Quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursou no fim da conferência de clima de Copenhaguen, em dezembro de 2009, de improviso, podia-se ouvir a respiração dos milhares de jornalistas e delegados de tão atentos que estavam. Depois foi a vez de Barack Obama pronunciar-se, mas Lula já havia roubado a cena e passou para a história.
Difícil igualar a desenvoltura, mas a presidente Dilma Rousseff dificilmente será lembrada como uma voz inspirada do desenvolvimento sustentável depois da Rio+20.
Se havia alguma pretensão de ofuscar a ex-ministra Marina Silva neste campo, não deu certo. A ex-rival na campanha pela Presidência da República não conseguia circular pelo Riocentro sem causar tumulto de fãs que queriam uma conversa, um autógrafo ou uma foto. O mundo das conferências ambientais continua sendo a seara de Marina.
A presidente, por sua vez, não ganhou popularidade ao responder rispidamente às críticas da ex-premiê da Noruega Gro Brundtland e de manifestantes feministas que protestaram em relação ao retrocesso no documento final da Rio+20 à menção aos direitos reprodutivos das mulheres. O termo sumiu depois da oposição do Vaticano e de países islâmicos.
Dilma argumentou que no multilateralismo é preciso respeitar a diversidade de opiniões, mas perdeu pontos frente à mulher que cunhou o conceito de desenvolvimento sustentável no mundo.
A ministra Izabella Teixeira protagonizou um bate-boca com manifestantes contrários à usina de Belo Monte e às mudanças no Código Florestal, no evento sobre políticas de combate ao desmatamento. Muito provocada, a ministra deixou os manifestantes falarem, mas não conseguiu conter a irritação.
Até o Itamaraty pareceu perder o controle da situação na madrugada em que queria apresentar o texto aos delegados. A reunião foi convocada às 23h. Às 24h assistiu-se a uma cena constrangedora, com a retirada de todos da plenária para mudarem-se à outra, em frente, como estratégia para retirar jornalistas infiltrados.
A trapalhada reuniu todos, delegados e jornalistas, no hall principal, esperando um texto que só chegaria às 2h15 da manhã. A imprensa conseguiu registrar a irritação dos europeus e falar com os sempre esquivos delegados dos EUA.
Coube ao francês François Hollande capitalizar o maior ibope de um chefe de Estado durante a cúpula. Ele atrasou mais de uma hora à coletiva, a imprensa continuou lotando a sala. Deu seu recado em 13 minutos: insatisfeito com o texto final e com a não transformação do Pnuma em agência da ONU. A secretária de Estado dos EUA Hillary Clinton, que poderia superá-lo, fez passagem meteórica pelo Riocentro e discurso anódino.
O governo permitiu manifestações de ambientalistas e movimentos sociais dentro do Riocentro. Queria promover a imagem de país democrático. Até aí, nada de novo. É prática comum em toda conferência do gênero. Seria estranho se, no Brasil, fosse diferente.
A ministra da Casa Civil Gleisi Hoffmann teve participação discreta em público. Nos bastidores, porém, foi o olho de Dilma enquanto a presidente não desembarcava no Rio.
Na análise do governo, um dos momentos delicados da cúpula foi quando o secretário-geral da ONU Ban Ki-moon criticou o documento final. Dilma pediu ao ministro das Relações Exteriores Antônio Patriota que lhe telefonasse solicitando retratação. Ban Ki-moon atendeu, mas a visão negativa do resultado da conferência prevaleceu.
"Pessoalmente, não tinha muitas expectativas em relação ao texto. Você não pode impor a sua vontade", afirmou ao Valor o chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho, para quem deve-se destacar o fato de a questão social ter sido incluída como um tópico central do documento final. "Esse texto não reflete a posição do Brasil. Ele tem que ser visto como um piso, não como um teto."
(Valor Econômico / IHU On-Line, 26/06/2012)