Entrevista com Hugo Springer, diretor do CNTL
2004-05-26
O conceito de Produção mais Limpa (P+L) tem como objetivo a aplicação de estratégias econômicas, ambientais e tecnológicas integrada aos processos e produtos, aumentar a eficiência no uso de matérias-primas, água e energia, através da não-geração, minimização ou reciclagem de resíduos gerados em um processo produtivo. No Rio Grande do Sul, funciona há 9 anos, o Centro Nacional de Tecnologias Limpas, vinculado ao Senai-RS. Em entrevista, Hugo Springer, diretor do CNTL, dá mais detalhes sobre esse trabalho.
Ambiente JÁ -O que é Produção Mais Limpa?
Springer- É uma estratégia aplicada a um sistema produtivo que permite 04 resultados: aumentar a produtividade das empresas, portanto aumentar a competitividade; fazer tudo isso de uma maneira ambientalmente sadia; aumentar a oportunidade de negócios e permitir que as empresas atendem de modo sustentável as necessidades dos consumidores. Esse conceito permite contemplar que haja desenvolvimento continuado contemplando as dimensões ambientais, econômicas e já uma pouco mais recentemente, sociais.
Ambiente JÁ- Como surgiu esse conceito de Produção Mais Limpa?
Springer- O programa de Produção Mais Limpa foi desenvolvido pela Organização das Nações Unidas (ONU), através de duas entidades, UNEP e UNIDO ou Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), surgido durante a Rio 92. Em 2003 o programa completa dez anos. Os primeiros centros foram inaugurados em 94, o CNTL foi o oitavo na época, começou em 15 de julho de 1995.
Ambiente JÁ- Como surgiu o CNTL e o que faz?
Springer- É uma agência que tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento sustentável. Voltado para uma sociedade como todo e para as industrias. É uma unidade operacional do SENAI, integrando uma rede de 32 centros nacionais de produção mais Limpa, presente em 32 paises. O CNTL está instalado aqui, mas procura estar em outros estados através do Senai, Federação de Indústrias ou Sebrae. Existem hoje núcleos de produção mais limpam em 18 estados brasileiros. No RJ, MT, SC, pela Federação das Indústrias locais, no CE e PE em Universidades Federais. Houve ainda grupos de capacitação coordenados pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), com apoio técnico do CNTL.
No ano passado foram instalados mais 11 núcleos e capacitadas pessoas nesses 11 estados. Os últimos estão terminando agora.
Ambiente JÁ- Como é a estratégia do CNTL para o interior do estado?
Springer- A estratégia de divulgação do programa é levado ao interior do estado de diversas maneiras. Isto pode ocorrer através do CNTL e também através do Senai (55 unidades). Há em andamento um segundo projeto de aumento de produtividade, através de ecoeficiencia para nove setores espalhados pelo estado, compreendendo turmas de até dez empresas e onze pessoas. Até hoje atendemos os setores da indústria gráfica, metal-mecânica, máquinas e equipamentos, madeira-mobiliário, semi-jóias, pequenas galvanoplastias e confecções. Nesse segundo projeto, estamos atendendo mais onze setores, inclusive a construção civil.
Ambiente JÁ- Quando se inicia esse trabalho com determinada empresa, o que se quer primeiro?
Springer- Precisa –se primeiro um desenvolvimento continuado, precisa-se amplia o bolo a ser dividido. O desenvolvimento sustentável precisa ser continuado, a Agenda 21 diz isso. Só que esse desenvolvimento precisa tem que ocorrer em condições sustentáveis. E quais são essas condições: ambiental, social, econômica, política, ética, cultural. Produção mais limpa ou ecoeficiência ou outros sinônimos qualquer.
Ambiente JÁ - Esse programa é voltado para micro e pequenas empresas?
Springer- O do Senai-Sebrae, sim. Mas atendemos também as médias e grandes empresas, nesse caso, diretamente pelo CNTL. No primeiro caso, dentro do grande projeto guarda-chuva da cooperação, SENAI, SEBRAE, que entra com a facilitação financeira. Nas médias e grandes, os custos ficam com as empresas, porque elas geralmente têm condições de custear isso. Qualquer empresa que tiver interesse pode entrar em contato com o SEBRAE/RS. Elas entram com 20% a 30% do custo. O restante fica por conta do Senai que utilizando recursos próprios e do SEBRAE nacional.
Ambiente JÁ- Quer dizer, é um retorno às origens dos recursos?
