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2012-06-12 | Rodrigo

Decisão da 10ª Vara contempla os "bens imóveis" da ação reivindicatória. Ação foi aberta pela Marinha, que pede posse de território ocupado na BA

O juiz federal Evandro Reimão dos Reis, da 10ª Vara na Bahia, foi favorável à Marinha no processo que solicitou a proibição de qualquer tipo de obra em imóveis implantados na área quilombola Rio dos Macacos, situada em Simões Filho, cidade da região metropolitana de Salvador.

A situação foi alvo de um intenso conflito no fim do mês de maio, quando fuzileiros navais entraram no território para impedir a reconstrução da casa de um dos moradores, demolida pela chuva. A ação foi criticada pelo abuso de maus-tratos, negado pelo órgão.

No processo, acessado pelo G1 nesta segunda-feira (11), o magistrado decide pela "imediata paralisação de qualquer que seja a construção, reforma, modificação, seja a que título for, dos bens imovéis que estão incluídos na demanda reivindicatória". A decisão foi proferida no dia 31 de maio, mesmo dia em que o ofício foi expedido para execução.

O processo, ajuizado pela Advocacia Geral da União (AGU), tem oito réus - que são os moradores que realizam algum tipo de melhoria em suas residências - e, devido à extensão, foi dividido em três partes. A Defensoria Geral da União, que defende os quilombolas, não foi localizada para comentar a ordem.

A representante da comunidade, Rosimeire dos Santos, conta que o oficial de Justiça chegou ao local por volta das 7h, acompanhado de militares navais e policiais federais. Segundo a moradora, mais uma vez os marinheiros utilizaram da violência para abordar os quilombolas.

"Eles vieram entregar o documento, sem avisar, de surpresa. Chamaram meu irmão de vagabundo, derrubaram no chão, com a arma estalada para atirar. Meu irmão estava com uma pessoa ao telefone e entregaram o documento do juiz Evando Reimão dos Reis", relata.

A coação denunciada pelos moradores foi foco de ação do Ministério Público Federal (MPF), que recomendou atuação do comando frente à qualquer tipo de constrangimento "moral e físico" contra quilombolas, expedida no dia 1° de junho. A Marinha tem até o dia 15 (sexta-feira) para se posicionar a respeito de quais  providências serão tomadas para investigar os casos e aplicar medidas disciplinares aos envolvidos.

"A gente quer conversar com [a presidente] Dilma sobre a nossa situação. Perdemos quatro vidas, um deles foi morto por um sargento, em frente ao quilombo. As outras foram depois do despejo, de infarto, na sala de cirurgia, todas com relação [ao conflito]. Temos idosos. Minha filha, que tem quatro anos, não dorme durante toda a noite. Ela tem medo, grita que os homens vão matar", diz Rosimeire dos Santos, que tem quatro filhas. A Defensoria Pública do Estado afirma que 46 famílias residem atualmente no local, ocupado há pelo menos 150 anos.

A Ação Reivindicatória aberta pela Marinha na 10ª Vara Federal pede a reintegração de posse para fins militares. De acordo a Defensoria, o órgão militar quer "expandir" um condomínio usado por oficiais.

A reintegração seria executada em março deste ano, mas foi suspensa por cinco meses para a finalização de um relatório técnico do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) com a finalidade de levantar o tempo em que os remanescente ocupam a área e identificar se o território foi mesmo uma senzala usada pelos escravos, como reconhecido pela Fundação Cultural Palmares.

Já a Marinha informa que a suspensão da execução ocorreu com o propósito de "assegurar a conclusão da articulação com as esferas e instâncias do governo responsáveis por uma retirada pacífica, com realocação segura dos réus". Movimentos sociais afirmaram que a comunidade não teve defesa no processo, afirmação sustentada por Rosimeire dos Santos: "No começo, não tínhamos nada, tivemos muitas falhas, por isso que chegou do jeito que está".

Antiga fazenda
Vilma Reis, presidente do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra da Bahia (CDCN-BA), explicou que a área em que hoje vivem as famílias de quilombolas era fazenda há 238 anos. Segundo ela, em 1972 foram retiradas do local 57 famílias, época em que a Vila Naval foi construída. "Até hoje essas famílias expulsas estão encostadas no muro, porque nunca perderam o vínculo com a comunidade", disse.

Vilma Reis retrata que a fazenda pertencia à família Martins, por décadas dona de grande parte do território do recôncavo baiano, mas que abdicou da propriedade de São Tomé de Paripe com a decadência do açúcar.

"Foram se envolver em outras atividades, mas os quilombolas permaneceram no local. Se for lá, ainda vê os restos de fazenda, das correntes e de todo o material que servia para a tortura [dos escravos]. O laudo da Marinha mostra totalmente o contrário", descreve.

(Por Tatiana Maria Dourado, G1, 11/06/2012)


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