Relatório de fiscalização expõe fraude no lixo em SP
2004-06-30
Está nas mãos do Ministério Público Estadual e da Polícia Civil a mais contundente prova obtida até agora de que funcionários do Limpurb (Departamento de Limpeza Urbana) e de empresas responsáveis pela coleta e varrição de lixo na cidade de São Paulo têm alterado relatórios de fiscalização para que as contratadas recebam por serviços que não prestaram.
Trata-se de Boletins de Inspeção de Serviços de Limpeza Urbana (BIS) que atestaram a plena execução de alguns serviços antes mesmo da data em que eles deveriam ter sido realizados.
O preenchimento antecipado (e evidentemente fraudulento) só pôde ser comprovado porque um funcionário de uma das empresas contratadas tirou cópias de três boletins preenchidos por ele mesmo antes da execução dos serviços e registrou as tais cópias em um cartório.
O registro foi feito em 27 de julho de 2001, mas os boletins atestavam a execução de serviços previstos para os dias 28, 30 e 31.
Com base nessa denúncia, a Promotoria de Justiça da Cidadania conseguiu dois mandados de busca e apreensão, cumpridos simultaneamente nas sedes do Limpurb e da Cliba Ltda — empresa na qual trabalhava o denunciante do esquema.
Os mandados foram cumpridos em 19 de maio e renderam cinco Kombis lotadas de papel. Foi entre esses documentos que os peritos do Ministério Público localizaram os originais dos boletins antecipadamente preenchidos e registrados em cartório.
Os três BIS em questão foram assinados pelo mesmo fiscal do Limpurb, mas já há indícios de envolvimento de 13 funcionários do departamento em fraudes que envolvem a fiscalização.
Milhões por ano
Os BIS, diferentemente do que fica evidente nesse caso, devem ser preenchidos por funcionários do Limpurb no ato da fiscalização dos serviços, pois servem, depois, de base para aplicação de multas e autorização de pagamentos.
A cada ano, o município gasta cerca de R$ 350 milhões com a limpeza urbana. Mas parte da verba, como se prova agora, vai para serviços dos quais não há nenhum indício de execução, exatamente como o Tribunal de Contas do Município (TCM) alerta a Prefeitura de São Paulo há três anos.
Testemunhas estimam que as fraudes atinjam 30% do gasto com os contratos. Em maio de 2001, porém, o cenário obtido por um monitoramento do Datafolha foi ainda pior: a não-execução chegou a 64% das atividades contratadas e pagas pelo governo.
Os contratos atuais terminam em outubro, mas nada impede que os serviços de coleta sejam interrompidos antes disso, pelo início da concessão da atividade por 20 anos. A licitação da varrição, porém, ainda está suspensa.
Inquéritos
Agora, os BIS antecipadamente preenchidos devem ser uma das principais provas nos inquéritos civil e criminal que apuram as fraudes nos serviços de limpeza.
No Ministério Público, a expectativa dos promotores Silvio Marques, Sérgio Turra e Saad Mazloum é reunir todos os elementos possíveis em até 30 dias, para, então, pedir a interrupção dos contratos em vigor --além da Cliba, a apuração atinge as empresas Vega e Queiroz Galvão.
Na Polícia Civil, o delegado Nicanor Nogueira Branco, titular da 7ª Seccional, apura crime de corrupção e formação de quadrilha.
A Ouvidoria Geral do Município também investiga as denúncias e informa que tem até o início de agosto para concluir sua investigação, mas espera fazê-lo antes disso. A pedido desse órgão, cinco funcionários estão afastados de suas funções.