O CIMENTO TAMBÉM PODE SOTERRAR O FUTURO
2003-11-07
Por Monika Naumann (1) e Fátima Somavilla Duarte (2)
Obras viárias como a III Perimetral causam uma série de impactos negativos. O corte de milhares de árvores, que levaram décadas para atingir o porte adulto, é apenas o aspecto mais visível do aumento da deterioração urbana que deu origem ao Movimento PortoAlegreVive. Da forma como foi concebida, a III Perimetral embute uma série de problemas ambientais como o recuo de poucos metros entre as habitações e a via. Em cidades de países desenvolvidos este recuo chega a ser de dezenas de metros, o que diminui os efeitos nocivos da alta emissão de poluentes, de ruídos e de calor. Outro dos argumentos utilizados para justificar a obra é de que está prevista desde 1959. Ora, naquela época a densidade populacional e os problemas ambientais eram muito menores. Efeitos da poluição sobre o organismo humano, o papel da vegetação como regulador hídrico e climático e perda de biodiversidade eram assuntos quase desconhecidos. Hoje estamos suficientemente servidos por avenidas feias e poluídas como a Farrapos e a Assis Brasil; assim, dever-se-ia ter pensado em usos alternativos para a Carlos Gomes e a Dom Pedro II, como aproveitar áreas arborizadas com árvores majestosas como pano de fundo para a criação de um eixo turístico/hoteleiro e de lazer servido por algum tipo de transporte alternativo como o aeromóvel.
O argumento de que a obra resolverá o problema dos engarrafamentos é fragilizado pelo fato de se tratar de uma via de superfície, havendo grande quantidade de pessoas e de veículos que têm que transpô-la a todo instante. E se a sua implementação for acompanhada por uma explosão imobiliária, em poucos anos teremos uma situação muito pior do que a anterior em termos de engarrafamentos e de poluição. No caso da Av. Paulista está situação está levando à fuga das empresas ali localizadas. Outra pergunta: qual é o nível de prioridade real de uma obra destas quando temos diversos outros problemas graves? A alocação de recursos públicos nesta obra implica em que os mesmos não estejam disponíveis para outras necessidades como o combate à criminalidade e o planejamento familiar. Uma característica de obras deste vulto é a de que são viabilizadas por financiamentos internacionais, contribuindo para o aumento da dívida externa. Isto é desejável, considerando-se a já elevada sensibilidade da economia brasileira à volatilidade dos mercados internacionais? Tendo em vista que esta obra foi financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, é chegada a hora deste banco posicionar-se com respeito às questões acima levantadas.
(1) MSc em Gerenciamento Ambiental
(2) BSc em Ciências Jurídicas
(ONG União Pela Vida)