Um balanço de final de ano no Brasil indica que 2011 foi o ano das retrorreformas. O maior exemplo de retrocesso foi a reforma do Código Florestal, que consolidou a marcha batida do Agronegócio sobre o Executivo e o Legislativo. O único órgão público que pode conter o impeto desflorestador é o Ministério Público. Os meios de comunicação refletem mais a posição do Agronegócio do que o da sociedade em geral. Nesse aspecto, temos uma vitória de Kátia Abreu, senadora pelo Tocantins e presidente da Confederação Nacional da Agricultura.
Também não há como negar que, além do Código Florestal, o ano que passou foi marcado por reformas prometidas e não cumpridas; iniciadas e não concluídas; ensaiadas e paralisadas; discutidas e não levadas adiante. De todas as reformas brasileiras, a única que segue avançando – a passos lentos – é a reforma da estrutura educacional, que se efetiva sem incluir o esporte, entregue a empresários, oportunistas e pelegos profissionais.
A agrária, a mais antiga de todas as reformas, entrou em hibernação no governo Dilma, que apenas em dezembro anunciou a disposição de dar assistência técnica aos posseiros assentados em áreas desapropriadas. Ou, seja, levou-se quase um ano para se concluir o que todo mundo sabe desde o fracasso das colônias agrícolas de Getulio Vargas nos anos 1940: não basta distribuir terra, é preciso investir contínua e sistematicamente em infraestrutura, insumos e assistência ao colono.
A mais discutida e emperrada é a reforma da propriedade dos meios de comunicação social. Criticado por ser confundido com “censura/controle” da mídia, o projeto elaborado no final do governo Lula visa democratizar a posse dos veículos de difusão da informação, item essencial à sobrevivência da liberdade de expressão. O objetivo central do governo é o desmanche do cartel formado por meia dúzia de famílias (Civita, Frias, Marinho, Mesquita, Sarney e Sirotsky) que controlam centenas de veículos por meio da posse cruzada de jornais, revistas e de concessões de rádio e TV.
Numa intervenção no seminário sobre o controle dos meios de comunicação social em Porto Alegre, em novembro, a deputada federal Luiza Erundina (PSB-SP) e ex-prefeita de São Paulo disse que a democratização dos meios de comunicação é mais importante do que a reforma agrária. Ou, melhor, que o país só avançará na reforma agrária e em todas as demais reformas (política, tributária etc.) se aumentar a democratização dos meios de comunicação, “com a compreensão do povo sobre a importância do acesso à informação”. Matéria-prima central do processo político, a informação só rola eficientemente se a comunicação for livre, sem manipulação.
De manipulação a mídia brasileira está cheia. No livro Crimes de Imprensa, lançado há dois meses numa banca de jornais de São Paulo, o jornalista Palmério Dória analisa e comenta episódios das eleições de 2010. É seu parceiro na empreitada o jornalista Mylton Severiano. O livro não é divulgado na imprensa convencional pelas mesmas razões que explicam o silêncio da mídia em torno do livro Privataria Tucana, em que o jornalista Amaury Ribeiro Jr. recupera o tema das propinas das privatizações dos anos 1990 no Brasil. O sucesso desses e de outros livros – como Onde a Corrupção Veste Toga, de Rogério Medeiros e Stenka Callado, sobre escândalos no Judiciário capixaba – indica que a população brasileira apreciaria a efetivação da reforma da mídia.
É ocioso falar das reformas tributária e político-eleitoral. Ambas recheiam mil discursos políticos, mas faltam as iniciativas que as transformarão em projetos concretos.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“Tudo o que muda a vida vem quieto no escuro, sem preparos de avisar.”
João Guimarães Rosa, pag 31, Noites do Sertão, Record/Altaya, 1988
(Por Geraldo Hasse, Século Diário, 29/12/2011)