A tribo Klallam está em festa há uma semana por causa da “vingança do salmão selvagem, animal sagrado”. O ponto culminante das celebrações foi a grande explosão de dinamite que pulverizou ontem, em uma nuvem de detritos, a barragem de Lower Elwha, um rio no Estado de Washington.
“A retomada do curso natural – declarou o ministro do Interior, Ken Salazar – assinala o início de uma nova era nas relações entre os nossos rios e as comunidades que vivem em suas margens”.
A barragem de Lower Elwha, uma muralha de 35 metros de altura, é apenas a última a cair sob os golpes de uma nova tendência, que está apagando da paisagem norte-americana uma das marcas distintivas do século XX.
A demolição das barragens tem sido invocada há muito tempo pelos ambientalistas, que as consideram um estupro da paisagem. O aliado natural nessa campanha são os índios dos EUA, descendentes de tribos indígenas que preservaram tradições ancestrais de respeito pela natureza.
Mais recentemente, os cientistas especialistas em climatologia, geografia e geologia se uniram a uma tese “revisionista”: longe de regular os rios, as barragens, muitas vezes acentuam as enchentes e as inundações, enquanto um retorno ao fluxo natural permite que se reduzam as calamidades. Até mesmo a direita acabou inclinando, por uma razão prosaica: manter as represas custa caro, em uma fase de altos déficits públicos, enquanto destruí-las significa ressuscitar o negócio da pesca e do turismo.
Resultado: os EUA demoliram 925 barragens, a maior parte delas nos últimos quatro anos. Um número já enorme, mas que tende a aumentar rapidamente, porque o total das barragens dos EUA gira em torno das 80 mil. A maioria delas foi construída há mais de meio século e estão se aproximando da sua “data de validade” de acordo com as normas de segurança.
A inversão de tendência é impressionante, porque as barragens eram um símbolo da “conquista do território” por parte dos colonos brancos, e, no século XX, um motor de modernização: das fábricas têxteis às fábricas de papel no início do século XX, muitas áreas da Costa Leste e do Centro-Oeste viram florescer o seu primeiro boom industrial justamente ao longo dos rios e perto das represas que geravam a eletricidade. Até a Segunda Guerra Mundial, as centrais hidrelétricas alimentadas por barragens forneceram 40% de toda a energia dos EUA.
O impulso mais vigoroso à construção das represas ocorreu na Grande Depressão, precisamente aquele período histórico que hoje os norte-americanos “redescobrem” para o seu próprio prejuízo, por causa das analogias com a crise atual.
Para arrastar a economia dos EUA para fora da Depressão, nos anos 1930, o presidente Franklin Delano Roosevelt lançou com o New Deal um imponente programa de obras públicas. As barragens estavam em primeiro lugar entre as infraestruturas construídas nesse período e algumas delas entraram para a história.
Esse é o caso da Hoover Dam, no Black Canyon do rio Colorado, 40 quilômetros ao sul de Las Vegas: foi inaugurada no dia 30 de setembro de 1935 por Roosevelt, que teve a elegância de dedicá-la ao seu infeliz antecessor (porque os fundos haviam sido alocados quando o presidente era Herbert Hoover, o do crack da bolsa de 1929). Na paisagem espetacular ao longo da estrada US-93, a Hoover Dam havia sido uma atração turística até hoje.
Ainda mais importante foi a experiência da Tennessee Valley Authority, instituída em 1933 para ajudar uma das áreas mais atingidas pela Depressão: essa entidade pública construiu 50 barragens e 12 centrais hidrelétricas, tornou-se um modelo de planejamento estatal do território, copiado depois da Segunda Guerra Mundial em muitos países emergentes.
Pode surpreender a marcha a ré de hoje justamente quando a energia hidrelétrica permite reduzir as emissões de dióxido de carbono. Na verdade, a National Hyrdopower Association aumentará em 66% a produção de energia nos próximos 15 anos, concentrando-a nas grandes barragens mais novas e mais eficientes.
Já agora, grande parte da hidroenergia vem de 3% das barragens. Quanto às outras, elas podem seguir o destino de Elhwa Dam e restituir a água aos seus proprietários. “Antigamente, nos chamavam de povo salmão”, diz Robert Elofson, da tribo Klallam, “porque para nós o peixe tinha uma mesma dignidade que a espécie humana. Neste rio, os salmões caíram de 400 mil para 3 mil. Agora, eles podem reconquistá-lo”.
(Por Federico Rampini, com tradução de Moisés Sbardelotto, La Repubblica / IHU On-Line / EcoDebate, 26/09/2011)