A diplomacia brasileira, sempre tão ciosa de sua sagacidade e senso de estratégia, cometeu um erro de relações públicas de grandes proporções na Rio +20. Apresentou um texto de negociação pactuado, fechado e desidratado três dias antes do final da conferência. Tempo mais do que suficiente para sociedade civil, Deus, Raimundo e todo mundo acusarem o golpe.
Para as ONGs, foi um presentão. Elas primaram pela ausência no início da Rio +20 e, no Brasil, vivem um período de trevas, com derrota após derrota nas mãos de Dilma, PAC e bancada ruralista. Agora, recebem do Itamaraty e da ONU uma escada perfeita para voltar a afiar o discurso e, quem sabe, ganhar alguns dos corações e mentes perdidos depois da desmobilização geral causada pelo fiasco da cúpula de Copenhague.
Não que alguém achasse realmente que a Rio +20 pudesse produzir um texto bom. Nenhuma negociação entre 193 países é capaz disso. Há coisas melhorzinhas, como o Plano de Ação de Bali ou a Convenção do Clima, e piorzinhas, como a declaração de Johannesburgo (da Rio +10). E não-coisas, como o Acordo de Copenhague, que nem foi adotado pela conferência. Os avanços, quando os há, são incrementais e dificilmente correspondem à urgência do planeta.
A questão é como tucanar o fracasso. No geral, conferências multilaterais deixam isso para a última hora. Assim, os líderes, sejam ministros ou chefes de Estado, conseguem emplacar sua versão de sucesso nos estertores, posar para a foto de família e pegar o avião felizes, tendo exercido a hipocrisia básica do processo democrático.
Ao incorporar o espírito Dilma na segunda-feira e determinar, contra a vontade da União Europeia, que o texto seria fechado naquela mesma noite, com chuva ou com sol, o chanceler Antônio Patriota e o embaixador Luiz Figueiredo candidamente abriram uma porta para o escrutínio amplo e irrestrito do ”Futuro que Queremos” por atores não-governamentais. Deram o resto da semana para iras e oportunismos se voltarem contra o documento, contra a liderança e a condução brasileira do processo.
Não faltou nem mesmo uma campanha da ONG Avaaz no ”Financial Times” que chama Dilma de “Senhora dos Anéis” e pressiona-a escolher as forças “do bem” (representadas por Felipe Calderón e David Cameron) às “do mal” (Hugo Chávez e Putin) no tema dos subsídios aos combustíveis fósseis (eu me pergunto de que lado a Avaaz colocaria Barack Obama no anúncio).
Apesar de o descontentamento não se refletir na plenária, onde o Brasil ganhou elogios mil (e com razão, já que o texto desobriga os chefes de Estado de tomarem decisões difíceis num momento de crise), o pacote do “Futuro que Queremos” já passou para a boca do povo como um fiasco de grandes proporções. E Dilma terá de ter muito “rebolation” para embalá-lo em papel crepom e laço de fita amanhã, no encerramento da cúpula.
(Por Claudio Angelo, Entre Colchetes, 21/06/2012)