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ponta do coral hantei plano diretor de florianópolis
2012-03-02 | Rodrigo

Assunto: Ponta do Coral / De: arquiteto e urbanista Loureci Ribeiro, membro da Câmara Setorial de Meio Ambiente e Saneamento do Fórum da Cidade / Para: Lisandra Nienkotter, editora-chefe do Grupo RBS – Santa Catarina / c/c: Aos demais redatores dos telejornais e blogs da cidade e região

Aos Foruns Sociais da Região

Caríssima Senhora,

No dia 24 de fevereiro de 2012, sexta-feira passada, fui procurado por um jornalista da redação do RBS Noticias – Florianópolis para que pudéssemos nos manifestar sobre a Ponta do Coral, visto que estava pautada a reportagem para ir ao ar no período da noite, às 19 horas, no Jornal RBS Noticias.

De imediato, manifestamos ao jornalista nosso constrangimento com o tipo de cobertura parcial que vem sendo feita pelo grupo RBS sobre a questão da Ponta do Coral. Tema este que trata de questões dos Direitos da Política Urbana e Ambiental, da Função Social da Propriedade e dos Patrimônios Naturais, referentes ao debate a respeito do desenvolvimento sustentado da cidade, no uso e ocupação do solo, que – todos sabemos – deve obedecer aos regramentos das Legislações Urbanas e Ambientais existentes.

Legislações estas que deveriam ser protegidas e promovidas pelo grupo RBS e demais órgãos de imprensa, conforme estabelece qualquer padrão mínimo de compromisso ético de exercício do jornalismo sério e imparcial, nos ditames do estado democrático de direitos.

Dito isso, recebemos como resposta do jornalista, que “esse problema da parcialidade foi detectado pela direção da empresa RBS e que por sugestão da mesma, estavam nos procurando para oferecer igual condição de espaço para nos manifestar na reportagem que iria ao ar”. 

Mesmo desconfiados, aceitamos participar da mesma nesta condição, e solicitamos ao arquiteto e professor LINO PERES, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC, que representasse o ponto de vista dos movimentos sociais (visto que nosso ponto de vista é apoiado pelo DAU-UFSC).

Porém, para nossa indignação, o que assistimos foi mais uma edição manipulada e vergonhosa de uma reportagem, onde:

1.  o Editor usou unilateralmente 1/3 da reportagem para apresentar novamente o projeto Arquitetônico da Hantei, que via RBS já era do conhecimento público, por 60 segundos, propagandeando e destacando as suas “qualidades”, sem qualquer questionamento urbanístico deste tipo de uso e ocupação do solo e da área pública, que a RBS sabe existir e com consistencia sobre a implantação do projeto naquela área;

2. a Hantei falou mais 15 segundos, favoráveis ao seu ponto de vista como era de se esperar;

3. a Fatma falou 7 segundos, sem emitir opinião ao processo em curso de EIA/RIMA, apesar de já ter se manifestado oficialmente contra este tipo de empreendimento na área quando do processo de debate da aprovação da Lei 180/2005 na Câmara de Vereadores;

4. e, por último, o nosso representante da sociedade civil, falou somente 7 segundos. Além do tempo desigual (75 segundos da RBS/Hantei X 7 segundos nosso), o conteúdo por ele respondido ao repórter (de mais de 2 minutos) foi grosseiramente editado pela redação do Jornal RBS Noticias descaracterizando conteúdo;

Assim sendo, desta forma nosso objetivo central de participação acordado e comunicado ao jornalista, que era prestar informação de interesse público, sobre a polêmica Lei Municipal 180/2005, a qual, de forma irregular e inconstitucional, aprovou a alteração de zoneamento para permitir a obra da Hantei, não foi ao ar.

Isso trocado em miúdos, favoreceu mais uma vez somente aos interesses da Hantei, que agora na marra, via EIA/RIMA, tenta nos impor a aceitação de uma Lei casuística e para tanto só quer tratar dos possíveis ajustes de conduta que no máximo o EIA/RIMO pode exigir.

Por isso viemos a público denunciar que estamos diante de um golpe tramado com o apoio irresponsável do Grupo RBS, que se coloca mais uma vez sem isenção e com imparcialidade a propagandear, contra o interesse público, uma visão única de uso e ocupação comercial daquela área.

Trata-se de uma área importante para o direito coletivo da população para contemplação e uso da paisagem urbana e de integração da cidade com o mar das baias de Florianópolis, que foi interrompido pela construção da Avenida Beira Mar, e sendo que é sabido que a Ponta do Coral é, em conjunto com a Ponta do Lessa, uma das últimas duas áreas naturais restantes de contato da população na Orla da Beira Mar Norte no Distrito Sede  com o Mar.

