Porto Alegre - Desde 1995, cerca de 42 mil brasileiros foram libertados pelos grupos de fiscalização contra o trabalho escravo. Não se sabe quantos cidadãos ainda vivem sob essa condição, mas o governo já definiu uma estratégia para chegar a eles: parcerias entre o poder executivo, o judiciário e a sociedade civil.
De acordo com Daniel Avelino, procurador da República no Pará, o modelo é o mais efitivo diante da morosidade da Justiça em julgar casos de escravidão. "A verdade é que a busca de tutela por meio de decisões judiciais, com poucas exceções, não tem alcançado o resultado que a sociedade quer", afirmou, em mesa sobre o tema no Fórum Social Temático.
Na prática, essa estratégia tem se materializado através de termos de ajustamento com empresas que integram a cadeia produtiva afetada pelo trabalho escravo. Em 2009, Avelino, através do Ministério Público Federal, firmou acordos com frigoríficos e supermercados para que eles monitorassem seus fornecedores de carne, setor que concentra casos de escravidão e desmatamento. Todo o processo é acompanhado por ONGs e movimentos sociais.
Os termos serviram para isolar escravocratas e, conforme o procurador, já ajudam a reduzir os casos de trabalho escravo no Pará. Em 2012, a medida será levada ao setor suderúrgico do Estado. Essas empresas utilizam carvão vegetal como um de seus insumos e, muitas vezes, o produto é feito com trabalho escravo e uso de madeira nativa.
"Até a próxima semana teremos um termo de ajustamento de conduta assinado com as siderúrgicas. Elas terão seis meses para apresentar projetos para adequar seus fornecedores de carvão, seja passando a usar o carvão mineral, seja o vegetal produzido com floresta plantada", explicou Avelino.
Também presente no debate, o juiz Jônatas Andrade, da Justiça do Trabalho no Pará, alertou para o fato de que grandes empresas estão envolvidas com casos de trabalho degradante, como a Vale. Ele explicou que em Carajás o modelo de produção nas minas ocorre sob regime do turno ininterrupto de revezamento, pelo qual o funcionário deveria estar disponível para a empresa apenas seis horas diárias.
Entrentando, diante do longo tempo de deslocamento entre as cidades e a área de produtiva, esse tempo chegava a quize horas. "Foram 17 anos sem que a itinerância fosse paga aos trabalhadores, gerando uma economia de milhões para a empresa", afirmou. Diante da atuação do magistrado, apenas recentemente esse valor passou a ser pago aos funcionários da mineradora.
"Não vai haver desenvolvimento sustentável no Brasil se o trabalho escravo continuar existindo", afirmou Leonardo Sakamoto, coordenador de uma ONG, a Repórter Brasil, que atua em projetos de combate à escravidão contemporânea. A organização estudas cadeias produtivas com problemas trabalhistas e também aposta em acordo com empresas para que elas monitorem seus fornecedores.
(Por Marcel Gomes, Carta Maior, 29/01/2012)