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2004-04-20
O vale de Baldio das Ferrarias, que circunda a pequena e desconhecida aldeia meridional portuguesa de Ameraleja, é o lugar escolhido para a construção da maior central de energia solar do mundo. Estudos científicos dos últimos cem anos indicam que esta região da comarca de Moura, na região de Alentejo, é um dos lugares do planeta com maior quantidade de horas de Sol por ano. Além disso, o território português, em geral, é o que recebe os raios solares por mais tempo entre os países da Europa, seguido de Grécia e Espanha. Apesar deste dado inquestionável proporcionado pela natureza, o sistema de energia solar é mais difundido na Alemanha, Holanda e Suíça, três dos países mais nublados do continente. Por outro lado, no luminoso e de bastante vento Portugal a energia solar e a eólica são usadas em níveis muito modestos, de 1,6 megawatts, quase exclusivamente na produção de eletricidade para consumo doméstico e de pequenas empresas. Com a decisão agora tomada, a Direção Geral de Energia (DGE) espera dar uma virada radical nessa situação, ao construir mais de cem hectares de painéis solares, com capacidade de produzir 64 megawatts, unidade de potência equivalente a um milhão de watts. Ao converter raios solares em 64 milhões de watts, o projeto português terá uma dimensão 12 vezes superior à da maior central solar existente no mundo, localizada na Alemanha e que produz apenas cinco megawatts. A DGE garante que a construção, iniciada este ano, termine em 2009, apesar das tremendas dificuldades que devem ser superadas, por estarmos diante de uma obra sem paralelo no mundo, como disse o prefeito de Moura, José Maria Pós de Mina, no começo dos trabalhos, em fevereiro. Sua execução será possível graças a um acordo entre a DGE, a Agência Portuguesa de Investimentos, a empresa Amper-Central Solar, de propriedade majoritária do município de Moura, e a BP Solar Espanha, do vizinho país, encarregada da montagem da unidade. O investimento inicial será de dez milhões de euros (cerca de US$ 12,5 milhões) e seu custo total está calculado em 250 milhões de euros, equivalente a US$ 313 milhões. Na fase que já começou, foi instalada uma unidade de fabricação e montagem de módulos voltaicos, que emprega 200 pessoas, entre engenheiros, técnicos, administrativos e operários. A tecnologia fotovoltaica baseia-se em materiais semi-condutores que permitem a transformação direta da radiação solar em energia elétrica. A aplicação terrestre deste sistema atingiu seu auge na década de 70, devido à profunda crise do petróleo que marcou essa época. Entretanto, na década seguinte o mercado internacional de hidrocarbonos se estabilizou e produziu um conseqüente esfriamento do entusiasmo que cercou essas tecnologias. O interesse pelas soluções fotovoltaicas renasceu em 1992, na Cúpula Mundial do Meio Ambiente do Rio de Janeiro, da qual resultou a institucionalização do desenvolvimento sustentável como modelo do progresso. Maria João Rodrigues, pesquisadora do instituto europeu Inteli - Inteligência em Inovação, uma das vozes portuguesas mais autorizadas nessa matéria, afirmou, em um artigo científico divulgado em março, que a tecnologia fotovoltaica sempre se manteve indiferente a estas oscilações de popularidade. — A indústria fotovoltaica, embrionariamente estabelecida na década de 70, continuou nos bastidores na busca incessante da redução do custo e do aumento da eficiência, acrescentou a pesquisadora, que entre 1995 e 2000 assumiu o Ministério do Meio Ambiente do governo socialista de Antonio Gutierrez. A especialista assegura que, comparada com outras tecnologias energéticas, a fotovoltaica representa uma das curvas mais dinâmicas de incremento, ao resultar que entre 1990 e 2002 o volume de produção aumentou cerca de dez vezes, o que representa um crescimento anual médio de 22%. A ex-ministra identifica o exemplo notável da Alemanha, que em 2002 já tinha uma capacidade instalada acumulada de aproximadamente 220 megawatts, sendo também de referência os casos suíço e holandês. Entretanto, insiste que na Alemanha, Holanda e Suíça os mercados não nasceram por si só, mas como resultado de políticas públicas de promoção concatenadas e bem orientadas. A central solar de Ameralejo, aplaudida unanimemente pelos ambientalistas, foi qualificada por diversos analistas como um dos maiores desafios enfrentados pela indústria portuguesa. O gigantesco projeto implica o uso de uma tecnologia de última geração que se traduzirá no assentamento de mão-de-obra altamente qualificada na região, uma das mais pobres de Portugal, que, por sua vez, é o país de economia mais modesta da União Européia. Os cem hectares de painéis que captarão os raios do generoso Sol no vale de Baldio das Ferrarias também terão um efeito tonificante e de reestrutura para a economia local, altamente dependente de uma agricultura em crise profunda, geradora dos mais altos índices de desemprego e emigração do país. (IPS/Envolverde)

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