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passivos do petróleo petroquímica
2011-06-20 | Tatianaf

As famílias vizinhas do Polo Petroquímico de Capuava estão sendo contaminadas. Elas sofrem e adoecem lentamente. Os efeitos da poluição emitida há mais de 50 anos deixam um rastro desumano em quase todas as casas dos bairros Capuava, em Santo André, Silvia Maria e Sônia Maria, em Mauá, e São Rafael, na Capital.

As enfermidades mais comuns são a tireoidite de Hashimoto, uma disfunção na glândula tireóide. A doença traz diversos sintomas para o resto da vida - mesmo com medicação diária (sem acompanhamento, a pessoa morre) -, como depressão, cansaço, queda de cabelo e alteração de peso, além de doenças respiratórias. O caso é grave, mas as empresas do polo não colaboram com o Ministério Público e, principalmente, com a população.

O alarme soou em junho de 2002. Quem fez o alerta foi a professora e endocrinologista Maria Angela Zaccarelli Marino, da Faculdade de Medicina do ABC. O veredicto saiu após levantamento realizado durante 12 anos de pesquisas.

Nesse tempo, a médica constatou alto índice de pessoas que desenvolveram tireoidite crônica, mais conhecida como mal de Hashimoto. Os vizinhos do polo sofriam cinco vezes mais de problemas na glândula da tireóide do que outra região pesquisada.

O Diário teve acesso a documentos do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria do Estado de Saúde e artigos publicados em revistas internacionais que indicam a probabilidade de o alto número de doentes estar ligado à poluição das empresas do polo.

Em 2008, o CVE enviou estudo com 1.533 pessoas, sendo 781 no polo e 752 em Diadema (área de controle), para o promotor público do Meio Ambiente de Santo André, José Luiz Saikali. O resultado confirmou a tese da endocrinologista (veja arte acima).

O promotor solicitou exames mais elaborados ao Laboratório de Poluição Atmosférica da USP, com moradores e do ar da região. "A associação do polo queria colaborar, mas depois desistiu", disse ele.

No meio dessa confusão estão mais de 65 mil pessoas. Os primeiros resultados para descobrir as causas do aumento significativo das moléstias vão sair com dez anos de atraso.

"Até setembro, vamos ter as primeiras análises. Esse vai ser um passo importante", disse Paulo Saldiva, coordenador do laboratório da USP. A Associação das Empresas do Polo Petroquímico informou que não haveria tempo necessário para responder à reportagem.

ORIGEM DOS PROBLEMAS PODE ESTAR NA FUMAÇA DAS EMPRESAS

O clima é diferente. O horizonte é cinza. Os olhos ardem. A pele coça. O nariz escorre. As pessoas ficam ou estão doentes. Assim é a vida de grande parte dos moradores e trabalhadores dos arredores do Polo Petroquímico de Capuava, nas cidades de Mauá, Santo André e Capital.

A origem de todo esse transtorno pode estar ligada à fumaça que sai continuamente das chaminés das 14 empresas do polo, ao longo das últimas décadas.

A equipe do Diário constatou que a coisa mais comum ao andar pelas ruas dos bairros Capuava, em Santo André, Silvia Maria e Sônia Maria, em Mauá, e São Rafael, na Capital, é encontrar pessoas que sofrem do mal de Hashimoto e de doenças respiratórias, como rinite, sinusite ou bronquite. Todos acusam sistematicamente o Polo Petroquímico como agente transmissor.

Além da sensação de incômodo, a situação piora quando as petroquímicas "soltam aquela coisa". É assim que os moradores definem a liberação e queima de gases pelo flair (tipo de uma chaminé), mais as explosões, que assustam os idosos e as crianças nas madrugadas.

Alguns moradores, cansados de sofrer com os graves sintomas do mal de Hashimoto, como a desempregada Marlei Florência, 42 anos, venderam a casa por preço menor e foram embora. "Não tinha forças nem para levantar da cama. Essa foi a minha saída, mas perdi muito dinheiro e minha saúde", disse Marlei, que morou por mais de 40 anos no Sônia Maria.

Para Maria Angela Zaccarelli, professora e endocrinologista da Faculdade de Medicina do ABC, o perigo, além dos sintomas do mal de Hashimoto, é a associação com outras enfermidades, como esclerose múltipla, infertilidade precoce, lúpus e vitiligo.

"Por isso que é preciso saber o que sai das chaminés dessas empresas. Não podemos esperar mais, é preciso fazer alguma coisa já", comentou a especialista.

