Líderes mundiais se reunirão durante duas semanas na cidade sul-africana de Durban para encontrar uma forma de limitar o aquecimento global em dois graus. Para respeitar este teto, as emissões globais de dióxido de carbono (CO²), causadoras da mudança climática, não devem ultrapassar os 660 bilhões de toneladas até 2050, segundo cientistas.
Contudo, no ritmo atual, o limite será superado antes de 2025. Depois de 17 anos de conversações, as nações que integram a Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC) não conseguiram frear o aumento das emissões de carbono.
Em Durban, entre hoje e o dia 9 de dezembro, serão retomadas negociações que se tornaram cada vez mais complexas, em meio a acusações políticas e discussões sobre financiamento. Ninguém acredita que a situação possa mudar no curto prazo. A oportunidade para controlar as emissões de carbono e manter o aquecimento global abaixo dos dois graus se esvai rapidamente. Por isso, é o momento de adotar enfoques não convencionais, afirmou Mutsuyoshi Nishimura, embaixador e ex-negociador do Japão.
Nishimura propõe uma mudança de jogo, baseado em um acordo explícito para fixar um teto de 660 bilhões de toneladas nas emissões globais de CO² entre 2010 e 2050. Este pré-requisito de carbono seria depois leiloado segundo o princípio de que o contaminante deve pagar, começando com US$ 25 a tonelada, para financiar novas tecnologias e esforços de adaptação dos países em desenvolvimento.
“Todas as empresas que contaminam no mundo deveriam comprar permissões correspondentes à quantia de CO² que emitem”, disse Nishimura à IPS.
Este enfoque evitaria as paralisações nas negociações causadas por acusações mútuas sobre quem deve dar o primeiro passo na redução de emissões. A China, país que mais libera dióxido de carbono no planeta, se nega a submeter-se a qualquer limite enquanto não o fizerem primeiro os Estados Unidos, país que continua entre os mais contaminantes. Washington, por sua vez, quer que Pequim atue primeiro.
“Faríamos isso (aceitar compromissos vinculantes sobre emissões) se todas as grandes economias também fossem parte delas de forma plena. Assim, nesse sentido, necessitaríamos ver a ação dos outros”, disse aos jornalistas no dia 22 o enviado especial dos Estados Unidos para a mudança climática, Todd Stern.
A proposta de Nishimura se baseia em um princípio bem claro: ou as empresas compram permissões para emitir CO² ou deixam de contaminar. É simples e poderia funcionar. Cientistas climáticos ouvidos pela IPS concordam que um pré-requisito de carbono de 660 bilhões de toneladas seria a melhor opção se os países estivessem realmente determinados a manter o aquecimento global em menos de dois graus.
“De uma perspectiva científica, isto nos daria 75% de probabilidades de permanecer abaixo dos dois graus”, disse Malte Meinshausen, do Instituto de Potsdam para a Pesquisa do Impacto Climático (Alemanha). Suas análises foram uma das primeiras a determinar qual o pré-requisito de carbono necessário para limitar o aquecimento global em dois graus.
O pré-requisito de 660 bilhões de toneladas pode parecer alto, mas nem tanto se for considerado o nível das emissões anuais. Em 2010, por exemplo, a queima de combustíveis fósseis e a produção de cimento liberaram 33,5 bilhões de toneladas na atmosfera, segundo o Centro de Análises de Informação sobre Dióxido de Carbono, do Departamento de Energia dos Estados Unidos.
Se tudo continuar igual, cerca de 227 bilhões de toneladas adicionais serão liberadas na atmosfera até 2015. Isto significaria que, em apenas cinco anos, se cobriria mais de um terço do pré-requisito de carbono necessário para manter em menos de dois graus o aquecimento do planeta.
É improvável que as próximas negociações mudem o curso atual. A China não aceitará a ideia de pôr limite em suas emissões antes de 2015, disse Alden Meyer, diretor de estratégias e políticas da União de Cientistas Comprometidos. Contudo, mesmo obtendo a aceitação chinesa, seriam necessárias significativas mudanças também na política dos Estados Unidos, acrescentou.
“Na mesa de Durban, não se colocará em discussão nenhum teto, não importa o que diga a ciência”, afirmou Meyer à IPS. Tampouco estará a ideia de um leilão mundial de direitos de emissão, afirmou Meyer, que simpatiza com a proposta de Nishimura.
No debate também estará presente a questão das emissões “históricas”. A mudança climática é consequência da soma de todas as emissões causadas pelas atividades humanas, e o CO² pode permanecer na atmosfera por séculos. Parte do fenômeno atual é provocada por liberações de carbono feitas há cem anos.
Entre 1900 e 2008, os Estados Unidos lançaram na atmosfera cerca de 337 bilhões de toneladas de CO², muito mais do que qualquer outro país. A China lançou 117 bilhões no mesmo período.
Nishimura afirmou que, para resolver o problema da responsabilidade histórica na contaminação, seria preciso criar um novo sistema de financiamento que favoreça os países em desenvolvimento. Para manter o planeta dentro do pré-requisito de 660 bilhões de toneladas, os países do Sul não podem se dar ao luxo de igualar as emissões históricas dos Estados Unidos. Portanto, devem ser compensados com os milhares de milhões de dólares que as empresas deverão pagar para continuar contaminando, acrescentou.
O preço de US$ 25 a tonelada de CO², por exemplo, geraria US$ 625 bilhões ao ano entre 2010 e 2020, explicou Nishimura. É simples, mas porque estas ideias não recebem o apoio necessário? Nenhum dos especialistas ouvidos pela IPS disse acreditar que as ideias de Nishimura possam ser consideradas em Durban.
“É um argumento muito lógico para uma resposta racional global a um problema mundial da mudança climática”, disse Saelemul Huq, especialista em políticas climáticas do Instituto Internacional do Meio Ambiente e Desenvolvimento, com sede em Londres “Mas sua debilidade fatal é que deixa de lado tudo o que foi feito até agora (sem sucesso) por meio do processo da CMNUCC”, afirmou à IPS.
(Por Stephen Leahy, IPS / Envolverde, 28/11/2011)