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rio 2012/cúpula da terra crise ecológica política ambiental brasil
2012-06-17 | Rodrigo

Há muitos desencontros e muitos déficits na Rio+20 e muito pouco tempo para supera-los. O resultado mais provável é uma solução que estenda as negociações no tempo, lançando ‘processos’ em lugar de anunciar decisões.

Várias reuniões científicas parte da vasta programação da Rio+20 terminaram na última sexta-feira. Em todas elas predominou o pessimismo. Participantes dessas rodadas científicas me disseram que suas conclusões não dão muita margem de manobra a sociedade mundial: várias espécies já passaram o tipping point (o ponto de virada ou ruptura) e serão extintas.

O risco de atingirmos tipping points climáticos aumenta exponencialmente. Esses riscos são iminentes para várias áreas com glaciares, onde o degelo tem se mostrado mais rápido do que as estimativas. Foi uma espécie de reedição da reunião Planet under Pressure (O Planeta sob Pressão), realizada em março passado, em Londres, na expectativa da Rio+20.

Ao receber o prêmio principal ‘e- Award’, do  Instituto ‘e’, da Unesco e da prefeitura do Rio de Janeiro, na noite de ontem, Maurice Strong – que foi o Secretário Geral da Rio 92 – repetiu o que já havia dito no Riocentro: “não temos muito a celebrar”.

Disse também que “o futuro que queremos não será o futuro que teremos, se continuarmos no rumo em que estamos”.  Referia-se ao rumo das negociações em curso no Riocentro. Mas ele disse, também, que sentia uma enorme energia no Rio de Janeiro, uma corrente de otimismo, que o estimulava a continuar no esforço de buscar soluções sustentáveis para o mundo. Esse otimismo das ruas em desencontro com o pessimismo das mesas científicas e o ritmo moroso das mesas de negociação talvez seja uma das marcas mais notáveis da Rio+20.

Há vários desencontros  e déficits na Rio+20. O principal, entre a ciência e a política, se repete nas COPs do clima e da biodiversidade. Os alertas dos cientistas têm como resposta a procrastinação dos governos. No Rio, acentua-se o desencontro entre o discurso da sustentabilidade e as atitudes políticas na negociação de uma estratégia global para o desenvolvimento sustentável.

Há um claro déficit de liderança, principalmente de parte dos países desenvolvidos. Onde há liderança, ela frequentemente se exerce na direção errada. É o que tem ocorrido no G77/China e, especificamente, com o comportamento da China.

A liderança brasileira começou a se fazer sentir mais fortemente nas negociações, desde ontem, porém menos na direção da ambição – como aparece nas declarações – e mais rumo a soluções de compromisso que transferem para o futuro as decisões que não conseguem adotar aqui.

Não há solução boa para os obstáculos econômicos e políticos que impedem um acordo ambicioso pela sustentabilidade na Rio+20. A solução politicamente viável para os obstáculos econômicos, oriundos da crise econômico-financeira, é adiar decisões, seja de compromissos com políticas de mudança no sistema produtivo e no uso de energia e recursos, seja com o financiamento e a transferência de tecnologia para o desenvolvimento sustentável dos países mais pobres e vulneráveis.

Adiar compromissos é também a solução política mais viável para os obstáculos políticos derivados de situações políticas domésticas delicadas (Alemanha e Reino Unido, por exemplo), sucessões complicadas de poder (como na China), eleições incertas (como no EUA), correlações de força favoráveis ao status quo (EUA, Reino Unido, Índia e Brasil, por exemplo).

Também não existe uma forma rápida e eficaz de superar as numerosas limitações da própria agenda da cúpula. Não existe definição consensual para ‘economia verde’, nem consenso técnico e científico do que seriam metas coerentes e consistentes de sustentabilidade, sobre os métodos para quantifica-las ou medir o desempenho em relação a elas.

Igualmente não existe uma proposta consistente e pronta para ser adotada de medida de desenvolvimento, que substitua o PIB. Há acordo bastante amplo sobre as deficiências e distorções insanáveis dessa medida universalmente usada para medir crescimento por meio da estimativa do produto interno bruto. Mas nenhum acordo visível sobre uma medida substituta.

Hoje na coletiva de imprensa sobre o lançamento do ‘Índice de Riqueza Inclusiva’ – um dos candidatos a substituir o PIB – Anantha Duraiappah, da Universidade das Nações Unidas, disse não crer que se consiga substituir o PIB, o que levará décadas para ser feito de qualquer forma. Acredita que se deva complementa-lo com várias outras medidas que alcancem dimensões que o PIB não alcança ou corrijam as óbvias distorções que ele cria.

O IRI (ou IWI, em inglês) busca medir a riqueza dos países por meio de seus “ativos de capital”, incluindo o capital manufaturado, o capital humano e o capital natural. Duraiappah reconhece que há problemas não satisfatoriamente resolvidos ainda para medir capital humano e capital natural.

A amplitude da agenda de questões que a Rio+20 se propôs a discutir e resolver torna impraticável que ela obtenha resultados realmente relevantes na maioria delas. O que se pode esperar é o lançamento de “processos de negociação”, que tomarão mais tempo para chegarem a novas políticas do que a ciência considera seguro.

Eventualmente algumas decisões relevantes mais focadas ainda seriam mais viáveis nesse contexto hostil à substância e relevância dos acordos. Aparentemente, a área mais provável de se chegar a um desses resultados é na regulação da proteção da biodiversidade em águas internacionais.

Algumas dessas questões, nas quais ainda são possíveis decisões mais substanciais, certamente constarão de conversas bilaterais da presidente Dilma Rousseff na reunião do G20, em Los Cabos, na Baja California Sur, no México.

Não é crível que, sendo anfitriã de uma cúpula dessa magnitude, que gerou expectativas tão elevadas e tem tão óbvia importância para a projeção do Brasil como potência emergente, a presidente deixe de tratar dessa agenda em um encontro com as lideranças dos principais governos do mundo.

(Por Sérgio Abranches, Ecopolítica, 17/06/2012)


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