Depois de mais de uma década de debates, o governo australiano finalmente conseguiu passar as leis que vão impor limites aos 500 maiores emissores do país e que são o primeiro passo para o estabelecimento de um mercado de carbono
Em uma vitória que o governo da primeira-ministra Julia Gilliard está considerando histórica, o Senado australiano aprovou nesta segunda-feira (7) a proposta, que envolve 19 projetos de lei, que cria uma taxa de A$ 23 (R$ 41,79) por tonelada de carbono para os 500 grandes emissores do país a partir de julho de 2012.
A intenção é que em três anos a taxa deixe de existir e um sistema de comércio de emissões entre em vigor. A decisão pode impactar nas negociações da Conferência do Clima de Durban (COP17), que começam no próximo dia 28 e que não apresentam boas perspectivas.
“Hoje a Austrália colocou o preço sobre o carbono como uma lei de nosso país. Isto acontece depois de 25 anos de alertas científicos, 37 inquéritos parlamentares e centenas de debates. Foi uma grande vitória”, afirmou Gilliard.
Segundo o projeto, a taxa vai aumentar 2,5% por ano antes de se transformar em um preço flutuante sujeito às necessidades do mercado, sendo que o governo controlará a quantidade de permissões assim como um valor mínimo e máximo para elas. Espera-se que no futuro a plataforma australiana seja interligada com a da Nova Zelândia e da Europa.
Analistas estimam que o mercado australiano movimente A$ 15 bilhões (R$ 27 bilhões) já em 2015, com as vendas de permissão subindo para A$ 25 bilhões nos primeiros quatro anos. O caminho para a aprovação foi muito árduo, com mais de dez anos de debates e levando à queda de dois primeiros-ministros, John Howard e Kevin Rudd.
Apesar de estar agora aprovado, o conjunto de leis ainda corre risco se em 2013 a oposição subir ao poder. O líder dos conservadores, Tony Abbott, fez um pacto de que iria derrubar o programa se tivesse a chance.
“Essa taxa trará prejuízos para a economia e para as famílias. Ela elevará o custo de vida, ameaçará postos de trabalho e não conseguirá nada para o meio ambiente. Cada minuto que ela estiver em vigor será pior para os australianos”, declarou Abbott.
Muitos grupos empresarias australianos também criticaram a taxa, alegando que fere a competitividade da indústria justamente em um momento de crise econômica mundial.
“A passagem dessa legislação com um preço inicial tão elevado e sem flexibilidade nos primeiros anos é muito desanimador. Ainda mais considerando o atual estado da economia e a volatilidade global dos preços do carbono”, disse Heather Ridout, presidente do Grupo de Indústrias Australianas.
Entre as promessas do governo para acalmar os ânimos dos grandes emissores e apoiar as empresas expostas à competitividade internacional está um auxílio de A$ 300 milhões para fabricantes de aço, a distribuição gratuita de 94,5% das permissões no primeiro ano para os setores exportadores e um pacote que inclui uma ajuda de A$ 10,10 semanais para residências.
A Austrália é o maior emissor per capita do planeta e possui 75% de sua geração elétrica baseada no carvão. A taxa sobre o carbono deve representar um corte de 160 milhões de toneladas nas emissões até 2020.
Durban e os Mercados de Carbono
A notícia da aprovação das leis australianas traz um novo fôlego para as negociações climáticas e para os combalidos mercados de carbono.
“Foi um passo muito positivo para o esforço global no combate às mudanças climáticas. A decisão australiana deixa claro que economias avançadas e altamente dependentes de combustíveis fósseis podem utilizar mecanismos de mercado para lidar com suas emissões”, explicou Tim Jordan, analista do Deutsche Bank, para o jornal The Guardian.
As iniciativas regionais parecem mesmo se consolidar como o futuro dos mercados, com a China, Coréia do Sul e a Califórnia preparando também o lançamento de suas plataformas.
O governo australiano espera que a aprovação influencie a COP17, que aparentemente está fadada a ficar estagnada diante do impasse sobre o futuro do Protocolo de Quioto. A existência de novos mercados regionais pode facilitar um período de transição nos próximos anos até que um acordo climático global possa ser estabelecido.
Esse conceito, de adiar a consolidação de um tratado, está sendo defendido pela União Europeia, que vai sugerir na COP17 um plano temporário até 2015.
“Estamos recebendo sinais positivos sobre a nossa proposta. Assim, os países ganhariam mais quatro anos para lidar com assuntos internos e conflitos de interesse antes de precisar se comprometer com um tratado internacional”, afirmou Connie Hedegaard, comissária climática da União Europeia.
O bloco já deixou claro que não apoiará a extensão do Protocolo de Quioto se os países que não possuem metas, como os em desenvolvimento, e os não signatários, como os Estados Unidos, não adotarem metas obrigatórias para cortar emissões.
(Por Fabiano Ávila, Instituto CarbonoBrasil, 08/11/2011)