O Greenpeace, ONG de defesa ambiental, e a Asia Pulp & Paper (APP), gigante indonésia da polpa de celulose, estão em pé de guerra. Um conflito impiedoso no qual a aspereza das acusações enfrenta a obsessão pelas justificativas.
O que há em jogo? Para a primeira, alertar a opinião pública internacional sobre o destino das últimas florestas naturais da Indonésia. Para a segunda, muito dependente dos mercados ocidentais, restaurar sua imagem, danificada por uma campanha que a acusa de usar madeira protegida para fabricar matéria-prima que será transformada em lenços de papel, móveis de escritório e caixas de embalagem...
Os militantes ecologistas venceram uma primeira batalha. A americana Mattel anunciou que exigiria de seus fornecedores de embalagens que eles não se abastecessem mais com a APP.
Esta última respondeu com uma ampla campanha publicitária na imprensa internacional. O grupo também convidou, no final de setembro, alguns jornalistas a irem até Sumatra, a grande ilha do oeste do arquipélago, um dos “pulmões” da República e principal campo de batalha do conflito entre a fábrica e a ONG.
“Olhem!”, mostra Canecio Munoz, encarregado das questões ambientais na APP, “estamos sobrevoando a reserva natural protegida de Giam Siak Kekli. Ainda há uma zona ali que pode ser explorada legalmente. Temos a licença para isso, mas decidimos não derrubar uma única árvore.”
O avião perde altitude, e agora voa em rasante para atingir uma parte desmatada: “Isto é o que chamamos de ‘zona de proteção’ e ‘zona de transição’, que fazem parte de nossa concessão. Elas permitem que se crie uma área de segurança entre as superfícies protegidas e as partes legalmente exploráveis”, explica Munoz, afirmando que sua empresa, dirigida por uma das mais ricas famílias do país, respeita rigorosamente a legislação nacional.
“Sessenta e cinco por cento da polpa de celulose produzida pela APP é certificada quanto à sua origem de madeira não controversa (que não saiu de uma floresta natural ou de uma floresta de alto valor ambiental)”, reforça Munoz. Embora a empresa admita que nem toda a madeira que ela utiliza seja originada de “plantações sustentáveis”, sua meta é chegar a 100%, até 2015, para as acácias e os eucaliptos.
Questionado sobre as acusações do Greenpeace, o executivo da APP negou todas. E as fotos das zonas desmatadas nesse mesmo “bloco” de Giam Siak Kekli que sobrevoamos? Um engano, segundo Canecio Munoz. “Esses lotes fotografados estão situados no limite de reservas, em uma exploração perfeitamente legal”.
E a derrubada de árvores em zonas protegidas? “É o governo que decide onde a exploração é permitida.” E o desalojamento de povos locais (ainda segundo a ONG)? A APP mostra aos jornalistas um vilarejo onde camponeses recebem educação gratuita para cultivar árvores frutíferas.
E, em sua fábrica próxima à floresta, batizada com o belo nome de “Indah Kiat” (“belo esforço”, em indonésio) – há 9 mil operários trabalhando. “Estamos contribuindo para a criação de empregos!”, comemora o executivo da APP.
O Greenpeace não acredita em uma palavra desses discursos. Em seu relatório dedicado à Giam Siak Kekli, a ONG afirma que, “na prática, a APP está destruindo as florestas naturais e as turfeiras, vitais para espécies ameaçadas como o tigre. A APP continua a obter concessões florestais por meio da corrupção”.
A Giam Siak Kekli é somente um dos exemplos apresentados pelo Greenpeace para condenar a APP. No local, ela tem recolhido testemunhos para acusação. Como em Jumrah, um pequeno vilarejo situado no distrito de Ban Siapiapi, na mesma província.
Tarmizi, com um cigarro na boca e consertando o motor de sua canoa, está furioso. “Logo ali”, conta ele apontando um ponto vago na floresta desnuda, “uma jovem de 17 anos foi devorada por um tigre. Os animais estão sendo expulsos de seus habitats naturais pela empresa. Estão destruindo nossa floresta”.
Aqui, a companhia se chama Ruj Ruas Utama Jaya, uma filial da APP. “Nós sempre cortamos madeira, mas era para fabricar nossas casas, nossos barcos e os caixões de nossos mortos. A fábrica está transformando nossas vidas”, lamenta o camponês Upal Supardi, encostado em uma seringueira, de onde extrai a seiva branca do látex. Ele conta como, em agosto, 300 dos 3 mil habitantes desse vilarejo de casas espalhadas pela floresta tropical se uniram: “Fomos todos expulsos por uma escavadeira que perfurava nossas terras”.
O prefeito de Jumrah está preocupado. Sukardi Ahmas teme uma revolta popular. “Propus uma negociação aos diretores da empresa. Eles aceitaram a ideia, mas na verdade não houve nenhuma conversa ainda. Eu pedi que eles me mostrassem os documentos provando que eles possuíam uma licença de exploração. Não me apresentaram nada.”
Estaria a filial da APP aqui envolvida em uma operação ilegal? É impossível confirmar. “A APP precisa fornecer cada vez mais madeira para suas usinas. Para isso, a empresa tem pedido cada vez mais licenças que permitam transformar a floresta em explorações florestais. É mais rentável derrubar as árvores do que replantar”, explica Yuyun Indradi, porta-voz do Greenpeace na Indonésia. “E tudo isso”, ele acusa, “se faz às vezes com a cumplicidade dos dirigentes políticos locais”.
A descentralização do governo de Jakarta favoreceu o desmatamento. Os representantes locais costumam pagar suas dívidas com as empresas que financiaram suas campanhas eleitorais concedendo-lhes generosas concessões. No final, sem que os industriais tenham necessariamente ultrapassado o limiar da legalidade, muitas vezes são os camponeses pobres que sofrem as consequências da exploração industrial nas florestas.
Será que existe espaço para um acordo entre os ambientalistas e as indústrias? Agus Purnomo, assessor especial da presidência indonésia para questões de mudança climática, resume à sua maneira o debate: “As exigências das ONG às vezes vão além daquilo que as empresas podem aceitar. Mas se as ONGs não estivessem ali, a tendência seria faltar vigilância”. Enquanto não se entra em um acordo, a guerra continua.
(Por Bruno Philip, com tradução de Lana Lim, Le Monde / UOL, 18/10/2011)