A CSA (Companhia Siderúrgica do Atlântico) está processando por danos morais dois pesquisadores da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e uma da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) que realizam estudos sobre o impacto ambiental da siderúrgica na zona oeste do Rio.
O pneumologista do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana, Hermano Castro, o engenheiro sanitarista Alexandre Pessoa Dias, do Laboratório de Educação Profissional em Vigilância em Saúde, e a bióloga Mônica Lima, da Hospital Universitário Pedro Ernesto, são acusados, segundo a CSA, de tecer declarações públicas "contendo sérias denúncias contra a empresa, sem comprovação".
Dias diz que ainda não teve acesso ao processo e não sabe o que o motivou. Para ele, o problema da poluição da CSA é "público e notório". "Uma fábrica solta partículas no ar como se fosse normal. Nós informamos que há outros componentes nestas partículas, que podem ser prejudiciais", afirma. "Estamos trabalhando em cima de evidências. Quando somos chamados é nosso papel falar sobre o que estudamos."
O Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz vê os processos como uma retaliação ao relatório "Avaliação dos impactos socioambientais e de saúde em Santa Cruz decorrentes da instalação e operação da empresa TKCSA", publicado em setembro, afirmação contestada pela CSA.
O sindicato afirma ainda que a ação de processar os pesquisadores é "um ataque à livre expressão científica" --a ação contra Dias, único dos professores que assina o relatório, foi instaurada em 14 de outubro, após a publicação do documento.
O texto, encaminhado ao Ministério Público e à Defensoria Pública Federal, foi publicado na íntegra no site da Fiocruz e aponta diversas incongruências na instalação e operação da empresa, entre elas o aumento de 1000% na quantidade de ferro no ar em relação aos teores encontrados nas estações localizadas na região antes do início da pré-operação da CSA.
Crises respiratórias e doenças
Desde a inauguração da transnacional, em junho de 2010, moradores da região denunciam o aumento de casos de crises respiratórias e doenças de pele. Em duas ocasiões a companhia depositou ferro-gusa em poços ao ar livre o que gerou uma chuva de um pó brilhoso prateado na região, identificado pela empresa como pó de grafite.
No entanto, segundo o relatório, a avaliação da poeira coletada por um morador da região revelou a existência de substâncias tóxicas oriundas do processo siderúrgico, "além da presença de ferro, várias outros elementos químicos compõem o material particulado em questão, como cálcio, manganês, silício, enxofre, alumínio, magnésio, estanho, titânio, zinco e cádmio, dentre outras".
"Diversos estudos epidemiológicos nacionais e internacionais revelaram forte associação entre a exposição ambiental por material particulado e os índices de mortalidade infantil, casos de asma, bronquite crônica, infecções do trato respiratório, doenças do coração, derrames e câncer, dentre outras", continua o texto.
Para a Fiocruz, a judicialização da questão apenas atrapalha o debate e os pesquisadores têm toda solidariedade da instituição, que os considera referência tanto ética quanto científica neste campo de estudos.
Ainda nesta semana a Fundação deve instituir um grupo de trabalho interdisciplinar para ampliar os estudos do relatório. A Folha não conseguiu falar com a Uerj.
Segundo o Inea (Instituto Estadual do Ambiente), em breve será assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a CSA, prorrogando a fase de testes da Licença de Instalação (LI).
Nesta segunda-feira o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) requereu em uma liminar que a CSA seja proibida de despejar ferro gusa em poços ao ar livre. "O resultado da análise técnica comprovou a relação direta entre a prática da TKCSA e a violação do padrão de qualidade do ar nas comunidades vizinhas à empresa", afirma o órgão
O Ministério Público já denunciou a empresa por supostos crimes ambientais duas vezes.
(Por Paula Bianchi, Folha Online, 01/11/2011)