ALTERACAO NA POLÍTICA DE SAÚDE INDÍGENA AINDA GERA DÚVIDAS
2004-05-11
De resto, o governo pouco fez. Promoveu um polêmico, preocupante e ainda em curso processo de alteração da sistemática de execução dos serviços de atenção à saúde dos índios. Nos mandatos do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, a saúde indígena havia sido reestruturada, passando a ser gerida por meio de convênios regionalizados entre a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), de um lado, e secretarias estaduais, prefeituras municipais, organizações indígenas e organizações não-governamentais, de outro, no âmbito dos chamados DSEIs (Distritos Sanitários Especiais Indígenas). Nesse sistema, a FUNASA pactuava com suas conveniadas linhas de atuação a serem seguidas em cada DSEI, repassava a elas recursos públicos federais e fiscalizava os gastos efetuados. A intenção dos atuais comandos do Ministério da Saúde e da FUNASA é que, agora, esta mesma Fundação execute diretamente as ações do setor em todos os DSEIs, restando a seus parceiros, governamentais e não-governamentais, atuar de uma forma dita complementar, mas que ainda não foi consensu a-da. Novos convênios, portanto, em novas bases, estão sendo propostos e negociados Brasil afora pela FUNASA. Alegando cumprir ordens do judiciário e do Ministério Público Federal, bem como reivindicações dos próprios povos indígenas e de ONGs conveniadas, a atual direção da FUNASA, com essa iniciativa, propõe retornar a uma situação de execução direta que já foi tentada, de modo fracassado, no passado recente e para a qual reconhecidamente carece de recursos humanos qualificados. Acrescente-se que a FUNASA promove essa reforma administrativa sem um processo claro e transparente de debate das novas bases do sistema junto aos povos indígenas e sociedade civil. Embora ainda indefinido, o resultado das mudanças sinaliza na direção da desmobilização social, da desconsideração dos acúmulos e experiências positivas de convênios de gestão dos DSEI – como é o caso do convênio com a organização Urihi, de apoio à saúde do povo Yanomami – e da transferência de ônus administrativos e trabalhistas a ONGs e organizações indígenas de controle social. (Fernando Vianna, antropólogo, assessor de políticas públicas do ISA Brasília. Com a colaboração de Márcio Santilli, Fernando Mathias e Fany Ricardo, do Instituto Socioambiental)