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2012-02-22 | Rodrigo

O Movimento Nacional de Afetados por Desastres Socioambientais - MONADES - foi recebido em audiência por membros da Secretaria Geral da Presidência da República, do Ministério da Saúde e da Defesa Civil, no dia 15 de fevereiro de 2012.

Os membros do MONADES manifestaram, inicialmente, seu desencanto com a falta da presença de outras áreas de governo, especialmente as responsáveis pela política de moradia, tendo presente que a audiência foi solicitada com o objetivo de apresentar a realidade e debater encaminhamentos sobre o problema do não atendimento ao direito de moradia dos afetados que perderam tudo em diferentes desastres socioambientais.

Em seguida, apresentaram um Documento - publicado na íntegra, logo abaixo – contendo dados da dura realidade enfrentada pelos afetados em todo o país, questionamentos de práticas de corrupção e desvios de recursos públicos e reivindicações e propostas para as políticas públicas em relação aos direitos das famílias afetadas.

Como resultado do diálogo provocado pelo MONADES, vale destacar o compromisso da Secretaria Geral de Governo de promover debates sobre o documento apresentado, considerado excelente por todos os presentes, com as áreas de governo que devem dar resposta ao exigido e proposto pelo Movimento.

Por parte do MONADES, junto com argumentações sobre a urgência necessária, os membros da comissão articuladora colocaram-se à disposição para futuros diálogos, sempre que forem necessários para que sejam efetivadas iniciativas que garantam os direitos dos afetados, especialmente o da reconstrução gratuita das moradias.

Segue a íntegra do documento.

Audiência com Ministérios do Governo Federal

MONADES exige moradia e condições dignas de vida para afetados por desastres socioambientais

1. A REALIDADE

Conhecemos diretamente a situação de vida dos afetados por desastres socioambientais. A grande maioria das famílias que perderam tudo ainda não recuperou suas moradias. E as poucas que o conseguiram, não encontram nelas condições dignas de vida humana. Não oferecem espaço suficiente e adequado para as famílias, tanto nos apartamentos dos conjuntos habitacionais como nas casas. Raramente dispõem de infraestrutura de saneamento e mesmo o serviço de água é precário.

Uma característica inaceitável é a criação de vilas isoladas da população das cidades e da zona rural, distantes de suas comunidades de origem, criando espaços marcados muitas vezes por mais uma discriminação, sendo conhecidos como “vila ou agrovila dos alagados”, “conjunto habitacional dos desabrigados”, “vila dos sem teto”, “conjunto dos sem casa”. Além da separação dos parentes e amigos, as crianças encontram dificuldades de adaptar-se com colegas estranhos, quando há escolas.

Deslocados de seus locais de trabalho, enfrentam dificuldades de transporte, diminuindo o tempo para conviver com a família e a comunidade, para o lazer e a cultura e para exercer verdadeiramente a cidadania. A diminuição ou inexistência da renda do trabalho entra em contradição direta com a política de cobrança de mensalidades por essas moradias.

Isso se agrava ainda mais quando não há acompanhamento psicológico direto às vítimas dos desastres socioambientais, que fragilizam as pessoas, levam à perda de autoestima e induzem a problemas de saúde física e mental de forma permanente. Além disso, praticamente não existem serviços de atendimento à saúde, exigindo deslocamentos penosos e para centros de saúde sobrecarregados e com precárias condições de funcionamento.

Para as famílias que ainda não tiveram seu direito à moradia recuperado, são insuficientes e inaceitáveis os diversos tipos de “bolsas”, pois o denominado Aluguel Social não garante o acesso à casa, e os apoios para alimentação igualmente não garantem o suprimento da nutrição a que todas as pessoas têm direito.

2. PRÁTICAS QUE REVOLTAM

Nessa dura realidade da vida dos afetados, provocam desilusão e indignação as práticas de corrupção e os desvios de verbas e doações destinadas ao enfrentamento dos dramas vividos pelos afetados por desastres socioambientais. Mais ainda quando há devolução de parte importante destes recursos por causa do mau procedimento das autoridades.

