Dilma Rousseff teve uma reunião de portas fechadas com movimentos e organizações sociais durante o Fórum Social, em Porto Alegre (RS). A Repórter Brasil teve acesso ao áudio do encontro e este blog reproduz, abaixo, trechos de sua participação na conversa.
É claro que os presentes a questionaram com relação ao novo Código Florestal, aprovado no Congresso Nacional e que tem sido alvo de críticas de cientistas e parte da sociedade civil por flexibilizar a legislação de proteção ambiental, uma vez que a principal temática do Fórum foi o desenvolvimento sustentável.
Diante das reclamações, ela defendeu uma solução de consenso: “Não será, adianto pra vocês aqui, o sonho dos ruralistas. Não será também um código ambiental perfeito. Tem ruralista e tem ruralista, como tem pequeno agricultor que tem horror ao Código Florestal. Principalmente no nosso Sul Maravilha. No Sul Maravilha, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde tem o maior número de agricultores familiares, há um movimento forte pra impedir que tenhamos reserva legal em uma pequena propriedade. Vocês sabem disso. Nós vamos ter clareza disso”.
Na conversa, Dilma afirmou que “num país desigual como esse, você tem que crescer a mais para poder distribuir renda”. Retoma, dessa forma, a fórmula econômica de Delfim Netto, ministro do Planejamento do general João Batista Figueiredo, de “fazer o bolo crescer para depois dividi-lo”.
Esse modelo foi exaustivamente alvejado pelo Partido dos Trabalhadores quando não estava no poder, mas as críticas foram deixadas de lado com o passar dos anos. Em 2004, o então ministro do Planejamento do primeiro governo Lula, o atual ministro da Fazenda Guido Mantega também afirmou algo parecido: “Precisamos, primeiro, conseguir essas taxas de crescimento e, segundo, adotar um estilo de crescimento que distribua essa riqueza” – referindo-se às taxas de crescimento da Índia.
Abaixo, outros destaques da conversa de Dilma com os movimentos e organizações sociais, obtidas pela jornalista Verena Glass, da Repórter Brasil. Para ler a íntegra da transcrição, clique aqui.
Rio + 20
“Eu considero essencial na Rio + 20 discutir um outro paradigma nos seguintes termos: eu não acredito que dê pra ser dentro do Fórum governamental um outro paradigma anti-capitalista. Não dura cinco segundos. (…) Então vocês discutam os novos paradigmas, se vocês quiserem, anti-capitalistas. Agora, nenhum país fará isso. Nenhum país. Nem-um-único! Porque não pode fazer isso. Não pode porque nós temos uma coisa terrível: todos os governantes temos o compromisso de entregar a coisa amanhã. Não é daqui há 10 anos. O meu governo tem que entregar amanhã, tem que ter eficiência sim.
(…) Hoje, quando nós conseguimos constituir uma nova classe média, nós temos obrigação de ser eficiente. E não é tecnocrata, é política”.
Projeto de governo
“Eu queria dizer pra vocês que eu represento um projeto que está sendo levado a cabo desde a eleição do presidente Lula. Este é um projeto que tem alguns desafios e uma grande missão, que é ter um país em que a desigualdade social não seja tão avassaladora como foi desde a sua formação. (…) Essa é uma ambição que explica um pouco o que é a nossa diferença em relação a visões que vocês e a ONU chamam de economia verde. Pra nós não há possibilidade de desenvolvimento sustentável sem redução da desigualdade social.
(…) Num país desigual como esse, você tem que crescer a mais para poder distribuir renda. Porque senhores, nós tratamos de questões práticas. Eu tenho que distribuir renda. Tem 190 milhões [de pessoas] que nós não podemos deixar na situação que estão. (…) Trata-se de fazer, de fato, com que este país tenha capacidade de ter um nível de desenvolvimento que lhe permita distribuir riqueza”.
Reforma agrária
“Eu concordo com o [João Pedro] Stedile [coordenador nacional do MST] que é necessário a gente retomar a reforma agrária num ritmo eficaz. Agora, Stedile, eu quero te dizer uma coisa: eu não vou aceitar que o nível dos assentamentos seja o que é. Quando nós tratarmos do Brasil sem Miséria, eu quero assentamentos decentes neste país. (…) Eu quero produtores, eu quero pessoas vivendo da sua renda. Porque nós sabemos que nós temos, da época do neoliberalismo, uma reforma agrária que deixa extremamente a desejar”.
Mudanças climáticas
“Eu queria dizer pra vocês o seguinte: esse país foi um dos poucos que foi sério na questão da mudança do clima. Eu estive me Copenhague, eu sei como era a discussão entre os Estados. Se a China não está comprometida com tanto, bastiões da defesa ambiental não fazem reduções de 30% da emissão de gases de efeito estufa. Fazem 20%, senão perdem competitividade. Nós assumimos a redução voluntária de 36 a 39%. Nós somos um dos poucos países que não tem matriz energética fóssil. Todos eles [países desenvolvidos] têm problemas. Vendem aos países africanos, por exemplo, que é importante ter energia solar. Energia solar é caríssima. Fazer isso num país africano é crime. Vendem porque suas empresas controlam a energia solar ou eólica, quando alguns deles podem perfeitamente explorar a hidroeletricidade”.
Também estiverem presentes acadêmicos como os sociólogos Boaventura dos Santos Souza, Edgardo Lander e Lílian Celiberti. Eles reclamaram de um suposto neocolonialismo na política externa brasileira e de uma suposta tendência de volta ao neoliberalismo na política interna.
Para saber mais sobre o encontro, clique aqui.
(Blog do Sakamoto, 31/01/2012)