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2004-07-05
Décio Luiz Gazzoni (*)
Duas notícias recentes chamaram-me a atenção. Uma referia-se à produção de bioplásticos, a partir de óleos vegetais, com a dupla vantagem de serem biodegradáveis e com menor custo industrial. A segunda remetia à entrada em operação de uma planta industrial de ácido polilático de dextrose de milho fermentada, com posterior polimerização catalítica. O novo produto substitui derivados de petróleo em embalagens, garrafas plásticas, PET, celofane, derivados de polietileno, entre outros. Examinadas do ângulo dos negócios atuais, as duas notícias perdem-se entre outras mais importantes. Porém, do ponto de vista estratégico, como opúsculo de um iceberg futuro, ambas merecem muita reflexão, pelo impacto que terão na agropecuária deste século.

Vetores
Dez entre dez estrategistas internacionais apontam a biotecnologia como o paradigma científico do século XXI, tal qual a química e a física alavancaram o progresso do século XX. Como em toda a revolução de usos e costumes, a saída de cena de um modelo dominante e a ocupação do espaço por um novo arquétipo, é acompanhada de turbulências, contestações e inseguranças. Este é um comportamento típico de seres humanos (e de outros animais também), que preferem transitar em um terreno que conhecem e dominam a enfrentar o desconhecido, o que implica em novos desafios. E quem está com seu negócio estabelecido vai lutar com unhas e dentes para evitar mudanças de paradigmas, que nivelem os competidores. Analisando a História da Humanidade, entendo que evoluímos movidos por três grandes forças: necessidade, comodidade e ambição. A necessidade de proteger-se do frio levou o homem pré-histórico a esfolar animais para vestir-se com sua pele. A ambição por ternos de grife tornou Giorgio Armani um milionário. A necessidade de comunicação criou os hieróglifos. A comodidade induz os cientistas a introduzirem, quotidianamente, novas ferramentas na Internet.

Progresso e risco
O progresso é lastreado em inovações científicas. Porém, em toda a inovação, existe o risco de efeitos colaterais não desejados. Assim, alimentos são nutritivos e essenciais à sobrevivência. Porém podem conter princípios tóxicos, como as aflotoxinas, provocar o acúmulo de LDL -colesterol no organismo, favorecendo acidentes cardio-vasculares ou conter alergênicos. Por este motivo, a sociedade exige dos cientistas a caracterização dos riscos de saúde associados aos alimentos, mesmo os tradicionais. Fruto desta pressão social, os novos avanços científicos, embora mais revolucionários, complexos e excitantes no imaginário popular, tendem a ser mais seguros. Quando a sociedade conscientizou-se ex-post do perigo associado ao lixo atômico ou aos agrotóxicos, forçou a implementação da análise de risco. Trata-se de uma ferramenta que avalia ex-ante os riscos imanentes ao uso de qualquer inovação, suportada por embasamento científico inquestionável à luz do conhecimento atual e das dúvidas consideradas razoáveis. Dessa forma, torna-se transparente para a sociedade o custo/benefício de novos produtos ou tecnologias, com delimitação precisa dos riscos associados ao seu uso. Há um evidente contraste com tecnologias desenvolvidas há 50 anos, quando as técnicas de avaliação eram mais rudimentares e a pressão social pela caracterização dos perigos e a transparência na sua comunicação eram incipientes. Isso posto, há um consenso entre os cientistas de que produtos derivados da biotecnologia têm menor probabilidade de embutirem riscos de efeitos adversos não detectáveis.

Qualidade de vida
A química e a indústria farmacêutica sempre andaram de mãos dadas, como a física e a tecnologia da informação são indissociáveis. As aplicações da biotecnologia apontam para uma estreita associação entre inovação e qualidade de vida, no futuro próximo. A biotecnologia estará fortemente associada com outras ciências, sobretudo a química e a física. Como exemplo desta convergência pode-se citar o uso energético do etanol, novas variedades de plantas ou raças de animais, biomateriais e biofármacos como realidades presentes. Já os bio-sensores, os bio-computadores e aplicações nanotecnológicas estão na bancada dos cientistas e vão revolucionar a sociedade da próxima década. À guisa de exemplo, refira-se que, no momento menos de 2% dos veículos são movidos a etanol e menos de 10% das matérias primas da indústria química provêem da biomassa. Uma estimativa conservadora do Conselho Nacional de Pesquisas dos EUA informa que, em 2020, 10% dos combustíveis líquidos e 25% dos produtos de química orgânica serão provenientes de biomassa. Cada vez mais será encurtado o tempo entre a descoberta científica básica e a incorporação de uma nova utilidade pela sociedade. No século XIX, uma inovação tecnológica que envolvesse quebra de paradigmas, demorava 50-60 anos para ser aceita pela sociedade. Em meados do século XX, esse interstício reduziu-se para 30 anos. No século XXI o interregno reduzir-se-á, progressivamente, dos 10 anos atuais para o limite em que as linhas de montagem estarão conectadas aos laboratórios para disponibilizar inovações no mesmo ano de sua descoberta.

