Começa nesta segunda-feira, dia 28, em Durban, na África do Sul, a 17a. Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas, considerado um ensaio geral para a conferência Rio+20, marcada para o ano que vem no Rio de Janeiro.
O clima é de absoluto pessimismo, não apenas porque todas as energias e recursos financeiros estão bloqueados pela crise econômica que afeta os países ricos, mas também porque, no resto do mundo, salvo algumas ilhas de tranquilidade, emergências sociais deixam em segundo plano a urgência ambiental.
Considerando-se que as mudanças climáticas têm potencial para colocar sob risco a própria sobrevivência da sociedade humana como a conhecemos, está colocada uma questão filosófica instigante para quem ainda tem estômago para tais reflexões.
A possibilidade do fracasso é admitida abertamente por alguns dos mais destacados participantes da COP-17.
Em entrevista publicada com destaque nos jornais desta segunda-feira, o embaixador André Corrêa do Lago, diretor do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty e principal negociador brasileiro no encontro de Durban, afirma não ter dúvidas de que a crise econômica tem um efeito muito grande porque “com ela a preocupação com o futuro do planeta diminui”.
Esse o centro da contradição que se coloca: se a emergência de uma crise financeira coloca em risco o futuro do planeta, de que servem as preocupações de curto prazo com a questão econômica?
A entrevista alinha algumas queixas dos países desenvolvidos, que exigem o compartilhamento das medidas contra os efeitos das mudanças climáticas com os países em desenvolvimento.
Em dificuldades econômicas desde 2008, os Estados Unidos e a Europa não aceitam mais ter que arcar com a maior parte das responsabilidades pelo bem-estar da humanidade, na visão de seus líderes.
Alguns emergentes, como o Brasil, aceitam assumir um papel mais relevante, por exemplo, ampliando e até mesmo antecipando algumas das metas de redução do desmatamento. Mas relutam em transformar essas metas voluntárias em compromissos obrigatórios.
Além disso, outros países, como o Canadá, a Rússia, o Japão e a Austrália, anunciam que não pretendem assinar o compromisso de continuidade do Protocolo de Kyoto.
Se houver essa defecção, a conferência Rio+20 nasce enfraquecida e praticamente perde o sentido.
A democracia em perigo
O que representaria um fracasso absoluto da COP-17, se a Europa não encontrar rapidamente uma saída para a crise e a economia dos Estados Unidos não consolidar sua recuperação até o final de 2012?
Não há mente humana capaz de calcular as perdas para a humanidade com a combinação entre uma recessão prolongada e o agravamento das emissões de gases que provocam as mudanças climáticas, justamente na década crucial para evitar o desastre ambiental previsto pelos cientistas que acompanham a evolução do aquecimento global.
Mas alguns elementos que circulam em boletins de instituições de pesquisa e nas redes de observadores sociais ao redor do mundo permitem antever um cenário catastrófico, com graves riscos para a democracia e mesmo para o processo civilizatório.
Um relatório divulgado na semana passada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – Pnuma – informa que a atmosfera da Terra terá em 2020, na hipótese mais otimista, 6 bilhões de toneladas de carbono acima da meta anunciada para evitar um aquecimento maior do que 2o.C neste século.
Conforme lembram os jornais, a única possibilidade de reduzir esse índice de emissões seria criada se todos os países cumprissem, nos limites mais ambiciosos, as metas que foram anunciadas no encerramento da Cúpula de Copenhague, em dezembro de 2009.
Infelizmente, essa não é a realidade.
Os países em desenvolvimento estão empenhados em consolidar suas chances de crescimento, e nem sempre suas estratégias contemplam as decisões mais corretas em termos de sustentabilidade.
Os países desenvolvidos, mergulhados em grave crise econômica, são reféns do sistema financeiro e se encontram diante do desafio de impor à suas sociedades enormes perdas em termos de bem-estar – e os investimentos na redução das emissões de gases nocivos podem ficar em segundo plano.
Por outro lado, a humanidade não produziu líderes qualificados para articular uma reflexão sobre os riscos de escolhas erradas neste momento crucial.
E a imprensa, perdida entre os fragmentos da crise econômica, não se mostra capaz de ao menos expor o dilema que a humanidade precisa solucionar.
(Por Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa, 28/11/2011)