No Brasil, temos vários vilões contra o meio ambiente e seres humanos: A indústria da soja e a indústria nuclear com sua exploração de urânio estão entre os mais poderosos vilões. Este artigo mostra a conexão dessas duas indústrias e como eles ameaçam a segurança alimentar das futuras gerações do Brasil. O artigo começa com o plano dos Governos Lula da Silva e Dilma Rousseff de sextuplicar a produção de urânio e de instalar uma mina de urânio-fosfato no Sertão de Santa Quitéria, no Ceará
Em 2008, o Conselho de Administração das Indústrias Nucleares do Brasil (INB) aprovou a proposta feita pelo Grupo Galvani para atuar como parceira na exploração da jazida de Santa Quitéria, onde o urânio se encontra consorciado ao fosfato. Galvani ganhou a disputa pelo direito de exploração de fosfato-urânio contra a Vale e a Bunge Brasil.
“Objetivamente, (a Galvani) é a que dá maior retorno, maior vantagem às indústrias da INB. É uma empresa com muita experiência na área. Tecnicamente, entende todas as necessidades deste projeto, que não é só a produção de urânio, mas também de fertilizantes”, justificou o Presidente da INB, Alfredo Tranjan Filho.
Segundo a INB – que detém o monopólio da mineração e beneficiamento do urânio encontrado em solo brasileiro – a reserva de Itataia tem capacidade de produção por ano de até 240.000 toneladas de fosfato e 1.600 toneladas de urânio – neste caso, o urânio é somente um subproduto da mineração de fosfato. O fato é que Santa Quitéria só é economicamente viável por causa da demanda do agrobusiness por fosfato.
O que é o fosfato?
O fosfato é um fertilizante cada vez mais utilizado na agricultura mundial e no Brasil, especialmente para manter a produção de soja não-transgênica e transgênica. Já desde 2005 – quando foi publicado um alerta na Suíça – sabemos que o uso do fosfato (de origens de rochas sedimentares e rochas ígneas) é um grande perigo para a Humanidade, porque este fosfato está sempre contaminado com urânio.
E este urânio se acumula a cada ano no solo, e poderiam contaminar cada vez mais as águas e os alimentos. Com as grandes lavouras industriais por exemplo de soja e dos outros biocombustíveis, estamos na realidade uranificando o solo. Urânio no solo é um risco alto para a segurança alimentar no futuro bem próximo.
Mas por que usamos, no Brasil e no mundo, fosfato (contaminado com urânio) para fertilizar as lavouras e não fosfato biogenético de origem guano? Resposta: guano quase não existe mais, as jazidas de guano já foram esgotadas na segunda metade do Século 20.
Fosfato (puro sem contaminação) é um elemento importante para todos os seres vivos, plantas e animais ou para a Coca Cola. E todo os seres vivos expelem fosfato com os seus excrementos. Fosfato biogenético é simplesmente a acumulação de ‘cocô’ de milhares de aves durante séculos e milhares de anos. Isso é o que se chama guano. Lugares com grandes colonias de aves criaram grandes jazidas de guano, por exemplo, no Chile e na Ilha do Pacífico Nauru.
Hoje, por causa da exploração não sustentável, já por muitos anos este fertilizante “orgânico” é raro e caro! Por isso o Brasil, EUA, União Europeia, Rússia e todos os países com agricultura industrial estão usando fosfato da mineração do subsolo que sempre é contaminado com urânio.
“A rocha fosfática é a única fonte de fósforo economicamente viável para a produção de fertilizantes fosfatados e fosfatos para outros fins”, explicou a empresa Bunge Fertilizantes, em 2008. “Cerca de 85% da produção mundial de fosfato vem de rochas sedimentares e o restante (15%) de rochas ígneas. No Brasil mais que 95% vem de rochas ígneas, pela vocação geológica.”
Tecnologicamente, é possível separar o urânio quase 100% do fosfato, mas esta tecnologia é muito cara. Resultado: cada ano os agricultores convencionais jogam, junto com fosfato, o urânio – um elemento pesado, radioativo e altamente tóxico – nas terras de nossas plantações, que significa um grande risco à saúde e à segurança alimentar no futuro para as próximas gerações de toda a Humanidade.
O mundo não pode continuar com este processo de uranificação dos solos!
Até agora o Brasil está importando uma grande quantidade deste fosfato do Norte da África e da Rússia, provenientes de suas minerações de fosfato (urânio). No futuro próximo, o governo brasileiro quer substituir estas importações com fosfato da mina de urânio de Santa Quitéria.
Summa-Sumarum: quem lutar contra soja e contra o uso de fosfato na agricultura convencional, luta automaticamente também contra a desastrosa mineração de urânio-fosfato em Santa Quitéria e em outros países! Importante lembrar que a agricultura tradicional não precisa de fertilizante fosfato e na agricultura orgânica o fertilizante “fosfato mineral” é normalmente proibido!
Também existe uma outra fonte de fosfato barato e mais ecológico: fosfato extraído de nossos próprios excrementos, concretamente fosfato extraído durante o processo de tratamento de esgoto das cidades. Mas até hoje, o Brasil não está usando esta grande jazida, esta grande riqueza sustentável, este “Pré-Cocô”. Até hoje o Rio de Janeiro está jogando fora a sua riqueza, o esgoto de 11 milhões de pessoas, com emissários submarinos no mar.
Então, a minha proposta para a Rio + 20 é: Economia Verde baseada no esgoto. Tratamento de esgoto correto, usar o esgoto como uma jazida de fosfato e deixar o urânio-fosfato em Santa Quitéria no chão. Questão: quem vai ganhar os royalities desta jazida de esgoto, só os cariocas?
Post scriptum: Embora a mina em Santa Quitéria ainda não tenha a licença ambiental e o povo brasileiro ainda não ter tido a oportunidade para decidir se quer esta primeira mina de urânio-fosfato do Brasil, o projeto já está produzindo fosfato e lixo radioativo na região de Poços de Caldas, Minas Gerais, onde foi feita a primeira mineração de urânio do Brasil.
Segundo a Empresa Galvani, publicado em agosto de 2011, a planta piloto do projeto Santa Quitéria, instalada em Caldas (MG), iniciou a segunda etapa dos trabalhos de purificação do acido fosfórico por meio da retirada do urânio.
“A planta está operando 8 horas por dia, com a meta de alcançar 1.500 horas. Assim, vamos poder otimizar a utilização dos equipamentos e dos solventes empregados, além de identificar e corrigir todos os possíveis problemas que o processo possa apresentar quando implantado industrialmente”, diz Michele Ruiz, engenheira de processos do Grupo Galvani.
”O Consórcio Santa Quitéria, formado pela Galvani e pela INB (Indústrias Nucleares do Brasil), iniciou a primeira etapa dos testes com a planta piloto em agosto 2010.”
Até agora o Grupo Galvani está seguro que a mina vá ganhar a licença ambiental do IBAMA, quando chegar a fase de produção: “A partir de reuniões entre INB, responsável pela obtenção das licenças, a Galvani, o Governo do Ceará e o IBAMA, foi estabelecido um termo de referência usado para elaborar o EIA-RIMA, seguindo modelo que atenda aos requisitos tanto em âmbito estadual quanto federal. A previsão é que o projeto Santa Quitéria comece a operar em 2015“, informou o Grupo Galvani recentemente.
(Por Norbert Suchanek*, EcoDebate, 22/12/2011)
* Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, é articulista e colaborador do EcoDebate.