Mais da metade do carvão utilizado para a produção do setor siderúrgico brasileiro vem de fontes ilegais. Um levantamento inédito promovido pelo Instituto Observatório Social conclui que, apesar de pressões por melhora nos últimos anos, a maior parte da produção do aço no país se mantém à margem da lei.
A pesquisa teve início em Nova Ipixuna, porta de entrada ao desmatamento ilegal com finalidade de produção de carvão que abastece o polo siderúrgico de Carajás. A cidade entrou no mapa mundial no fim de maio, quando foram mortos os líderes extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo. O casal estava há anos na lista de ameaçados por madeireiros locais.
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No município, os repórteres da revista do instituto, ligado à CUT, encontraram 500 fornos produzindo em carvoarias ilegais. As imagens mostram uma gigante estrutura em plena região amazônica, o que suscita a indagação de como nenhuma autoridade flagrou este e outros estabelecimentos ilegais até hoje.
“O negócio de carvão ilegal envolve grandes somas de dinheiro e é controlado por empresários e políticos e alto escalão. Tem muito político sendo financiado e visceralmente ligado a esses esquemas”, responde Roberto Scarpari, do escritório do Ibama em Marabá.
O estudo chegou à conclusão de que a maior parte do carvão que abastece o polo siderúrgico de Carajás é ilegal por meio de uma conta complexa, mas óbvia. Considerando a quantidade de carvão necessária para a produção de uma tonelada de ferro-gusa, e cruzando esse dado com a produção declarada de cada uma das empresas, chega-se à assustora constatação de que mais da metade do produto final é fruto de “combustível” entregue ilegalmente. O cálculo é de que 4 milhões de metros cúbicos extraídos de maneira ilícita produzam um lucro de R$ 2,5 bilhões a R$ 3 bilhões ao ano. “Se a queima ilegal de madeira fosse suspensa de um dia para o outro, o setor siderúrgico brasileiro entraria em colapso”, avalia o instituto.
Soma-se a isso o fato de as carvoarias ilegais continuarem utilizando mão de obra escrava, sem equipamentos de proteção, sem alojamento e sem atender às mais básicas necessidades. A revista considera que o estado do Pará é “sócio” do esquema. Aceita documentos falsos e manipula operações de fiscalização, permitindo que carvão produzido ilegalmente seja entregue como se fosse oriundo de uma área regularizada. “É praticamente impossível um secretário que queira fazer um trabalho sério permanecer mais que dois ou três anos no cargo”, resigna-se Walmir Ortega, ex-secretário estadual do Meio Ambiente.
O governador Simão Jatene (PSDB) se recusou a responder às perguntas enviadas por correio eletrônico. Os repórteres gostariam de saber como a administração estadual pretende enfrentar o desmatamento, o trabalho escravo e a corrupção na Secretaria do Meio Ambiente. Na gestão de Ortega, durante o governo de Ana Júlia Carepa (PT), várias operações foram realizadas em parceria com a Polícia Federal, resultando no afastamento de 70 servidores. Mas o próprio admite que o problema não chegou ao fim, levando-o a entregar o cargo.
(Rede Brasil Atual, 23/06/2011)