Duas notícias sobre petróleo para entender como o mundo muda para continuar o mesmo. Ambas divulgadas em Outubro de 2013, mas cada uma apontando para lados opostos da questão. A primeira emitida pela tardia potência exploradora. Nosso ufanado Brasil. A outra, originada no país de origem da moderna indústria do ouro negro. Os Estados Unidos.
A primeira, claro, trata da licitação do campo de Libra, o primeiro a ser explorado na chamada Camada do Pré-Sal. Considerada a maior descoberta petrolífera do novo século. Um milagre da tecnologia e da política industrial, possibilitando a produção de 8 a 12 bilhões de barris de óleo e 120 bilhões de metros cúbicos de gás nos próximos 35 anos. Uma verdadeira benção, ou "uma pequena revolução, para o bem, em nosso País", como apregoa o Ministério das Minas e Energia.
Enquanto isso, no lado de cima do planeta, a maldição do petróleo apresenta um quadro digno de halloween. Sintomas como dores de cabeça, nausea, vertigem, lesões de pele, problemas respiratórios, hormonais e sanguíneos, são cada vez mais comuns entre residentes de cidades banhadas pelo Atlântico no Golfo do México. Isso fora um aumento muito acima do padrão observado nos casos de câncer e até de abortos "naturais". A fonte da bruxaria? O desastre da plataforma Deepwater Horizon em Abril de 2010.
Alguns fatos ajudam a entender a extenção dessa benção que virou maldição. Quando a plataforma de exploração a serviço da BP ("Beyond Petroil"?!) pegou fogo, explodiu e afundou a 60 quilômetros da costa de Louisiana, próximo ao delta do rio Mississipi, o óleo jorrou livremente por 90 dias. Um total estimado oficialmente em 5 milhões de barrís. O maior vazamento da gloriosa história do petróleo.
Até hoje a maré negra continua chegando às praias, e alguns relatórios dizem que o vazamento nunca foi estancado totalmente.
Para dispersar o óleo que tomou conta de toda a região costeria, a BP aplicou milhões de litros do dispersante Corexit. Qualquer químico sabe que tanto o óleo cru, quanto o dispersante em questão, contém múltiplas substâncias tóxicas, incluindo compostos orgânicos voláteis conhecidamente carcinogênicos.
Benzeno, Ethylbenzeno, m,p-Xyleno, Hexano e carbonetos poliaromaticos são algumas dessas substâncias. A exposição a elas, dependendo do tempo e da intensidade, causa danos em órgãos como fígado, rins, sistema linfático e sistema nervoso. E tais químicos têm sido detectados em quantidades muito acima do normal no sangue de pessoas que vivem ou trabalham na área afetada pelo acidente.
Mas se o caso da Deepwater Horizon não serve de exemplo para o Brasil, pelo menos que sirva de alerta. O sumário da investigação sobre o acidente mostra que o governo acaba sendo complacente com atitudes irresponsáveis e criminosas cometidas por executivos das empresas envolvidas. Afinal, como costumam dizer os engenheiros: a indústria do petróleo é inerentemente uma atividade de risco.
(Por Mariano Senna, Ambiente JÁ, 29/10/2013)