Malvinas prevêem crise econômica diante da queda da pesca
2004-07-14
Desde que as forças britânicas expulsaram o exército argentino invasor das Ilhas Malvinas em 2 de junho de 1982, os moradores de Stanley, capital da ilha, comemoraram o Dia da Libertação com um desfile organizado pelo governo e um banquete grátis na prefeitura. Mas esses benefícios poderão em breve virar coisa do passado. A base do milagre econômico do distante arquipélago nas últimas duas décadas - sua indústria pesqueira - está começando a desmoronar. Pela primeira vez desde o fim da guerra o conselho legislativo, que dirige os assuntos dos 2.700 habitantes das Malvinas, está em déficit: cerca de 10 milhões de libras (US$ 18,6 milhões), o equivalente a 25% de seu orçamento total. E os problemas das Malvinas devem continuar pelo menos por mais um ano, mas os moradores não esperam um contágio. — Certamente não estamos como a Argentina, diz Mike Summers, um dos oito conselheiros legislativos das Malvinas. — Isso é um problema, não uma crise. E não devemos nada a ninguém no mundo. Mas a mera existência de um buraco no orçamento de um território habituado a superávits causa preocupação. O governo da ilha tira 55% de sua receita anual - cerca de 24 milhões de libras - da venda de licenças de pesca, principalmente para navios estrangeiros. Mas pela segunda vez em três anos o governo este ano teve de encerrar as concessões mais cedo e devolver quase a metade das taxas devido a um inexplicável colapso nos estoques de lulas. Os cientistas atribuem a escassez a mudanças temporárias no clima e nas temperaturas oceânicas. Mas ninguém pode dizer se as lulas vão voltar, ou se já foram pescadas em excesso e estão desaparecendo. Com reservas de 90 milhões de libras, o governo pode suportar até uma recessão econômica duradoura. Mesmo assim, implementou cortes orçamentários gerais. Entre os mais polêmicos está o corte de 50% na verba de férias que cada morador recebe anualmente para viajar ao exterior, para 180 libras. Devido a seu pequeno tamanho e abundante riqueza das ilhas, o governo é o maior empregador, dirigindo tudo, desde o supermercado e o hotel da cidade até as instalações médicas e esportivas. — Tivemos de cortar o creme, diz Michael Harte, assessor econômico do conselho legislativo. — Em longo prazo talvez seja uma boa coisa, porque nos obrigará a desenvolver mais rapidamente atividades não-pesqueiras. Desde o final do conflito, as Malvinas passaram de um protetorado britânico varrido pelo vento com criadores de carneiros pobres para uma das economias mais ricas do mundo, embora uma das menores. Graças ao gosto dos japoneses e espanhóis por lulas e à decisão do governo britânico de permitir a venda de licenças de pesca, a economia cresceu 13 vezes em duas décadas. O Produto Interno Bruto per capita de 26 mil libras é comparável ao da Suécia ou dos Emirados Árabes Unidos. A mentalidade de progresso econômico é tão generalizada que muitos kelpers, como se chamam os moradores devido a suas origens na colheita de algas, possuem veículos todo-terreno. O choque financeiro é facilmente administrável, mas existem riscos. — Somos uma economia robusta, mas não muito resistente, disse Harte. — As percepções importam muito, e como somos tão pequenos algumas medidas erradas podem ter um impacto desproporcionalmente grande. Enquanto isso, o governo local achou difícil afastar os habitantes da pesca, que subsidia o desenvolvimento de novas atividades como turismo ou mineração. Stuart Wallace, diretor da Fortuna, uma companhia de pesca de direção local e espanhola, e um dos empresários mais ricos de Stanley, diz: — É como Churchill disse. Se isso for uma bênção disfarçada, está muito bem disfarçada. Mais que a redução dos estoques de peixes, os moradores dizem que a maior ameaça econômica vem das renovadas tentativas da Argentina de impor suas alegações de soberania às ilhas. Depois de uma década de melhoria nas relações, que incluíram a suspensão em 1999 da proibição de turistas argentinos, o presidente Nestor Kirchner assumiu uma abordagem dura nas negociações para normalizar as relações. Este ano ele bloqueou as tentativas dos habitantes das Malvinas de aumentar os vôos para o continente sul-americano, negando a uma companhia aérea chilena permissão para voar no espaço aéreo argentino. A decisão provocou uma disputa diplomática com o Reino Unido e impediu o crescimento da relativamente nova indústria de turismo, a segunda maior fonte de renda das ilhas. Kirchner quer que as novas rotas para Stanley sejam servidas por uma companhia argentina, o que os moradores consideram inaceitável. (EFE 14/07)