TEMPO DE EXPOSIÇÃO
O período para desenvolver a tireoidite ou doenças respiratórias varia de dois a quatro anos, segundo os casos diagnosticados pela pesquisadora.

A equipe do Diário encontrou quatro funcionários de uma empresa do polo que desenvolveram o mal de Hashimoto após dois anos de trabalho. "Não podemos falar nada. Se isso acontecer somos demitidos no outro dia", disse uma recepcionista.

DIA COMEÇA COM UM COMPRIMIDO
"Eu sou parte do Polo Petroquímico", diz a dona de casa Ivete Nardim Ceconello, 57 anos. Há 30 anos, a primeira coisa que faz ao acordar é ingerir um comprimido para o mal de Hashimoto. Ela sofre no corpo os efeitos do problema na glândula da tireóide por ser vizinha do complexo de empresas petroquímicas.

Com 21 anos, recém-casada, mudou para o bairro Capuava, em Santo André. "Não tinha nenhum problema de saúde, mas depois de alguns anos comecei a engordar. Aí fui fazer os exames e o resultado veio", lembra. Foi constatada uma queda nos hormônios da tireóide, e o médico pediu para realizar uma bateria de exames complementares. "Não deu outra, a minha tireóide estava tão grande que o técnico pensou que a máquina estava quebrada", comenta.

Desde então, a dor nas pernas e o ganho de peso foram compreendidos. A causa para desenvolver a doença, ela aponta sem hesitar. "Não tem dúvida. Nós respiramos esse ar com fuligem o dia inteiro."

Ao andar pelos arredores é fácil compreender os efeitos da fuligem. Os portões e paredes brancas ficam encardidos. "As minhas pacientes brincam que os cachorros delas amanhecem brancos e depois ficam pretos", diz a médica Maria Angela Zaccarelli Marino.

‘ESSA DOENÇA TORTURA AOS POUCOS'
Dor nas pernas, cansaço, boca seca, sono, moleza, queda de cabelos e outras diversas sensações desagradáveis. É assim que vários moradores da região do Polo Petroquímico se definem após a equipe do Diário fazer a simples pergunta de como é o seu dia a dia.

Não é diferente com a comerciante Elaine Aparecida Martins Nonato, 42 anos, quando não toma o seu comprimido, ainda em jejum, para o mal de Hashimoto.

"Impressionante como essa doença tortura aos poucos. Como sou muita esquecida, fico até dois dias sem tomar, aí a coisa fica feia", comenta.

A comerciante reside no bairro Sônia Maria, em Mauá, e cresceu na rua Antonio Calheiros, que tem as empresas do polo literalmente na frente da casa de sua mãe. "Além daquele pó preto que impregna em tudo, tem o forte cheiro de gás", aponta a moradora.

O surgimento do mal de Hashimoto ocorreu aos 28 anos, meses após dar à luz a sua filha. "Engordei muito e tinha dores nas pernas, cansaço, e não deu outra no exame. Comecei tomando 40 miligramas do remédio por dia, e hoje já estou no de 125. Mas essa doença, na região, infelizmente é normal", frisa a comerciante.

PROBLEMAS RESPIRATÓRIOS SÃO COMUNS
Basta mudar o tempo para a balconista Elizangela Fernandes, 31 anos, perder o sono e passar a noite ao lado da filha Kimberly Sofhia, de 2 anos e 6 meses. As duas sofrem de problemas respiratórios crônicos, mas a criança é a mais afetada. A mãe tem crises de rinite desde os 14 anos; a pequena sofre de bronquite desde o primeiro ano de vida.

"Vivo com o nariz escorrendo, mas o problema está nela. É sarar de uma crise e, em pouco tempo, volta. É terrível, não aguento mais dar antibiótico", diz a mãe.

Para tentar melhorar a qualidade de vida da criança e não perder horas no hospital, a família comprou uma máquina de inalação, item comum nas casas visitadas pela equipe do Diário.

"Sempre faço inalação nela, até fica mais calma, mas parece que as crises cada vez ficam mais fortes", comenta a balconista, que sempre morou no bairro Capuava, em Santo André.

Até hoje apenas um estudo, em parceria entre a Faculdade de Medicina do ABC e o laboratório de Poluição Atmosférica da USP, foi realizado. O resultado da pesquisa, realizada em 37 árvores para saber a concentração de chumbo, não foi nada agradável: 4 ppm (partes por milhão), na média. Mas em algumas concentrava 15,6 ppm. O ideal seria 1 ppm.

(Por Willian Novaes, DGABC, 20/06/2011)


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