A peça de ficção publicada pelo Financial Times e patrocinada pela Ernst & Young nesta semana dá o tom do descompasso em que anda a questão climática para economistas e políticos do mundo. "Uma mentalidade sustentável" traz o título do caderninho encartado na edição de quarta-feira (07/09) do diário econômico. Cheio de "insights" para líderes do business, vem na capa com a foto da charmosa secretária espanhola para mudança climática, Teresa Ribera Rodríguez.
O foco é a aplicação de tributos para financiar a monumental transformação de uma economia ancorada até a sua mais profunda raiz nos combustíveis fósseis. "A abordagem da espanha para uma política energética verde". "Mudando comportamento com incentivos e impostos". "O papel dos tributos em um clima em mudança". Esses eram os destaques do encarte. Um conteúdo e um design da mais alta qualidade, cheio de idéias e dicas.
Só um problema. A realidade do mundo dos negócios é outra, completamente apartada da noção nebulosa de sustentabilidade.
Na última página da publicação, curiosamente batizada de "T Magazine", talvez o único alento de lucidez. Um artiguete do diretor-executivo do Global Compact, iniciativa das Nações Unidas para responsabilidade corporativa, George Kell. Nele são dados os números do descompasso.
Menos de 15% das 500 maiores empresas listadas pela revista Fortune encaram o desafio socioambiental de fato. Fora da lista a percentagem cai para um dígito, se muito. O problema é a falta de dados das empresas que considerem essas questões relevantes para a sua contabilidade.
"A lógica do curto prazo domina o sistema de mercado", sentencia o alemão Kell. E os governos estão impotentes nessas questões, já que "são naturalmente conduzidos pelos ciclos eleitorais". "Continuamos num vácuo de governança na arena internacional", conclui ele.
Olhando para as últimas declarações do secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, parece mesmo que estamos todos numa nave onde o piloto sumiu. Isso se algum dia de fato ele existiu. Não que o mandatário da ONU esteja desconsiderando a ameaça climática. Pelo contrário. Ele tem cada vez mais adotado um tom desesperador em suas declarações.
O problema é a audiência. Ninnguém na mídia, nos governos e até mesmo no público parece prestar muito a atenção ao que Ban vem dizendo. Em alguns casos, fazem até graça do secretário-geral. Isso sem contar os comentários raivosos e discrentes de leitores e espectadores.
Aproveitando o aniversário dos 10 anos dos "ataques terroristas" do 11/09, há espaço para uma vasta gama de teorias conspirativas. O mandatário da ONU, a propósito, tem ignorado a maior parte dos eventos marcados para o aniversário dos ataques. Mas a realidade é que ninguém parece disposto a se sacrificar para salvar o mundo, a civilização, ou as gerações futuras. Afinal de contas, quem pode ser feliz sem seu carro, seu tênis Nike, seu IPhone?
(Por Mariano Senna, Ambiente JÁ, 09/09/2011)