O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu que os pescadores prejudicados pelo vazamento de nafta na baía de Paranaguá (PR), em outubro de 2001, têm direito à indenização por danos materiais e morais. Ao colidir com pedras submersas, o navio N-T Norma, da Petrobras Transpetro, sofreu rompimento do casco, que culminou com o vazamento da substância tóxica.
Ao rejeitar recurso apresentado pela Petrobras, a Segunda Seção do STJ confirmou decisão da Justiça paranaense, que condenou a empresa a indenizar por danos materiais e morais um pescador profissional artesanal que ficou temporariamente impossibilitado de exercer sua profissão devido ao vazamento de nafta.
O caso foi julgado pelo colegiado na condição de recurso repetitivo, conforme previsto no artigo 543-C do Código de Processo Civil (CPC). Assim, embora tenha sido manifestado no julgamento de um processo específico, o entendimento deverá orientar a solução dos outros processos que correm na Justiça e que versam sobre as mesmas questões jurídicas, relativamente ao mesmo acidente.
Em consequência do vazamento, foi decretada a proibição da pesca na região pelo prazo de um mês, o que afetou a vida de cerca de 3.500 pescadores e suas famílias. Muitos pedidos de indenização já foram julgados, mas ainda há um grande número de recursos pendentes de decisão, os quais ficaram sobrestados à espera da posição do STJ.
No processo julgado pela Segunda Seção, a sentença de primeira instância havia condenado a Petrobras a pagar R$ 2 mil a título de danos morais e R$ 350, valor de um salário mínimo da época, como indenização por danos materiais.
Boia deslocada
A Petrobras alegava que a manobra causadora do acidente foi provocada pelo deslocamento da boia de sinalização. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), ao julgar a apelação, confirmou a responsabilidade objetiva da empresa pelo dano ambiental, afastando a alegação de caso fortuito, uma vez que o deslocamento da boia, por si só, não acarretou danos ao pescador.
Para o TJPR, “a colisão do navio trouxe inúmeros prejuízos ao meio ambiente e aos pescadores da região, os quais devem ser reparados”. Diante da falta de parâmetros seguros para aferição da renda mensal do pescador, o tribunal aceitou o valor de um salário mínimo.
Já em relação ao dano moral, entendeu que ele ficou caracterizado ante a impossibilidade de o pescador exercer seu trabalho, “que atingiu valores íntimos da personalidade”. No entanto, o TJPR reduziu o valor do dano moral para R$ 1.800. O tribunal estadual também decidiu que os juros de mora, em relação aos danos materiais e morais, fossem contados desde a data do acidente.
No recurso julgado pela Segunda Seção, a empresa sustentou a tese de que caso fortuito ou de força maior deveriam afastar a obrigação integral de reparar os eventuais danos gerados pelo acidente, excluindo a responsabilidade.
Em seu voto, o relator do recurso, ministro Sidnei Beneti, afirmou que as alegações da empresa em relação à boia de sinalização não afastam sua responsabilidade de transportador de carga perigosa, devido ao caráter objetivo dessa responsabilidade. Segundo ele, incide no caso a teoria do risco integral.
“O dano ambiental, cujas consequências se propagaram ao lesado (assim como aos demais lesados), é, por expressa previsão legal, de responsabilidade objetiva, impondo-se, pois, ao poluidor, indenizar, para posteriormente ir cobrar de terceiro que porventura sustente ter responsabilidade pelo fato”, declarou o ministro, ao afastar a alegação de caso fortuito como excludente de responsabilidade.
Sofrimento acentuado
Ele também reconheceu a presença do dano moral, além do dano material sofrido pelos pescadores. “Como é assente na jurisprudência desta Corte, deve ser composto o dano moral se do acidente resulta sofrimento de monta para o lesado”, afirmou o relator. Para ele, na situação de um trabalhador da pesca que fica impedido de realizar seu trabalho deve ser reconhecido “sofrimento acentuado”, em vez de “mero incômodo”.
A Segunda Seção confirmou ainda a decisão do TJPR em relação aos juros de mora, que, de acordo com a jurisprudência do STJ, correm a partir do evento danoso nos casos de responsabilidade extracontratual. O entendimento está expresso na Súmula 54 do Tribunal.
Sidnei Beneti observou que, conforme os precedentes que deram origem à súmula, os juros moratórios incidirão a partir da citação do causador do dano quando se tratar de responsabilidade contratual. Já no caso de responsabilidade extracontratual, como no processo em julgamento, a incidência dos juros se dá a partir do evento danoso.
O ministro destacou ainda que o julgamento desse recurso repetitivo fixou definições jurídicas para a solução das demandas decorrentes do acidente com o navio da Petrobras em 2001, mas as teses gerais deverão ser consideradas em outros acidentes que causem danos ambientais semelhantes.
(Ascom STJ, 16/02/2012)