Springer- É uma maneira barata de dar suporte os micros e pequenas para que se tornem mais competitivas. Mas esse programa compreende as seguintes etapas: os três primeiros meses consistem numa sensibilização, inclusive em empresas concorrente entre si. Isso deve ser levado em conta. Na primeira etapa é feito esse processo em conjunto. Depois um diagnóstico de oportunidades individual de cada empresa. Num terceiro encontro de sete, os representantes de cada empresas juntos. Depois mais seis consultorias individuais, caso a caso, respeitando o sigilo de cada empresa. E por fim, um grande seminário para todos. Mas não é só isso.
Ambiente JÁ- E quando há um conflito entre a questão ambiental e a questão econômica?
Springer- Esse tipo de conflito existe. A necessidade de refletir sobre isso surge no programa. Surge nas empresas individualmente ou em conjunto, como em tudo, a discussão madura sobre isso, contemplando os benefícios maiores que se quer atingir leva a entrada de luz nesse assunto.
E a definição posterior de uma implantação ou solução melhor. Por essas razões que a P + L e desejável que esse assunto seja levado para os atores econômicos por pessoas que tenham experiência sobre isso. Quando esse conflito surge nos temos na nossa equipe, inclusive psicólogos com experiência prática para administra-los e fazer brotar uma solução melhor.
Ambiente JÁ- Qual setor da indústria mais problemático nesse sentido?
Springer- Não estou dizendo que para alguns setores a produção mais limpa é crítica. Mas sim que podem surgir situações, por exemplo, tenho que substituir tal matéria-prima por uma nova mais cara, mas de repente terei menos resíduos formado ou gastarei menos com tratamento de efluente ou reduzir meus gastos com destinação em Aterros. A gente começa a fazer esse exercício e verifica que na verdade, baixa o custo.
Certas atitudes são necessárias para até manter a empresa no mercado. Um programa de Produção Mais Limpa bem implementado pode gerar inúmeras vantagens. Até agora só encontramos vantagens, aliás.
Ambiente JÁ- Como identificar onde atuar?
Springer- Numa empresa já existente se começa pela identificação dos resíduos, vamos tentar eliminar na fonte ou se não conseguir eliminar, tratar de uma maneira melhor, reduzi-los. De qualquer maneira ao longo desse circuito, tu vai obtendo redução de custos.
Bom, se diminuiu custos, aumenta lucro. Aumenta lucro, a empresa ser torna mais produtiva. Há vantagens ambientais, ganhos de saúde, de imagens junto ao público, ganhos com seguradoras. As bolsas de valores adoram essas empresas. Facilitam a exportação em muitos setores. Certos mercados tu não conseguem mais atingir. Certas empresas não conseguiriam mais exportar se não tiverem condutas ambientalmente adequadas. E elas já pedem até para seus fornecedores que pedem para seus fornecedores o que atinge toda uma cadeia produtiva.
Ambiente JÁ- Percebe-se que o argumento mais convincente ainda é o econômico. O ganho ambiental é considerado apenas uma conseqüência pelas as empresas?
Springer- Nos somos um agente para contribuir para o Desenvolvimento Sustentável voltado para a P+L. então nos atuamos sim em sensibilizar as pessoas e empresas, clientes, funcionários, pessoas de governo, que se chama de participar de processos de formulação de políticas. Por isso que existem hoje muitas empresas, não são poucas, que tem o esforço em gestão ambiental, porque com melhores resultados econômicos, mas há muitas que tem a mentalização nos executivos, donos e acionistas que já evoluiu para uma consciência maior.
Muitos atuais executivos tiveram esses valores, tiveram contato com eles na própria formação desde o ensino médio e as gerações mais antigas tem aprendido bem, é claro que há setores que precisam ser mais bem trabalhados.
Ambiente JÁ- O CNTL tem algum tipo de contato ou parceria com ONGs, por exemplo?
Springer- Convênio ou contrato de cooperação formal, não. Mas temos uma boa relação de encontros, reuniões de grupos, de câmaras técnicas que tratam de interesses em comum, como as reuniões do Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA).
Ambiente JÁ - Quantas empresas no Estado já passaram pelo CNTL?
Springer- Até o final do ano passado, 2311 pessoas capacitadas em todos os Estados e em mais 3 países, Equador, Paraguai e Moçambique e 781 empresas de vários setores. No Rio Grande do Sul, os setores atendidos foram metal-mecânica, galvanoplastia, construção civil, metalurgia, alimentos, mobiliários, processamento de couro, industria gráfica, calçados, lojas de papel. Aogra, podem entrar outros setores? Sim, se houver demanda.
Ambiente JÁ- Quais as empresas que obtiveram melhores resultados?
Springer- É difícil dizer isso, porque muitas pedem sigilo nos resultado e temos de respeitar isso.