Essas áreas compõem o patrimônio natural de nossa bela cidade e que estão abandonados pelos gestores públicos, apesar das manifestações dos órgãos da política urbana e ambiental, bem como dos movimentos sociais e população em geral, em defesa da área para o uso público e coletivo.

Diante do fato exposto, e visto que acreditamos que o uso da concessão pública de veículos de comunicação deva cumprir sua função social de utilidade pública, lamentamos novamente o fato ocorrido. Por sua vez, agora de forma pública, solicitamos que se cumpra a função social por parte dos veículos comunicação social na promoção da defesa da legislação federal da Política Urbana e Ambiental, e que não se coloque os interesses financeiros da Hantei e do Grupo RBS, acima dos interesses de toda a sociedade e nossas futuras gerações.

Para tanto, solicitamos sejam promovidas pautas e edições de reportagens e debates no Grupo RBS e demais veículos de comunicação, para que todas as partes envolvidas neste importante tema de utilidade e interesse público possam se manifestar de forma plena e democrática, como se espera dos veículos de comunicação social, no atual estágio de amadurecimento político de organização da sociedade e de sua gestão democrática.

Para nós, o tema da Ponta do Coral é exemplo claro e emblemático da falta de compromisso e vontade política dos Prefeitos e Vereadores com o Patrimônio Natural e o Plano Diretor de nossa cidade, patrimônio este que é a galinha dos ovos de ouro do diferencial e potencial econômico  e turístico de Florianópolis.

Alertamos a todos, que apesar das manifestações e propostas apresentadas pelos nossos movimentos e representantes populares, de gestão democráticas para os usos e ocupações do solo urbano, que garantam desenvolvimento econômico sustentados da sociedade e do meio ambiente, em defesa do bem comum e qualidade de vida digna para todos, o que vem prevalecendo, com a conivência da imprensa, é a destruição da natureza e a privatização do bem comum, fruto da visão única de lucro imediato, privilegiado e exclusivo a qualquer custo, feito pela pressão dos setores imobiliários em conluio com os agentes públicos executivos e legislativos.

Prova disso é a Lei Municipal 180/2005, que alterou o zoneamento na Ponta do Coral, o que é inconstitucional, como já alertava a própria Procuradoria do Município, em 2004 antes da votação, e como foi confirmada pelo SPU-Superintendência do Patrimônio da União, em 2005 e 2011, em correspondências enviadas à Prefeitura, Hantei e Ministério Público. Esta lei é ilegal, pois não compete ao município autorizar a criação de aterro, que duplica a atual área existente, e muito menos para atender interesse de projeto privado.

Denunciamos sem meias palavras que esta Lei promove:

1.     Privatização do Patrimônio Público da Área de Marinha, da faixa de 33m ao logo da orla da Ponta do Coral;

2.     Privilegia à Hantei  ao repassar a atual Área Natural de Marinha para usofruto do projeto urbanístico e equipamentos privados da Hantei;

3.     Ajuste de Conduta como método de legitimar legislação casuística, fazendo irrisórias compensações para aprovar privilégios e irregularidades, que alterou zoneamento e concedeu acréscimo e apropriação de área pública em troca de praça;

4.    Falta de Regramento Comum dos Direitos e Deveres Urbanísticos e Ambientais dos cidadãos quanto ao uso e ocupação do solo urbano, onde para uns tudo podem e aos outros resta o rigor da lei. Essa prática vem criminosamente se perpetuando em nosso município e quando muito são feitas maqueagem de ajustes de conduta para tentar esconder os crimes e privilégios que favorecem meia dúzia de empresários inescrupulosos, grileiros da coisa pública. Lamentável é ainda mais, é a conivência criminosa e interesseira do setor monopolista da mídia em nosso estado. Aqui já há muito esta merece a intervenção do Ministério Publico Federal por abuso de poder econômico e de descumprimento de sua função social de veículos de mídia, que são oriundos de concessão pública e sob lei federal.

É disso que trata agora esse pedido da Hantei de aprovação de EIA/RIMA (estudo de impacto ambiental e relatório de impacto ambiental). É de abuso de poder, de exercício de busca de privilégios, a revelia da lei. Este é o fato que a reportagem do Jornal RBS Noticias tenta esconder, ao não noticiar que a solicitação de EIA/RIMA se dá com base num projeto de construção apoiado na Lei 180/2005, fraudulenta, que permite à Hantei se apropriar da atual Área Pública de Marinha, de valor inestimável dobrando o seu patrimonio na área, em troca de alguns poucos equipamentos públicos de baixo valor, e também na alteração da orla com a criação de 30mil m² de aterro, que inevitavelmente irá causar enorme impacto ambiental e urbano na região e entorno, de forma irreversível.

