Expectativa é que presidente barre dispositivos que reduzem a proteção às águas brasileiras. Bancada ruralista comemorou aprovação, por 274 votos a 184, mas já prepara projeto para se contrapor a veto
O plenário da Câmara dos Deputados impôs ontem uma nova derrota ao governo ao aprovar, por 274 votos a 184, o texto do deputado Paulo Piau (PMDB-MG) que reforma o Código Florestal Brasileiro. O projeto atende à bancada ruralista, mas a discussão ainda não se encerrou.
Já esperando a derrota, o governo havia mobilizado senadores aliados para que apresentem novo projeto para disciplinar o tema.
Isso será necessário porque a expectativa é que a presidente Dilma Rousseff vete boa parte do texto da Câmara, em particular os dispositivos que cedem demais ao agronegócio e reduzem a proteção às águas brasileiras.
Em seu lugar, o governo pode editar medida provisória que retoma o espírito do texto aprovado anteriormente no Senado, defendido pelos grupos ambientalistas.
"O primeiro sentimento é que a segurança jurídica e o tão procurado equilíbrio entre ambiente e produção não foram alcançados", disse à Folha a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, sobre o resultado da votação.
A bancada do agronegócio, por sua vez, comemorou a votação, e também já tem uma estratégia traçada caso se confirme o veto presidencial.
A ideia é apresentar projeto de lei com previsão de flexibilização da obrigatoriedade de recuperar florestas em margem de rio, principal polêmica do texto de ontem. Os ruralistas querem obter a totalidade da chamada "anistia" para essas áreas, ou seja, a dispensa de reflorestamento para todos os desmatamentos feitos até julho de 2008.
Piau havia retirado a previsão, aprovada pelo Senado, de que os agricultores deveriam recompor um mínimo de 15 metros e um máximo de 100 metros das margens dessas matas, conhecidas como de preservação permanente.
Sob o argumento de que regimentalmente não era possível fazer essa mudança, o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), determinou ao relator que devolvesse ao texto a proteção.
Piau o fez, mas reinseriu um parágrafo do projeto do Senado que limitava a recuperação das áreas de proteção. Na prática, o reflorestamento fica reduzido de 100 metros para 15 metros a partir das margens dos rios.
Outras mudanças aprovadas no texto do Senado que desagradaram ao governo foram a retirada da proteção às matas em área urbana, de interesse da indústria, e a exclusão de apicuns e salgados (parte do manguezal) da categoria de área de preservação permanente.
"Meu governo"
A novela do código, que se arrastava na Câmara desde 2009, voltou a escancarar a guerra entre os dois maiores partidos da base governista, o PT -contrário ao texto de Piau- e o PMDB -favorável.
O líder peemedebista, Henrique Eduardo Alves (RN), desafiou o Planalto ao discursar sobre o código, lembrando a votação "histórica" do código na Câmara em 2011 -quando Dilma sofreu sua primeira derrota parlamentar.
Arrancou aplausos ao dizer que, de 78 deputados do PMDB, 76 estavam no plenário e a favor do texto de Piau. E referiu-se pelo menos três vezes ao governo federal como "o meu governo". "O governo é ambientalista, mas também é ruralista, é pecuarista."
E provocou o líder do PT, Jilmar Tatto (SP), que havia criticado Piau: "Compreendo sua posição, mas uma discussão não se vence impondo nem ameaçando, nem enganando, nem iludindo", disse Alves.
O petista devolveu: "Se fôssemos um país parlamentarista, derrotar governo é cair do gabinete".
(Por Claudio Angelo e Márcio Falcão, Folha de S. Paulo, 26/04/2012)