DESCONFIANÇA À SEGURANÇA DOS OGMs NÃO SE BASEIA EM FATOS
2004-05-07
A desconfiança em relação à segurança dos alimentos transgênicos, comum em vários países, inclusive no Brasil, não se baseia em fatos. As análises de risco dos produtos geneticamente modificados ou derivados deles e outros estudos científicos deixam claro que não há riscos em sua produção ou em seu consumo. A discussão sobre a legislação brasileira de biossegurança deve levar em conta o conhecimento existente, para proteger o meio ambiente e a população sem inibir o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Poucas pessoas sabem que a engenharia genética, se bem utilizada, tem enorme potencial para dar mais qualidade de vida às populações. Ela pode aumentar a produtividade agrícola, beneficiar o meio ambiente e melhorar a qualidade dos alimentos e a saúde humana. Diversos exemplos demonstram esse potencial. É o caso de plantas resistentes a insetos, que necessitam de menos inseticidas, preservando o meio ambiente e a saúde humana. Ou de frutos com amadurecimento controlado e, portanto, de melhor conservação e qualidade. Ou ainda de sementes de plantas como soja, milho, canola e arroz, que já tiveram seu valor nutricional melhorado por engenharia genética. A mesma tecnologia também produziu óleos com teor mais equilibrado de ácidos graxos (saturados e insaturados), melhores para o coração, bem como raízes cujos carboidratos auxiliam as funções intestinais. Ao lado disso, sementes enriquecidas com vitaminas e minerais são elementos importantes em programas de saúde pública, já que podem ajudar a controlar as anemias nutricionais, que afetam milhões de pessoas no mundo inteiro. Com tudo isso, deveria haver um grande entusiasmo pela introdução dos transgênicos. Mas, infelizmente, não é o que acontece. Diversas circunstâncias têm gerado desconfiança em relação aos transgênicos, em especial no Brasil. Tal desconfiança, no entanto, não é baseada em fatos e sim na percepção individual equivocada do risco possível. O equívoco se deve tanto a medidas conflitantes de origem governamental quanto ao despreparo da mídia para bem informar seus leitores em assuntos de ponta de ciência e tecnologia, e ainda à falta de educação científica da média da população brasileira. Em resumo, a desconfiança decorre do conhecimento limitado do assunto e das informações pouco esclarecedoras veiculadas pela mídia. Como qualquer tecnologia, a da produção de transgênicos deve ser avaliada criteriosamente, para que sua segurança seja garantida. A ciência e a prática têm mostrado, até o momento, que a produção e o consumo de alimentos transgênicos não acarretam riscos novos em relação aos já existentes nos alimentos produzidos de maneira convencional. A evolução das normas referentes à avaliação de segurança dos alimentos geneticamente modificados, os trabalhos de harmonização dessas normas em nível mundial e os dados experimentais que vêm sendo obtidos nessas análises sugerem que o instrumental disponível para a avaliação é bastante confiável para estabelecer a sua segurança. O risco de ocorrência de efeitos adversos da ingestão de alimentos transgênicos é extremamente pequeno. Isso vem sendo confirmado pelo uso desses produtos em rações animais e na alimentação humana, por muitos anos e em diversos países, sem qualquer registro confirmado de efeito adverso à saúde. No Brasil, por determinação legal, qualquer alimento que contenha organismos geneticamente modificados deve trazer essa informação no rótulo. Mas essa exigência nada tem a ver com a segurança de tais alimentos: a norma apenas garante que o consumidor exerça de forma mais informada e plena o seu direito de escolha. Os alimentos transgênicos já encontrados no mercado em vários países, inclusive no Brasil , foram avaliados e considerados seguros por diversos organismos científicos e órgãos de saúde pública internacionais de grande credibilidade. Vale apontar, porém, que se essa rotulagem obrigatória garante, por um lado, um direito dos consumidores, pode, por outro, se for mal regulamentada, gerar custos desnecessários e instaurar desconfiança. Não há base científica, por exemplo, para impor essa rotulagem a produtos refinados (como açúcar ou óleo) obtidos a partir de plantas transgênicas ou a alimentos em cujo processamento são usadas enzimas produzidas por organismos transgênicos (como acontece em alguns casos na produção de queijos). A exigência também não se aplica à carne de animais alimentados com sementes transgênicas. Esses produtos não apresentam riscos à saúde e, em nenhum desses casos, é possível detectar nos produtos finais a presença de genes modificados, tornando impossível a fiscalização exigida pela lei. O desenvolvimento da biotecnologia é essencial para que o Brasil adquira competitividade em áreas estratégicas, como as de agronomia e saúde. Por isso, é também essencial que a lei sobre biossegurança, atualmente em tramitação no Congresso Nacional, se apóie no conhecimento científico existente, disponibilizado pelos pesquisadores brasileiros às autoridades envolvidas em sua elaboração. Só assim ela poderá garantir a segurança ambiental e a saúde pública sem inibir o desenvolvimento científico e tecnológico. (Ciência Hoje 203)