Quando se diz que as verbas são aplicadas, não chegam aos verdadeiros necessitados, e todos ficam sem resposta quando procuram saber o que foi feito com eles. A quem cabe a responsabilidade de acompanhar o destino dos recursos públicos?

Há situações, como em Santa Catarina, em que os recursos foram liberados há três anos para que uma empresa construísse casas, e nada foi feito até hoje. Qual a explicação para isso?

Tendo presente tanto descuido por parte do poder público e tanta necessidade da população, é absolutamente inaceitável a prática de repressão e violência contra as famílias que tomam a decisão de ocupar terrenos ou prédios abandonados para garantir moradia e condições dignas de vida.

3. PROPOSTAS

O MONADES é um movimento dos próprios afetados e, por isso, apresenta as seguintes propostas aos responsáveis pelas políticas públicas de prevenção em áreas de risco e de atendimento às vítimas dos desastres socioambientais:

1) Que o setor público reconheça a vontade e a capacidade da sociedade civil organizada de participar ativamente na definição, implementação e acompanhamento das políticas públicas e da destinação de recursos públicos e provindos da solidariedade nacional e internacional destinados ao enfrentamento das situações de desastres socioambientais.

2) Que os afetados participem como sujeitos principais na definição das iniciativas que reconstruirão as condições de vida destruídas pelos diferentes tipos de desastres socioambientais. O MONADES tem como um de seus objetivos animar a organização dos afetados para que sejam protagonistas na luta por seus direitos em todas as instâncias públicas, inclusive o Ministério Público e o Judiciário, e o setor público deve favorecer essa atividade em favor da cidadania dos afetados.

3) Que as moradias sejam construídas fora das áreas de risco, mas que sejam inseridas em comunidades próximas ao lugar de origem, valorizando relações sociais e de parentesco, mantendo os trabalhadores próximos ao local de trabalho e mantendo as crianças nas comunidades escolares anteriores.

4) Em relação às famílias afetadas em áreas rurais, se forem construídas agrovilas, que contem com atendimento à saúde, educação, transporte, segurança, áreas de lazer e cultura e infraestrutura de saneamento, abastecimento de água e transporte. Seja quando estão em agrovilas, ou quando as famílias retomam sua vida e trabalho em propriedades familiares, que tenham garantia de terra adequada para gerar renda suficiente para suas famílias através da produção de alimentos.

5) Que seja garantido apoio e tratamento psicológico e assistência médica às pessoas fragilizadas pelos dramas vividos nos desastres socioambientais.

6) Na situação de perda total vivida pelos afetados por desastres socioambientais, defendemos o direito de casa por casa sem nenhum custo e com prioridade absoluta.

7) Para a construção de moradias, priorizar a organização de cooperativas de afetados, possibilitando sua capacitação profissional, garantido, assim, a qualidade da construção e evitando, sobretudo, os desvios dos recursos públicos.

8) Em vista da prevenção de desastres, que sejam identificadas as áreas de risco e sejam realizadas obras de contenção, manutenção, gestão responsável ou desativação de barragens com risco eminente, desassoreamento de córregos e rios, recuperação e manutenção de manguezais e matas ciliares, ou, quando necessário, que sejam organizadas remoções, sempre com participação dos afetados e sem violência, para áreas próximas e com garantia de moradia e condições de vida digna e de cidadania.

9) Para uma verdadeira política de prevenção e de previsão, são importantes e indispensáveis campanhas educativas, nas escolas e em toda a sociedade; para isso, junto com a atuação das três esferas de governo e a participação da sociedade civil nos conselhos, o MONADES se propõe contribuir nesse processo como uma de suas prioridades.


Brasília, 15 de fevereiro de 2012.

(Blog do Ivo Poletto / IHU On-Line, 16/02/2012)


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