Quando da aprovação da Alteração de Zoneamento pela Lei 180/2005, convém salientar que este projeto, na sua redação aprovada (diferente da proposta original do vereador Mauro Passos que previa tornar toda a área em Área Verde e de Lazer), não recebeu nenhum parecer favorável, nem do IPUF, FATMA, FLORAM, IBAMA e ICMBio, e muito menos da Superintendência do Patrimônio da União, que são os gestores da Política Urbana e Ambiental e da salvaguarda do Patrimônio das Áreas de Marinha.

Perguntamos à senhora editora do Jornal RBS Noticias:

- Se esta postura autoritária e casuística, que levou a aprovação desta lei inconstitucional viesse de uma Associação de Moradores, de um Movimento Social por Moradia, ou do Movimento Ambiental, qual seria a postura do jornalismo da RBS, seria de jogar a Legislação Urbana e Ambiental Federal no lixo como se vem fazendo????

- Portanto, a quem interessou a aprovação desta Lei????

- Com base em que foi aprovada???

- A quem interessa agora somente discutir na imprensa este EIA/RIMA apresentado sem discutir antes o crime da alteração de zoneamento fraudulenta da Lei 180/2005???

- Porque a RBS esconde este jogo de manipulações e privilégios pretendidos pela Hantei, será pelo fato de que ela é um dos principais clientes do seu grupo empresarial de propaganda???

- Se a Lei 180/2005 foi aprovada, com a falsa justificativa de falta de recursos para se fazer uma praça e equipamentos públicos na orla da Ponta do Coral para a comunidade, porque então este projeto de Praça nunca foi enviado ao Ministério das Cidades, na Secretaria de Programas e Equipamentos Urbanos que dispõe de recursos públicos do Ministério e do PAC???

Nós respondemos que não é falta de recursos o que inviabiliza a construção de equipamento público pela Prefeitura. Neste caso, é sim falta de vontade política., pois se abandonou a área (Prefeitura e Hantei), e assim criaram-se dificuldades e insegurança pública na área, para em seguida, numa ação orquestrada pelos vereadores, prefeito e Hantei, promoverem facilidades e privilégios para poucos!!!

Portanto, não resta dúvidas: Querer resumir o debate da Ponta do Coral ao EIA/RIMA apresentado, é querer de contrabando legitimar a Lei 180/ 2005; é querer reduzir o debate somente aos possíveis ajustes de conduta, e repetimos: Não é disso que se trata o debate sobre o uso e ocupação da Ponta do Coral. Isso, nós da sociedade civil e movimentos sociais da Reforma Urbana e Ambiental, não iremos aceitar, em especial em Ano Eleitoral e ainda mais quando está em curso todo o processo de construção do Plano Diretor Participativo. Isso é oportunismo e golpe no processo de gestão democrática da cidade e o controle social, que estão impressos na Constituição Federal de 1988.

Por último, destacamos que o conjunto das observações e denúncias, acima feitas, fazem parte do processo que demos entrada em dezembro de 2011, junto ao Ministério Público Federal e Estadual, pela instalação de Inquérito Civil Público Investigatório, para apurar nossas denúncias de Crime de Inconstitucionalidade e Improbidade Administrativa, que, ato seguinte, irá embasar nossa Ação Civil Pública contra a Câmara de Vereadores e Prefeito Municipal por aprovarem e sancionar a Lei 180/2005. 

Pois não aceitaremos que só nos reste e ao Ministério Público legislar ajustes de condutas pois o fato ainda não foi consumado e muito menos legitimado pelo poder judiciário e os gestores da política publica urbana e ambiental, que gerenciam, administram e fiscalizam as políticas pública que tratam desta área.

Assim sendo, entendemos haver muito assunto de interesse público em debate na questão da Ponta do Coral, que justificariam a RBS e demais veículos de comunicação social de Florianópolis e região tratarem o assunto com o devido respeito e utilidade pública que o tema exige.

Portanto, desde já nos colocamos à inteira disposição dessa empresa de comunicação e aos demais veículos de comunicação do estado, para o pleno debate responsável, imparcial e democrático das questões levantadas.

Florianópolis, 27 de Fevereiro de 2012
Atenciosamente,

Arquiteto e Urbanista LOURECI RIBEIRO
Membro da Câmara Setorial de Meio Ambiente e Saneamento do FORUM DA CIDADE

(Desacato, 01/03/2012)


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