Ao indiciar quatro membros do lobby do amianto por “homicídio e lesões involuntárias”, a juíza Marie-Odile Bertella-Geffroy avançou mais uma etapa no longo caminho que levará, talvez, a um processo penal idêntico ao que foi aberto na Itália em 2011. Mas estamos ainda bem longe disso… Mesmo que, para Jean-Pierre Hulot, Dominique Moyen, Daniel Bouige e Arnaud Peirani, o ajuste de contas se aproxime inexoravelmente.
O primeiro, hoje com 67 anos, era “secretário” – na verdade, o principal responsável – pelo Comitê Permanente Amianto (CPA), estrutura de lobbying financiada pelos industriais que, de 1982 a 1997, data tardia da proibição do uso do amianto na França, conseguiu “controlar o discurso científico e da Medicina” e garantir o “quase monopólio do conhecimento científico francês especializado sobre o amianto”, de acordo com os documentos do processo que Le Point pode consultar.
Vale lembrar que, em 1996, o Inserm calculava em cem mil o número de franceses que deveriam morrer até 2025, por haver inalado essa fibra cancerígena cuja toxidade conhecíamos desde o início da década de 1960. Mas graças ao formidável trabalho de Jean-Pierre Hulot, que abrigava os trabalhos do CPA no prédio da sua firma Communicações Econômicas e Sociais, situada à Avenida de Messine, em Paris, a França, quando o escândalo explode em 1995, torna-se o primeiro importador e produtor de amianto na Europa.
35 000 toneladas dessa fibra são manipuladas nas fábricas dos dois principais fabricantes, Éternit e a sociedade Éverite, filial de Saint-Gobain, para fabricar painéis, telhas e caixas d’água de Fibrocimento. Sete países da Comunidade Europeia já haviam, nessa época, proibido o “mineral mágico”, mas a França usou de todo o seu poder em Bruxelas contra uma proibição total. Na realidade, foi o CPA que agiu, conseguindo ”influenciar o processo de decisão política, na França e na Europa”.
"Uso controlado do amianto"
Como uma obscura estrutura de comunicação conseguiu “sequestrar” o discurso oficial? Simplesmente reunindo cientistas, responsáveis por órgãos oficiais e mesmo representantes dos ministérios ligados à questão, esses últimos felizes por finalmente se livrarem de um dossiê tão venenoso. Durante estes 15 anos, as autoridades que se sucediam, de direita e de esquerda, preferiram deixar que os industriais se ocupassem de uma importante questão de saúde pública.
Renaud Peirani era o representante do CPA no Ministério da Indústria e o especialista junto à Comissão Europeia. E Dominique Moyen, um dos fundadores do CPA, dirigia o INRS (Instituto Nacional de Pesquisa e de Segurança no Trabalho), o organismo da Previdência Social encarregado de zelar pela saúde dos assalariados.
Sob o olhar benevolente de Daniel Bouige – diretor da Associação Francesa do Amianto e diretor geral da Associação Internacional do Amianto -, os membros do CPA vão então inventar o conceito de “uso controlado do amianto”, para desarmar a mídia em relação aos casos denunciados.
“Para a Andeva – que havia apontado a responsabilidade do CPA em julho de 1996 (!) – e para o conjunto das vítimas do amianto, é um sinal encorajador que o processo vá adiante”, disse a Associação que reúne as vítimas do “ouro branco”, sublinhando a lentidão da Justiça em relação ao caso. O mesmo entusiasmo não deve ser partilhado pelos membros do CPA que ainda não foram investigados. E ainda menos pelas autoridades dos Ministério da da Saúde e do Trabalho que os indicaram para o Comitê Permanente do Amianto.
(Por François Malie, com tradução de Tania Pacheco, Le Point / Combate ao Racismo Ambiental, 10/01/2012)