O presidente boliviano participou de uma manifestação de apoio ao seu governo realizado por suas bases camponesas e vários militantes do Movimento Al Socialismo (MAS) no trópico de Cochabamba. Na oportunidade falou da proposta de uma consulta popular sobre a polêmica rodovia que se projeta sobre um território indígena. Os indígenas que retornaram sua marcha até La Paz rejeitam a proposta.
A Oitava Marcha Indígena voltou a caminhar depois de seis dias em que uma ação policial dispersou a marcha de mil participantes. Ontem entraram no Departamento de La Paz, cuja cidade está a 300 km, onde exigirão do presidente Evo Morales a suspensão definitiva do projeto da estrada que passa por dentro do Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure (Tipnis), além de outras 15 reivindicações.
Em outra região, Cochabamba, Morales participou de um ato de apoio ao seu governo organizado por bases camponesas e vários militantes do Movimento Al Socialismo (MAS).
“A Marcha já entrou em La Paz. Essa é a notícia”, disse desde a comunidade Las Delicias Rafael Quispe Flores, mallku das Indústrias Extrativas do Conselho Nacional de Ayllus y Markas do Qullasuyu (Conamaq). O aymara olha com preocupação o rosto de sua filha Jimena, de 11 anos, ferida por uma cacetada que lhe deram os policiais em Yucumo no domingo passado.
A Oitava Marcha saiu no sábado às seis da manhã da comunidade Quiquibey, 43 quilometros de onde foram agredidos por 500 policiais antimotin. Os marchantes disseram que necessitam de roupas e cobertas porque muitas das roupas que tinham foram queimadas pelos policiais. Muitos indígenas sairam da repressão feridos e apenas com o que tinham no corpo. Com a solidariedade de povoados como San Borja e Rurrenagaque ganharam roupas e medicamentos.
As e os marchantes prevêem que chegarão à sede do governo em 12 de outubro, a quatro dias das eleições para os magistrados do Órgão Judicial.
Na mesma data, as três organizações camponesas de apoio incondicional a Morales prometem “inundar” La Paz com uma mobilização de 200 mil filiados da Confederação Sindical Única dos Trabalhadores Camponeses da Bolívia (Csutcb, da qual o presidente milita), da Confederação Nacional de Mulheres Camponesas Indígenas Originárias da Bolívia Bartolina Sisa (Cnmciob BS) e da Confederação Sindical de Comunidades Intercultural da Bolívia (Cscib, organização que realizou o bloqueio à marcha indígena em Yucumo, que teria justificado a intervenção policial).
Como “ensaio” do que será o 12 de outubro, essas três organizações marcharam na sexta passado para La Paz para agradecer o presidente por encarnar o “processo de mudança” boliviano. Mas a população sensibilizada pelas imagens da repressão contra os indígenas gritou “assassinos”, entre outras delicadezas, e até jogaram água de alguns edifícios. No sábado, a mobilização pró-governamental se manifestou na localidade de Aroma, em Cochabamba, encabeçada pelas seis Federações do Trópico cochabambino, cujo presidente também é Morales.
Do outro lado e da outra marcha, dizem os indígenas: “Exigimos que o presidente do Estado tome a decisão histórica de modificar o projeto da estrada através de uma lei que estabeleça que a rodovia não atravessará o Tipnis”, disseram os marchantes em uma resolução antes de reiniciar a caminhada. Para os indígenas, o governo não cumpriu com a Constituição no que diz respeito à Constituição no que se refere a uma consulta prévia, livre e informada às comunidades cujos territórios podem ser afetados por megaprojetos.
Em sua fala de ontem, o presidente deixou de lado esses questionamentos e focou no dano ambiental que poderia causar a rodovia de 306 quilômetros. Morales comentou que a estrada passará por várias comunidades do Tipnis onde já existe um caminho vicinal, e garantiu que apenas 60 km de selva virgem serão derrubados pelas escavadeiras.
Morales disse que irá realizar uma consulta às comunidades afetadas para saber se desejam ou não a estrada e deu a entender que esse referendum poderá se estender aos departamentos de Cochabamba e Beni envolvidos no traçado que também unirá comercialmente o Chile com o Brasil.
A Oitava Marcha rejeitou essa proposta porque dizem que desrespeita o Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), assim como a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas das Nações Unidas, ambos com status de lei na Bolívia.
Hoje, os mil indígenas que compõem a marcha avançaram outros 20 ou 30 quilometros até o Palácio Quemado. Ontem, três deputados da base do governo foram até Las Delicias para reatar o diálogo. Mas, os marchantes lembraram que no domingo passado ao meido dia lhes havia chegado um convite do governo para negociar as 16 reivindicações e, poucas horas depois, a polícia os reprimiu.
Os indígenas descartaram a proposta de acompanhamento policial da marcha até a entrada em La Paz porque não querem ter por perto ninguém que lhes agrediu. “Pedimos o amparo e o apoio de todo o povo boliviano e, em particular, do povo de La Paz para continuar com nossa marcha. Para isso, convocamos a todos os bolivianos e paceños a virem ao nosso encontro e acompanharem nossa marcha pacífica até a cidade de La Paz”, disseram os indígenas.
(Por Sebastián Ocho, Página/12 / Cepat / IHU On-Line, 04/10/2011)