A indústria mundial de armas nucleares é financiada e mantida viva por mais de 300 bancos, fundos de pensão, companhias de seguros e gestores de ativos, segundo um estudo divulgado pela Campanha Internacional para Abolir as Armas Nucleares (Ican). Estas instituições realizam substanciais investimentos na produção de armas atômicas.
O estudo, de 180 páginas, diz que as nações com poderio nuclear gastam mais de US$ 100 bilhões ao ano fabricando novas ogivas, modernizando as velhas e construindo mísseis balísticos, bombardeiros e submarinos para lançá-las.
Grande parte deste trabalho é feito por corporações como BAE Systems e Babcock International, na Grã-Bretanha, Lockheed Martin e Northrop Grumman, nos Estados Unidos, Thales e Safran, na França, e Larsen & Toubro, na Índia.
“Instituições financeiras investem nestas companhias fornecendo empréstimos e comprando ações e bônus”, afirma o documento, considerado o primeiro de seu tipo. Com o título Dont Bank on the Bomb: The Global Financing of Nuclear Weapons Producers (Não confiem na bomba: o financiamento mundial dos produtores de armas nucleares), o estudo fornece detalhes das transações financeiras com 20 empresas intensamente envolvidas na fabricação, manutenção e modernização das forças atômicas norte-americanas, britânicas, francesas e indianas.
É necessária uma urgente campanha coordenada mundial pelo desinvestimento em armas nucleares, destaca o informe. Um movimento assim poderia ajudar a frear os programas de modernização e fortalecimento de armamentos e impulsionar as negociações para uma proibição universal desse tipo de bombas.
“Deixar de investir nas companhias de armas nucleares é uma forma efetiva de o mundo corporativo avançar para a meta de uma abolição nuclear”, indica o estudo.
O trabalho exorta as instituições financeiras a deixarem de investir na indústria armamentista atômica. “Qualquer uso de armas nucleares violaria o direito internacional e teria catastróficas consequências humanitárias. Ao investir nos fabricantes, as instituições financeiras estão, na verdade, facilitando a construção de forças atômicas”, alerta.
Na introdução do informe, o arcebispo anglicano sul-africano Desmond Tutu, prêmio Nobel da Paz, afirma: “ninguém deveria obter lucro com esta terrível indústria da morte, que ameaça a todos nós”.
Tutu exorta as instituições financeiras a apoiarem os esforços para eliminar a ameaça atômica, e destaca que o fim dos investimentos foi vital na campanha para acabar com o apartheid (sistema de segregação racial contra a maioria negra) na África do Sul. A mesma tática pode e deve ser empregada para enfrentar a criação mais maligna do homem: a bomba nuclear, sugere.
Por sua vez, Tim Wright, diretor de campanhas da Ican e coautor do estudo, disse à IPS que algumas das instituições identificadas no trabalho já expressaram sua “intenção de adotar políticas proibindo os investimentos em fabricantes de armas atômicas”. A campanha para que cessem os investimentos “provavelmente terá maior êxito em países onde a oposição às armas é mais forte”, por exemplo, nos escandinavos e no Japão, acrescentou.
Wright destacou que cada vez mais bancos reconhecem que se deve aplicar algum tipo de critério ético aos investimentos, e que apoiar a fabricação de armas capazes de destruir cidades inteiras em um instante é algo claramente contrário à ética.
Das 322 instituições financeiras identificadas no informe, cerca da metade tem sede nos Estados Unidos e um terço na Europa. O estudo também denuncia instituições da Ásia, Austrália e Oriente Médio.
As mais envolvidas com a indústria de armas nucleares são Bank of America, BlackRock e JP Morgan Chase, nos Estados Unidos, BNP Paribas, na França, Allianz e Deutsche Bank, na Alemanha, Mitsubishi UFJ Financial, no Japão, BBVA e Banco Santander, na Espanha, Credit Suisse e UBS, na Suíça, e Barclays, HSBC, Lloyds e Royal Bank of Scotland, na Grã-Bretanha.
Consultado sobre se seria viável uma campanha para boicotar estas entidades, Wright declarou à IPS que “se os bancos resistirem a ceder, os clientes terão que buscar alternativas éticas”. Muitos outros bancos, particularmente pequenos, negam-se a ter qualquer ligação com esta indústria, destacou.
“Se as pessoas começarem a debandar em massa, isto enviará um forte sinal ao banco, de que seu apoio às companhias de armas nucleares é inaceitável. No caso das instituições multinacionais, uma campanha coordenada de boicote em vários países seria efetiva”, acrescentou.
O estudo também cita Setsuko Thurlow, sobrevivente da bomba atômica lançada pelos Estados Unidos sobre a cidade japonesa de Hiroshima em 1945, que fez um apelo para que se invista de forma ética e para não se contribuir com atividades que ameacem a Terra.
(Por Thalif Deen, IPS / Envolverde, 06/03/2012)