A equipe do Vitae Civilis entrevistou aqui em Durban (África do Sul) Morrow Gaines Campbell III, especialista em negociações internacionais relacionadas a mudanças climáticas e que vem acompanhando os debates sobre o tema nos últimos anos. Segundo Gaines, o objetivo específico aqui na África do Sul é salvar o Protocolo de Kyoto.

“As informações cientificas mais recentes já mostram que estamos no caminho de um mundo de até 6ºC, dependendo do estudo, e por mais ambiciosos que sejam os esforços de mitigação a partir de agora a luta vai ser inglória. Isso não quer dizer que devemos desistir. Temos que insistir em conseguir um 2º período de compromisso para o Protocolo de Kyoto”, diz.

Leia a seguir a entrevista completa.

Vitae Civilis - Quais são as expectativas gerais para a COP17 que começa nesta segunda?
Morrow Gaines Campbell III - A gente espera é um acordo justo, ambicioso e legalmente vinculante. A mesma coisa que nós esperávamos em Copenhagen e não conseguimos lá, não conseguimos em Cancún e continuamos querendo um acordo com esta natureza aqui em Durban. Entretanto, o que nós temos como objetivo específico aqui na África do Sul é salvar o Protocolo de Kyoto por intermédio do 2º período de compromisso, pois o primeiro começou no dia 1º de janeiro de 2008 e termina no dia 31 de dezembro de 2012 e não está nada negociado para sua continuidade.

Se não houver nenhum compromisso por parte dos países desenvolvidos, os mais responsáveis pelas emissões de gás de efeito estufa, então cairemos num vazio, num período em que ninguém é responsável por nada. Eu não creio que em Durban vamos conseguir fazer tudo isso em relação ao 2º período do compromisso.

O que é possível?
Campbell III - O que podemos realisticamente obter é um acordo de que vai haver um 2º período de compromisso e que vamos avaliar para que tenhamos em 2015, por exemplo, um acordo global para o regime de combate as mudanças de clima que poderá ser um protocolo emendado, ou um novo acordo que junta a convenção e o protocolo. Neste momento a forma legal não vai ser definida. Mas o que queremos é pelo menos este compromisso dos países, que vamos continuar a buscar este caminho.

E como fazer?
Campbell III - Uma das alternativas é que o 1º período de compromisso seja estendido. Ou vamos negociar um novo acordo e prever uma aplicação provisoria, que é uma forma legal e reconhecida no direito internacional para que os países tenham tempo para ratificar este novo acordo. Existem formas criativas para garantir isso.

Outro ponto é subir o nível de ambição, inclusive dos países de maior responsabilidade, que são os países industrializados, para que tenham metas de redução de gases de efeito estufa mais ambiciosos que os atuais; os atuais estão muito longe de atender o que a ciência demanda para manter o aumento da temperatura global abaixo dos 2ºC, que é o que o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) recomenda como sendo o nível a partir do qual teríamos a possibilidade de recuar e estabilizar os efeitos da mudança de clima. Infelizmente é bem provável que não vamos conseguir recuar. 

As informações cientificas mais recentes já mostram que estamos no caminho de um mundo de até 6ºC, dependendo do estudo, e por mais ambiciosos que sejam os esforços de mitigação a partir de agora a luta vai ser inglória. Isso não quer dizer que devemos desistir. Temos que insistir em conseguir um 2º período de compromisso para o Protocolo de Kyoto.

Países em desenvolvimento: como ficam?
Campbell III - Tem países em desenvolvimento que têm menos recursos para enfrentar os problemas de mudanças de clima que já estão acontecendo, sejam eles enchentes, secas, tempestades violentas e fora de época, fome. E tem um outro grupo que, na época em que foi feito o Protocolo de Kyoto e a convenção, não tinham o nível de desenvolvimento econômico que têm hoje.

Estou me referindo aos países como o Brasil e como a própria África do Sul. Estes países agora têm níveis de desenvolvimento que exigem gastos de energia comparáveis aos países desenvolvidos há alguns anos atrás. Então não é justo que estes países em desenvolvimento mais destacados se escondam no meio dos outros em desenvolvimento sem assumir um compromisso vinculante.

O Brasil nisso, como fica?
Campbell III - O Brasil é um desses países. Portanto esta numa situação perigosa. É um jogo que o país vai poder sustentar por algum tempo, mas não muito. Já o caso da China é mais sério ainda, pois é o primeiro emissor de gases de efeito estufa no mundo, ultrapassando os EUA e ainda considerado um pais em desenvolvimento. Há aqui uma questão de justiça que precisa ser corrigida.

E para a plenária de abertura desta COP, o que podemos esperar?
Campbell III - Os cenários de abertura são sempre um mistério. Mas, geralmente dão o tom de como vai ser a negociação. Se não revela tudo, pelo menos revela o tom. Então se tudo transcorrer de forma normal, sem controvérsias sobre os itens da agenda de trabalho e sobre os procedimentos, pelo menos podemos ter a tranquilidade que o tom é positivo. Mas, se algum país ou algum grupo de países levantar uma questão de procedimento ou de discordância com a agenda ai sim podemos imaginar que as negociações serão polêmicas e problemáticas. Amanhã (28) vamos saber.

(Vitae Civilis, 27/11/2011)