O LICENCIAMENTO NA REALIDADE: O CASO JACUÍ I
2004-01-12
RESUMO: Destacamos, aqui, a validade de uma análise em relação ao contexto do licenciamento ambiental para a instalação da Usina Termelétrica de Jacuí I .Embora exemplifique o que vem ocorrendo na prática, ficam muitas dúvidas a respeito. O que nos chamou mais a atenção foram as exigências extremamente rigorosas, dando a entender que a Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam /RS), pelo menos no que diz respeito ao seu corpo técnico, foi extremamente cuidadosa e responsável com qualquer assunto ligado às questões ambiental. Em depoimento à jornalista Claudia Viegas, numa reunião do Consema com ecologistas da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN)e da Amigos da Terra,o Secretário estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, Cláudio Langone, bem como o diretor-presidente da Fepam, Nilvo Alves da Silva, reconheceram que a instalação de Jacuí I saturará de tal forma a qualidade do ar da região de Charqueadas (onde fica a Usina),que atingira toda a Região Metropolitana de Porto Alegre, num raio de 40 quilômetros. E mais, irá inviabilizar o estabelecimento de qualquer outro projeto com potencial poluídor do ar nessa área. Cabe, então a pergunta: O que levou as autoridades a concederem a licença? O licenciamento ambiental para a instalação da Usina Termelétrica de Jacuí I foi concedido pela Fepam/RS, em 21 de dezembro de 2001.O processo para a efetivação do empreendimento se arrastava desde os anos 80, por conta de equipamento de tecnologia ultrapassada e dos riscos, provenientes da queima de carvão, ao meio ambiente e à saúde pública. Independentemente da posição de ecologistas e do empreendedor (no caso, a empresa Gerasul), colocam-se pelo menos as seguintes questões:
Segundo explicações dos ecologistas das ONGs Amigos da Terra e AGAPAN- RS, há uma garantia de que, mesmo atendendo às exigências da Fepam, a Gerasul irá utilizar tecnologia ultrapassada na Usina Termelétrica de Jacuí I. Segundo a Amigos da Terra, o problema passou desapercebido pelo fato de a Jacuí I ter sido comparada com outras duas usinas da região - a de Charqueadas e a de São Jerônimo- que poluem acima dos níveis permitidos. Quando compara os dados contidos no Estudo de Impacto Ambiental de Jacuí I e Seival (uma outra termelétrica a carvão, em Candiota), a ONG sustenta que a Jacuí I, que vai gerar 350 megawatts, liberará 3,5 vezes mais material particulado, 12 vezes mais SO2 e duas vezes mais NOx em relação à Seival, que irá gerar 500 megawatts. Além disso, está numa região isolada, com ventos favoráveis, capazes de garantir dispersão, enquanto que a Jacuí I fica na Região Metropolitana de Porto Alegre, que já atingiu o grau de saturação do ar. O professor Flávio Lewgoy, integrante da AGAPAN e célebre no meio ecológico gaúcho por seus estudos a respeito dos danos ambientais causados pela queima de carvão, garante que o número de pessoas doentes e até mortas por problemas respiratórios vai aumentar muito na Região Metropolitana de Porto Alegre. Ele acrescenta que o carvão a ser empregado na Jacuí I contém, inclusive, elementos radiativos, como tório e urânio. Em relação a essa questão, foi simplesmente desconsiderada uma sentença judicial firmada em 5 de dezembro de 1996, que estabelecia condições mais rigorosas em termos de emissões de determinados poluentes, relativamente aos padrões constantes nos termos da licença ambiental dada no dia 21 de dezembro de 2001. ( É procedente, conferir os dados: emissões de SO2, dióxido de enxofre, causador de chuva ácida, previstas na sentença, são de 400 miligramas por manômetro cúbico, enquanto que as previstas no termo de licenciamento são mais de três vezes maiores, 1.250 miligramas por manômetro cúbico). Por quê? Em descumprimento a essa mesma sentença, ou seja, a de 5 de dezembro de 1996, a Fepam não implantou planos de monitoramento do ar na Região Metropolitana de Porto Alegre e no Estado do o Grande do Sul nos prazos de 60 dias e 120 dias, respectivamente, a contar do dia 5 de dezembro de 1996.(Cabe ressaltar que os critérios exigidos na licença praticamente transferem esse monitoramento para o empreendedor, ou seja, para a Gerasul). - Será possível à Gerasul atender todas as exigências feitas nos termos de licenciamento de instalação no prazo estipulado nesse mesmo documento? Ficam mais algumas perguntas:
- Os poucos trabalhadores beneficiados terão prevenção de danos à sua saúde?
Os hospitais da região estarão preparados para atender mais vítimas da poluição do ar?
Será que a relação custo-efetividade desse empreendimento é justa para a comunidade, numa perspectiva de desenvolvimento sustentável, considerando-se que países desenvolvidos estão, aos poucos, banindo o uso do carvão de suas matrizes energéticas, embasados na necessidade de conter o efeito-estufa causado em grande parte pelas emissões de dióxido de carbono?
Em seu discurso, o governador Olívio Dutra , ao frisar que a emissão da licença é uma importante conquista não só para a região, mas para todo o Estado, mencionou a criação de 1,4 mil empregos diretos no pico da obra, ou seja, 800 ao longo dos 24 meses seguintes e 120 na operação plena da termelétrica. Com esse decréscimo anunciado, fica claro que apenas 120 pessoas terão emprego na usina, isto se ela operar a plena capacidade. A ênfase dada que diz respeito à geração de empregos, alardeada em propagandas anteriores com a geração de cerca de 1,5 mil empregos provavelmente responde a algumas perguntas no episódio do licenciamento de instalação da Jacui I. Parece-nos oportuna a análise da situação, no sentido de melhor entendê-la, já que o Ministério Público havia interditado a obra.
No termo de ajuste de Compromisso consta que a Gerasul garante que a tecnologia a ser empregada para o controle das emissões é a melhor possível e permitirá que a usina opere dentro de padrões legais. Conforme o técnico que trata da mitigação dos impactos ambientais, será empregado um precipitador eletrostático, equipamento que coletará partículas poluentes por meio de atração magnética em um filtro. Posteriormente, os gases derivados das emissões passarão por lavadores ou dessulfurizadores, que atacam as moléculas de dióxido de enxofre (SO2), presentes no carvão, por meio de reação química com cal hidratado. Ele explica que a parte hidratada da cal ajuda a abater as partículas de SO2, sendo esta uma técnica adicional ao uso do precipitador. Já as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx) serão controladas por meio de queimadores de baixa emissão, a temperaturas inferiores a 800ºC, bem menores que as temperaturas convencionais de incineração, que ficam na faixa de 1200ºC.