Petrolífera apóia projeto de biocomércio no Equador
2004-06-18
Uma aliança aparentemente contraditória, entre uma empresa de petróleo multinacional e um programa latino-americano de uso sustentável da biodiversidade, foi anunciada na XI Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), que aconteceu em São Paulo. A subsidiária da norte-americana Occidental Petroleum apoiará a Corporação de Promoção de Exportações e Investimentos (Corpei), do Equador, em projetos produtivos de biocomércio, em uma área de 200 mil hectares de influência da atividade petrolífera nesse país e onde vivem 28 comunidades indígenas. — É interessante que as companhias de petróleo se conscientizem de que devem contribuir para o desenvolvimento comunitário, além de explorarem as jazidas, e, também, fazer com que as comunidades locais não as rechacem por princípio, justificou o presidente-executivo da Corpei, Ricardo Estrada. Esta agência, que tem forte participação privada, desenvolve há cinco anos uma linha de fomento de alternativas econômicas baseadas no uso sustentável da biodiversidade, como ecoturismo e produção de alimentos e ingredientes naturais para as indústrias de cosméticos e farmacêutica. O programa opera como uma incubadora de projetos, ainda pequenos, mas que são o único caminho para ter produtos com valor agregado em um país que dispõe apenas de petróleo e produtos básicos, sem muitas indústrias nem tecnologia, avaliou Giovanni Ginatta, coordenador da Iniciativa Biocomércio Sustentável do Equador. A iniciativa foi lançada em 1996 pela Unctad para apoiar o comércio e os investimentos no desenvolvimento sustentável baseado em recursos biológicos, buscando soluções inovadoras. Por ora, são pequenos os negócios que aproveitam a biodiversidade de forma sustentável, mas seu futuro é promissor, segundo os participantes de um painel sobre biocomércio realizado na terça-feira (15/06) em São Paulo, paralelo à XI Unctad. Na realidade, já existem grandes empresas nessa linha, como as brasileiras Boticário e Natura, multinacionais de cosméticos e perfumes que exportam milhões de dólares e em cujo mercado têm papel importante os ingredientes naturais, principalmente da Amazônia, e os cuidados ecológicos. As oportunidades nessa área são imensas. Plantas medicinais, frutas pouco conhecidas e sementes usadas na produção de bens farmacêuticos, cosméticos e dietéticos tinham em 2000 um mercado mundial de US$ 18,5 bilhões, segundo a Unctad. A maior parte não ocorre de forma sustentável, um critério do biocomércio, mas vem aumentando a exigência de consumidores e indústrias por sustentabilidade, qualidade e segurança sanitária destes produtos. A Amazônia e a Cordilheira dos Andes concentram o maior potencial de desenvolvimento do biocomércio, por sua enorme diversidade biológica. Por isso, um programa na região andina já é impulsionado pela Unctad e pela Comunidade Andina de Nações, formada por Bolívia, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, segundo informou sua secretária-geral, Rosalia Arteaga, acaba de assinar uma aliança com a Unctad que, além de fomentar o biocomércio, será um catalisador das relações bilaterais entre os oito países da região. O programa equatoriano da Corpei inclui, além de ingredientes farmacêuticos e cosméticos, alimentos orgânicos, ecoturismo relacionado com aves, o uso de bambu e a utilização sustentável dos mangues, como o manejo de caranguejos, informou Ginatta. Os projetos, apoiados inclusive com doação de dinheiro para compra de equipamentos e serviços, possuem requerimentos ambientais, sociais, econômicos e legais. — O uso de espécies ameaçadas de extinção, por exemplo, leva à desqualificação, com o objetivo mais de educar do que de excluir, acrescentou. Durante o painel da Unctad também foram apresentados o projeto Mãe Terra, de processamento e venda de frutas amazônicas na Bolívia, e o da Associação de Mulheres de Tanando, do departamento colombiano de Choco, onde 114 integrantes elaboram produtos desidratados de plantas medicinais e cosméticas. — É importante o protagonismo das mulheres, por contribuir para a igualdade de gênero e porque as experiências mostram uma maior quantidade de sucessos quando há forte participação feminina, disse a ministra brasileira do Meio Ambiente, Marina Silva, que presidiu o painel. — O Brasil atualmente trata de definir um contexto legal para o uso e a proteção dos recursos genéticos, com reconhecimento dos direitos das populações tradicionais e de seu conhecimento sobre a biodiversidade, destacou a ministra. O biocomércio enfrenta, além da maior competitividade de produtos que promovem o desmatamento, como pecuária e o agronegócio da soja, por exemplo, a dificuldade de desenvolver seu mercado. O mercado europeu, cuja consciência ambiental demanda bens e serviços sustentáveis, é muito exigente em matéria sanitária, ambiental e de responsabilidade social, destacou Denis Belisle, diretor-geral do Centro Internacional de Comércio. Apesar de ser uma atividade recente e ainda limitada, o biocomércio é dinâmico, já que aumenta sua produção e a demanda, e é fundamental para o desenvolvimento sustentável e melhorias nas condições de vida de muitas comunidades pobres, concluíram os participantes do painel. (IPS/Envolverde)