Inquérito, que levou à prisão de nove pessoas, diz que mineradora pagou R$ 41 milhões a empresa acusada. Segundo Ministério Público, pagamento foi identificado pelo Coaf; Vale diz que desconhece a investigação da PF
A Polícia Federal investiga um suposto esquema fraudulento de apropriação de terras públicas do Estado de Minas Gerais ricas em minério de ferro e suspeita do envolvimento da mineradora Vale.
A PF e os Ministérios Públicos Federal e estadual querem saber as razões de a companhia ter pago R$ 41 milhões a supostos integrantes de uma quadrilha que fraudava títulos de terras públicas. A Vale diz desconhecer o inquérito.
De acordo com documento do Ministério Público de Minas, a transação financeira foi registrada pelo Coaf, órgão do Ministério da Fazenda responsável pelo combate à lavagem de dinheiro.
A Operação Grilo, deflagrada ontem em cidades do norte de Minas, resultou na prisão de nove pessoas -uma ainda está foragida- e no cumprimento de mandados de busca e apreensão. Foram presos funcionários públicos, um empresário e uma tabeliã.
Em petições do Ministério Público estadual, às quais a Folha teve acesso, os promotores apontam ainda como suspeitos os prefeitos de Indaiabira e Vargem Grande do Rio Pardo, os irmãos Marcus (DEM) e Virgílio Penalva Costa (DEM), respectivamente. Ambos foram afastados.
Também em razão da investigação, o governo de Minas afastou ontem o secretário de Regulação Fundiária, Manoel Costa. Dois funcionários do Iter (órgão do Estado responsável pela regularização de terras), que estão entre os presos, foram exonerados, segundo o governo.
Conforme as investigações, o esquema utilizava documentos emitidos pelo Iter para dar a posse de terrenos a laranjas, que transferiam as terras para intermediários da organização criminosa. Estes negociariam as terras com mineradoras.
Segundo documento do Ministério Público, "em apenas um dos casos sob investigação, a Vale S/A comprou -efetuando pagamento único e em espécie- vasta extensão de terras subtraídas criminosamente do Estado de Minas Gerais pelo espantoso valor de R$ 41 milhões". A operação financeira detectada pelo Coaf foi realizada em 28 de agosto, segundo o Ministério Público.
Os promotores acusam a Vale e a empresa Floresta Empreendimentos Ltda de "patrocinar" disputa por terras no norte de Minas. Ainda segundo o Ministério Público estadual, a Floresta Empreendimentos é uma empresa de fachada, cujos sócios são empresas sediadas no Uruguai.
Vale diz em nota que desconhece inquérito da PF
A mineradora Vale S/A informou que desconhece o inquérito que investiga as fraudes envolvendo terras públicas e disse que nunca foi convocada para dar explicações nessa investigação feita pelos Ministérios Públicos Federal e de Minas Gerais.
Em nota divulgada ontem, a empresa disse: "A Vale esclarece que tem realizado estudos no norte de Minas para implantar unidade de mineração de ferro capaz de gerar desenvolvimento para a região, conforme protocolo já assinado com o governo".
"A Vale possui procedimento sistematizado de aquisições baseado nos mais rigorosos critérios éticos", afirma o texto. Segue a nota: "Nos processos de aquisição de terrenos realizados na região, a companhia não identificou irregularidade".
A empresa finaliza dizendo não ter conhecimento dos fatos: "A Vale desconhece o inquérito em questão, não tendo sido convocada para prestar esclarecimento sobre o assunto, mas está disponível para isso se notificada pela autoridade competente".
Os prefeitos de Indaiabira (MG) e Vargem Grande do Rio Pardo (MG), os irmãos Marcos e Virgílio Penalva Costa, ambos do DEM, negaram que tenham participação no suposto esquema.
"Fui eu que denunciei as irregularidades ao Iter [responsável pela regularização fundiária no Estado] no ano passado. Fui perseguido e ameaçado de morte. Minha cidade não tem mineração", disse Marcus Penalva Costa.
Seu irmão, Virgílio, afirmou que não sabe a razão para ser investigado e nega qualquer participação no suposto esquema. A reportagem não conseguiu falar com representantes das pessoas detidas na operação da PF.
(Por Paulo Peixoto, Folha de S. Paulo, 21/09/2011)