UM ANO SEM LUTZENBERGER
josé lutzenberger
agapan
borregaard
2003-05-15
Passou em branco a data da morte do ambientalista José Lutzenberger, que completou um ano ontem (14). Ele foi um dos pioneiros da ecologia no mundo, ao fundar com Augusto Carneiro, em 1971, a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan). Na década de 80, iniciou uma nova entidade, a Fundação Gaia. No início dos anos 90, assumiu a pasta de Meio Ambiente do Governo Fernando Collor. Paralelamente, ao longo destas décadas, desenvolveu trabalhos para indústrias e governos através de sua empresa, a Vida Desenvolvimento Ecológico Ltda. Lutzenberger também se notabilizou como pensador, proferindo palestras em diversos países do mundo, e tendo recebido o Prêmio Nobel Alternativo. Os jornais diários de Porto Alegre ignoraram a data. A seguir, publicamos artigo do escritor e ator Christian Lavich Goldschmidt, um de seus colaboradores na Fundação Gaia.
LUTZENBERGER
No dia 14 de maio completamos um ano sem a presença de José A. Lutzenberger. Assim como a natureza nos deu esse homem de presente, ela resolveu tomá-lo de volta para si. Então, no dia 15 de maio de 2002 ele foi devolvido à terra, tal como era seu desejo: somente envolto em um tecido. Depois de tudo o que fez pela humanidade, o mínimo que nós seres humanos podemos fazer, é cuidar e preservar todo o ecossistema no qual estamos inseridos, e do qual viemos a fazer parte como uma das últimas espécies resultantes da criação do Universo. Creio que o desejo deste grande homem era darmos continuidade a esta missão tão importante que ele iniciou e para a qual preparou muitos seguidores. Mesmo os que não o conheceram pessoalmente ou os que não tiveram o privilégio de ouvir dele próprio os mais importantes ensinamentos sobre como viver e fazer um mundo melhor a cada dia que passa; mesmo esses, podem e devem ainda aprender muito, pois sua obra é infinita e está à disposição de qualquer um que queira ajudar a construir um mundo melhor e não ficar só em demagogia ou protelando alguma ação para o dia seguinte. Em época de acidentes como o da Empresa Cataguazes de Papel, de Minas Gerais, vale lembrar da luta que Lutzenberger traçou nos anos 70 contra a empresa Borregaard, hoje atual Klabin Riocell. Graças à genialidade de Lutzenberger, a Klabin se transformou em uma empresa de orgulho para os gaúchos, sendo que em uma pesquisa realizada pela revista Amanhã foi apontada como a mais lembrada entre as empresas que se preocupam com a questão ambiental; por isso, cada palavra e cada gesto contam muito na época em que nos encontramos. Precisamos agora, mais do que nunca, hastear a bandeira em defesa da ecologia. Não podemos deixar seus ensinamentos caírem no esquecimento como se fossem simples palestras concebidas para alardear o caos ao qual estamos expostos. Suas teorias em defesa da ecologia sempre foram muito bem fundamentadas - Lutz sempre sabia o que falava - no principio sempre buscava a resposta para suas dúvidas simplesmente observando e interagindo com a natureza e sua biodiversidade, o que para ele consistia em um fascínio imensurável; mais tarde, aprofundou seus conhecimentos através de estudos e pesquisas sempre tendo uma relação de respeito com a fauna e a flora. Lutz sempre foi contra qualquer tipo de ação agressiva que pudesse desestruturar a ordem natural das coisas.
Lutzenberger tinha uma capacidade invejável de perceber as coisas que estavam ao seu redor; era sensível - uma das características mais admiradas no homem - e detestava a hipocrisia, qualidades que lhe renderam muitos desentendimentos e desafetos. Devido a seu gênio ímpar, era muitas vezes incompreendido; porém, os mais sábios sabiam de suas lutas para fazer do homem um ser vivo que utilizasse sua capacidade de raciocínio lógico em prol de todos, sem acabar com a vida das espécies sem capacidade de defesa própria.
Este homem foi um dos mestres da sabedoria e um dos maiores representantes de nosso país lá fora; digno de todas as honrarias que recebeu, não era vaidoso, porém, envaidecia-se quando via algum trabalho seu reconhecido, não que as homenagens a ele rendidas fossem o mais importante. Sentia-se honrado quando via os resultados de seus trabalhos servindo de incentivo para novas gerações aprenderem a viver e a buscarem um equilíbrio com o meio ambiente - essa era sua maior recompensa.
Em toda sua trajetória, uma das coisas que deixava Lutz entristecido, era a falta de interesse pela questão ambiental, principalmente da parte dos jovens. Ele não conseguia entender como alguém pode não se interessar por algo tão importante para a continuidade de sua própria vida. Se dermos continuidade a essa triste devastação estamos arriscando a extinção de nossa própria espécie. Se não cuidarmos de nossa biodiversidade, estaremos descuidando de nós mesmos. Devemos dar início a uma grande campanha através da qual se dê ênfase ao preparo do jovem para a vida e não só para o mercado de trabalho como estão pregando os atuais sistemas capitalistas.