Mudança inevitável
Assim como faltará petróleo para mover os carros, sua escassez obrigará a busca de um sucedâneo para a indústria química. Esta é uma revolução silenciosa, que já começou na micro-escala. Seu fulcro é o uso da biomassa para fornecer os átomos de carbono, oxigênio, hidrogênio, enxofre ou nitrogênio quando o petróleo tornar-se caro e, paulatinamente, suas reservas se extinguirem. O rearranjo atômico para, a partir de moléculas naturais, produzir matérias primas para gerar uma utilidade social, pode ser efetuado pela via da química industrial ou do bioprocessamento. Esta última técnica ainda está em seu alvorecer, porém as perspectivas são otimistas, prevendo tanto a especialização de animais e plantas para produção de fármacos e outras moléculas essenciais, bioplásticos ou similares, como a transformação posterior de qualquer molécula orgânica (ácidos graxos, carboidratos, proteínas etc.) por meio de microrganismos especializados, usando técnicas de biocatálise, fermentação ou processamento enzimático.

Biomassa e biotecnologia
Esta mudança na base industrial é possível por meio da fermentação, que produz enzimas, aminoácidos, antibióticos, vitaminas, álcoois etc. O que conferirá maior eficiência aos processos fermentativos (que é uma aplicação biotecnológica) será a melhoria dos microrganismos intervenientes, via de regra por processos de transgênese. Hoje, o valor da produção mundial de fermentados é de US$ 5 bilhões, crescendo 8% ao ano. Estudos indicam que esta taxa deve saltar para 15% ao ano ao longo da década, superando 25% na segunda década deste século. Os produtos industriais baseados em óleos transformaram-se em um mercado vigoroso, amparados em catalisadores e outros processos de engenharia química. Com a paulatina incorporação de processos biotecnológicos, os limites deste mercado serão largamente expandidos. É possível aprimorar as oleaginosas, alterando sua fração lipídica, concentrando na produção de óleos de maior interesse, saturando ou dessaturando ligações ou modificando a proporção de isômeros. É possível interferir nos processos metabólicos das plantas, ativando ou desativando genes, introduzindo novos genes que codificam para enzimas ou outras substâncias que tornem o processo mais eficiente. No processamento existe outro campo inesgotável de aplicação da biotecnologia, que permite ganhos de escala e de eficiência, substituindo as plantas industriais, com enormes ganhos econômicos, sociais e ambientais.

Traçando o futuro
O investimento em C&T na engenharia de bioprocessamento será um dos maiores diferenciais competitivos do mundo de nossos filhos e netos. Uma vez tornadas obsoletas, as atuais plantas petroquímicas contribuirão marginalmente para a formação de riqueza do porvir. As Nações que dominarem as técnicas de aproveitamento da biomassa para a produção de utilidades requeridas no dia a dia da sociedade, serão as potências econômicas do século. Obviamente, tanto os governos dos países que lideram a economia mundial, como as corporações, isoladamente, dispõem desta visão de futuro e já migram seus investimentos para posicionar-se, adequadamente, no novo perfil de negócios. Essa visão de futuro incorpora três componentes comuns: o reconhecimento de que a biotecnologia será uma fonte quase inesgotável de inovações; o entendimento de que o custo de produtos derivados da biotecnologia cairá dramaticamente com a melhoria dos processos e o ganho de escala; e a necessidade de desenvolver processos seguros ao Homem e ao ambiente. (*) Décio Luiz Gazzoni é Engenheiro Agrônomo e pesquisador da Embrapa Soja. (Agência Brasil 02/07)

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