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refugiados ambientais impactos mudança climática catástrofes naturais
2012-01-31 | Mariano

Os deslocamentos populacionais ligados a desastres climáticos e ambientais superaram os provocados por conflitos armados. O que parecia uma ficção reservada a filmes de grande espetáculo se tornou uma realidade durante a primeira década do século XXI.

Um relatório publicado em Genebra pela Organização Internacional de Migrações, OIM, juntamente com o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e de Relações Internacionais, IDDRI, informa sobre este novo fenômeno que afeta todos os continentes. O relatório, State of Environmental Migration 2010, apresenta um quadro de cifras significativo: em 2008, 4,6 milhões de pessoas tiveram que se deslocar dentro de seus países em razão de um conflito armado enquanto outras 20 milhões tiveram que fazer o mesmo devido a uma catástrofe natural.

As cifras não pararam de aumentar: em 2009 houve 15 milhões de refugiados “ambientais” e em 2010 a cifra subiu para 38 milhões. Hoje, o deslocamento climático ou ambiental é a primeira causa das migrações humanas. Estas cifras podem ser contrastadas com o número de refugiados políticos que existe no mundo: 16 milhões de pessoas, 12 milhões sem contar os palestinos.

As destruições ambientais destacadas neste exaustivo trabalho não dizem respeito somente às que poderiam ser denominadas naturais e violentas, mas também os processos mais lentos, que acabam modificando a relação do ser humano com o lugar onde vive. Um exemplo de deslocamento climático involuntário é o que ocorreu no Nepal, com a desaparição dos glaciais do Himalaya. Os glaciais foram derretendo, a água transbordou os chamados rios glaciais e isso acarretou em poderosas inundações que obrigaram às populações ao deslocamento.

Tsumamis, terremotos, inundações na Tailândia, China ou Filipinas, seca no Sudão, o acidente de Fukushima, tempestades na Europa, todos estes acidentes naturais violentos provocaram massivos deslocamentos. E o futuro não se anuncia melhor. O investigador do IDDRI e coordenador do relatório François Gemenne, prevê que “em 2011 as cifras sejam similares as de 2010”. A degradação paulatina do meio ambiente provocada pelo homem tem também uma influência determinante neste fluxo migratório.

Um exemplo disso é o que ocorre no Brasil. O relatório da Organização Internacional de Migrações cita o exemplo do que ocorre no Norte do Brasil. No Amazonas, o desmatamento trouxe consigo a ocupação das terras, mas depois, uma vez que os solos arrasados chegaram ao limite de sua capacidade, as populações que se instalaram ali não obtém mais recursos e devem migrar.

Os deslocamentos ambientais têm um caráter mais dramático que as migrações econômicas. Em primeiro lugar, em muitos casos, os países que se encontram com esses problemas não são diretamente responsáveis pelas mudanças climáticas que induzem ao deslocamento populacional. Em segundo, ao contrário do que ocorre com os migrantes econômicos que partem em busca de uma vida melhor, os já quase refugiados ambientais não entendem o que acontece com eles e esperam sempre poder regressar a suas terras, o que é praticamente impossível.

Em ambos os contextos, um dos maiores desafios consiste em conseguir com que os países diretamente responsáveis pelas mudanças climáticas e, por conseguinte, da migração ambiental, alimentem um fundo para ajudar os países vítimas de variações climáticas. O dispositivo já foi evocado durante a Conferência das Nações Unidas sobre o clima, celebrada em Cancún (México), em 2010. O artigo 14-F se refere às migrações e deslocamentos conectados com as mudanças climáticas e abrange um pacote de medidas que deveriam ser financiada com um “Fundo Verde”.

Entretanto, existe o artigo, mas o fundo está vazio. Os países ricos se comprometeram em contribuir com 100 bilhões de dólares por ano com tal fundo, mas recém a partir de 2020. A um ritmo de quase 40 milhões de migrantes ambientais por ano, dentro de oito anos haverá 320 milhões de refugiados sem assistência internacional alguma. A arquitetura jurídica internacional existente não ampara esses refugiados.

A convenção de Genebra sobre os refugiados, adotada em 1952, não contempla o esquema da migração ambiental, em especial porque esses refugiados se movem quase exclusivamente dentro das fronteiras de seus países. Em junho de 2011, o Alto Comissário das Nações Unidas para os refugiados Antonio Guterres, havia interferido a fim de que se adotassem “novas medidas para enfrentar os deslocamentos de populações gerados por mudanças climáticas e catástrofes naturais”.

Todos os especialistas se preparam para um futuro climático acidentado. François Gemenne adianta que “é preciso refletir agora sobre um contexto de forte aquecimento, o que vai implicar em uma nova distribuição das populações na superfície do globo. Existem zonas que deixarão de ser habitáveis e seus habitantes deverão migrar”. Dois relatórios simultâneos sustentam a tese de que o amanhã será pior. Um, se trata de um estudo estatístico elaborado pelo Centro de Investigações de Epidemiologia do Desastre (CRED) da Universidade católica de Louvain (Bélgica) e que mostra como, desde 1970, os desastres vêm em constante aumento. O segundo trabalho é o relatório especial publicado em novembro passado pelo GIEC, o Grupo de Especialistas Intergovernamental sobre a Evolução do Clima. O GIEC prevê que os acidentes meteorológicos extremos aumentarão constantemente nos próximos anos.

O relatório State of Environmental Migration analisou situações climáticas extremas, inclusive nos países ricos, neste caso a França. O trabalho se concentrou muito especialmente nas crises climáticas que estouraram em 2010 no Paquistão (Inundações), na Rússia (incêndios florestais), no Haiti e no Chile (terremotos) e na França (tempestades). O caso francês ilustra que nem sequer os países ricos estão ao resguardo dos deslocamentos de populações obrigados pelo clima. A tempestade Xinthia assolou a costa atlântica francesa entre 26 de fevereiro e primeiro de março de 2010. Seu passo deixou um saldo de 59 mortos e milhares de refugiados permanentes. Dada a exposição de várias zonas a possíveis tempestades futuras, o Governo francês as decretou inabitáveis. Com isso, milhares de pessoas que viviam nestas zonas se viram obrigadas a deixar suas casas e suas terras para sempre.

Neste contexto preciso e após analisar os erros cometidos pelos poderes públicos franceses na gestão desta crise, a OIM destaca a importância da preparação das políticas públicas para administrar as catástrofes climáticas maiores. É lícito citar o desastre, ao mesmo tempo climático e político, que provocou o Furacão Katrina, que golpeou Nova Orleans em 2005. 1.200.000 pessoas foram deslocadas e um terço dos habitantes nunca regressou a seus lares.

(Por Eduardo Febbro, Carta Maior, 29/01/2012)
Tradução: Liborio Junior


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