A hidrelétrica de Tucuruí, no rio Tocantins, foi a última grande obra da ditadura militar. Megalomaníaca. Ergueu-se um imenso paredão de concreto e produziu-se um imenso lago, contra tudo e contra todos. Os objetivos eram “estratégicos”, nos diziam.
Estratégicos para o Japão, por exemplo, que queria se livrar de suas indústrias de alumínio e fazia um movimento para exportá-las, transferindo para o Exterior o peso de produzir energia. A produção de alumínio é a atividade industrial mais eletrointesiva.
Os japoneses prometeram participar da construção de Tucuruí. No meio do caminho, desistiram. Mas ergueram no Pará, mais especificamente em Barcarena, sua fábrica de alumínio. A Albrás está entre as dez maiores do mundo, fornece cerca de 15% de todo o alumínio consumido no Japão. Na vizinhança tem a Alunorte, que produz alumina. E em São Luís do Maranhão tem a Alumar, que produz alumina e alumínio.
Tucuruí saiu com um sobrepreço gigantesco. Atribuiu-se o preço ao “custo Amazônia”, mas Lúcio Flávio Pinto, o jornalista que é autor do livro Tucuruí, a barragem da ditadura, suspeita que tenha havido mesmo “custo enriquecimento pessoal” de envolvidos.
Entre 1994 e 2004, a Albrás recebeu subsídio de U$ 2 bilhões de dólares na energia de Tucuruí que consumiu! Daria para construir uma fábrica nova.
A Companhia Vale do Rio Doce, então nossa Vale, chegou a ser sócia da Albrás. Mas, já privatizada, vendeu sua participação. Hoje a Albrás pertence à parceria entre a Nippon Amazon Aluminium, um consórcio de empresas japonesas, e a norueguesa Norsk Hydro.
A Hydro também controla a exploração de bauxita em Paragominas, no Pará, que transforma em alumina na Alunorte, em Barcarena. A Alumar, instalada em São Luís, pertence à Alcoa, BHP Billiton e RioTintoAlcan.[A RioTintoAlcan é a mesma que pretende produzir alumínio no Paraguai comprando parte da energia de Itaipu. Mas, aparentemente, quer energia subsidiada]
Sem Tucuruí não haveria essas empresas “brasileiras”, por falta de energia.
Por um tempo muitos de nós imaginamos que a Amazônia seria tratada de uma maneira especial pelo governo brasileiro, dadas as suas especificidades. Mas o crescimento da economia coloca o País diante de alguns dilemas sobre os quais, curiosamente, praticamente não existe debate nacional. Uma destas questões diz respeito à construção de hidrelétricas na Amazônia.
Depois do Tocantins (Tucuruí), do Madeira (Santo Antonio e Jirau) e do Xingu (Belo Monte), o próximo rio da região a ser barrado é o Tapajós. Em seus planos, o Ministério das Minas e Energia prevê até 2020 a construção de várias hidrelétricas na bacia do Tapajós-Juruena-Teles Pires.
Em 29 de maio deste ano o Senado aprovou a MP 558, que alterou os limites de sete unidades de conservação, o que, entre outras coisas, viabiliza a construção de hidrelétricas. Um sinal importante — e bem concreto — de que os planos estão andando.
Em Itaituba, no Pará, muita gente espera pela primeira hidrelétrica ansiosamente, acreditando que vai trazer “desenvolvimento”. Mas há os críticos, especialmente os ligados ao Parque Nacional da Amazônia, que perdeu um pedaço onde ficam atrativos que poderiam, no futuro, viabilizar o turismo regional.
Entre os ambientalistas e interessados no assunto, o debate é grande.
Nossa primeira contribuição é reproduzir a entrevista que fizemos com o jornalista Lúcio Flávio Pinto, em Belém, que há 46 anos trata de assuntos relativos à Amazônia. Ele começa falando sobre o projeto do kibutz científico que, acredita, poderia ajudar a mudar a mentalidade ainda corrente de que floresta boa é floresta deitada.
Mas ele trata de outros temas, como o fato de que a Vale engorda enquanto o Pará emagrece. Parte disso se deve à famosa Lei Kandir, que em 1996 isentou do pagamento de impostos os produtos primários e industrializados semi-elaborados destinados à exportação. Que coincidência, no ano seguinte a Vale foi privatizada!
(Por Luiz Carlos Azenha, VioMundo, 29/06/2012)