Cada CER corresponde a uma determinada redução métrica de emissões de dióxido de carbono (CO2) e poderá ser negociada com os países que não conseguirem atingir suas metas.
Por não estar no anexo I, o Brasil não necessita reduzir a emissão de dióxido de carbono e, por emitir menos do que o nível estabelecido, o protocolo permite a troca de cotas de emissão com os países do anexo I, gerando, assim, divisas para o país e, ao mesmo tempo, equilíbrio na emissão no planeta. Ademais, o Brasil pode ser o hospedeiro de projetos de MDL, sendo beneficiado com investimentos nas mais diversas áreas. Essas negociações são chamadas de mercado de carbono.
Apesar das certificações ainda não serem oficiais, o Brasil deve ficar atento porque as negociações envolvendo o crédito de carbono já estão ocorrendo. Diversos países estão buscando novos investimentos com a implementação de projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, dentre eles, os asiáticos, que possuem tradição de oferecerem baixo custo nas instalações.
Os países do anexo I, ao proporcionarem investimentos ecologicamente corretos, onde os ganhos deverão ser concretos, tanto para o meio ambiente como para o Brasil, os projetos de MDL criam uma porta para o desenvolvimento sustentável do país. Neste ponto, o Brasil se encontra em vantagem quanto aos demais países em desenvolvimento, tendo em vista que, por ser rico em fontes renováveis de energia, como o sol, o vento e a água, bem como pela riqueza em recursos florestais, possui um leque de opções para tais projetos.
Sem dúvida, o Protocolo de Kyoto estabeleceu padrões para a redução da emissão de gases estufa, porém, as negociações do mercado de carbono ainda geram muitas incertezas, a começar pela falta de ratificação do Protocolo pelos EUA e Rússia. Sem a ratificação de pelo menos um deles, o Protocolo não sairá do papel. A falta de critérios sólidos para expedição dos Certificados de Emissões Reduzidas também é preocupante, mas a verdade é que o mercado já começa a se agitar e o Brasil, um dos potenciais maiores beneficiados dos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo, não pode ficar fora dessa. (Valor on line, 14/07)