Construção de Belo Monte e aprovação de Código Florestal ganham ressonância na capital americana
A capital americana tem sido palco de uma movimentação intensa de ambientalistas e representantes do agronegócio brasileiro nos últimos dias. Entre reuniões com autoridades e ONGs (Organizações Não-Governamentais) e entrevistas com a imprensa, esses grupos chegam a Washington com o objetivo de chamar a atenção e buscar apoio para seus setores e suas causas.
"De certa maneira é uma busca por apoio moral, por apoio político, que pode se manifestar de diferentes maneiras, e também por apoio financeiro", disse Andrew Miller, coordenador da ONG Amazon Watch, que intermediou a visita da líder indígena Sheyla Juruna a Washington na semana passada.
Juruna, líder do "Movimento Xingu Vivo para Sempre", que se opõe à hidrelétrica de Belo Monte, integrou a comitiva que veio aos Estados Unidos participar de uma audiência convocada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, braço da OEA (Organização dos Estados Americanos), sobre a construção da usina.
O governo brasileiro acabou não enviando representantes, e a audiência se transformou em uma reunião informal. No entanto, Juruna e os outros integrantes da comitiva aproveitaram a passagem pela capital americana para manter contatos com ONGs e com a imprensa. "É preciso conscientizar as pessoas não só no nosso país, mas fora do Brasil também", disse Juruna.
Mudanças
Na onda de visitas de lideranças e ativistas brasileiros, a mais recente é a da senadora Kátia Abreu (PSD-TO), representante do setor rural e também é presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), que desembarcou nesta semana nos Estados Unidos.
Com paradas em Nova York e Washington, o roteiro inclui reuniões com representantes do Congresso americano, do Banco Mundial e do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), além de encontros com investidores e visitas a universidades.
Nesta quinta-feira (3), a senadora receberá jornalistas brasileiros e americanos para um encontro informal, no qual deverá falar sobre o novo Código Florestal do Brasil, do qual é defensora, e reforçar a imagem do agronegócio brasileiro como líder na produção mundial de alimentos, com uso de alta tecnologia e práticas sustentáveis.
Fazer lobby em Washington faz parte da estratégia de diferentes grupos brasileiros há várias décadas, mas o ambiente na capital americana já não é o mesmo. "Há uma longa história de ativistas brasileiros que vêm por diferentes razões. Como Chico Mendes, nos anos 80", lembra Miller.
"Mas a dinâmica mudou muito desde os anos 80. Por exemplo, o papel que o Banco Mundial tem no Brasil é menor do que costumava ser. O Brasil é hoje uma potência emergente, uma potência econômica e política", afirma.
Importância
Apesar das mudanças, a capital americana continua sendo considerada crucial na busca de aliados para as mais diversas causas. Além do Congresso e da Casa Branca, Washington abriga diversas ONGs e centros de estudos influentes. Há, também, o apelo da imprensa estrangeira. "A cobertura da mídia nacional (no Brasil) é importante, mas a cobertura internacional também é muito importante, no sentido de legitimar a causa", afirma Miller.
Segundo ele, porém, o lobby em Washington só será bem-sucedido se tiver o apoio de um movimento de base no Brasil. "Sem esse mandato no nível local, os esforços feitos aqui em Washington não funcionam", diz.
Lobby
Ao contrário do Brasil, onde o termo lobby chega a ser considerado pejorativo por alguns, nos Estados Unidos a atividade é comum. "Aqui o lobby é um processo completamente transparente", disse Letícia Phillips, representante da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar, entidade que representa o setor no Brasil) em Washington.
Há três anos na Unica e há uma década nos Estados Unidos, Phillips trabalha pelo fim da tarifa de importação e dos subsídios ao etanol nos Estados Unidos, que prejudicam os brasileiros.
Como lobista registrada no Congresso americano, ela é obrigada a prestar contas de suas atividades periodicamente, esclarecendo com quem manteve contatos, sobre que questões tratou e quanto gastou.
Uma das únicas representantes do Brasil a fazer lobby profissionalmente nos EUA, Phillips enfrenta o desafio de, como ela mesma diz, 'contar a história do ponto de vista dos Estados Unidos, de como (derrubar a tarifa) vai ser bom para o público americano'.
Investimento
Segundo a representante da Unica, ainda há muito desconhecimento no Congresso americano em relação ao Brasil, e um grande espaço para os brasileiros investirem em lobby nos Estados Unidos. Phillips alerta, no entanto, que a atividade requer bastante investimento. Mesmo no caso das viagens esporádicas, o investimento é grande.
"É um esforço enorme, não apenas financeiro, mas até emocional", diz Miller, ao comentar a viagem da comitiva que viajou a Washington para a reunião sobre Belo Monte. "Mas o fato de que as pessoas continuam vindo para cá mostra que existe pelo menos uma percepção de que é um investimento válido", afirma o integrante da Amazon Watch. "Os resultados concretos desse investimento, porém, são mais difíceis de medir."
(BBC / G1, 03/11/2011)