O agricultor Marcos Gomes da Silva, 33 anos, foi assassinado a tiros, diante da mulher e de outras três testemunhas, por dois homens encapuzados na zona rural de Eldorado dos Carajás. Silva teve a orelha decepada após o crime, da mesma forma que o líder extrativista José Cláudio Ribeiro da Silva, morto há duas semanas, juntamente com sua mulher, Maria do Espírito Santo. A notícia do assassinato, o quinto na região amazônica em duas semanas, chegou ao governo na tarde de ontem e levou a presidente Dilma Rousseff a convocar uma reunião com governadores da Região Norte e a anunciar uma ação militar de emergência, batizada de Operação de Defesa da Vida.
O superintendente da Polícia Civil em Marabá, delegado Alberto Teixeira, afirmou que a vítima não tinha inimigos nem era um líder da comunidade, que reivindica ser assentada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária. "Pode ter sido um assassinato aleatório para atrapalhar as investigações sobre o crime ocorrido em Nova Ipixuna", disse o delegado, referindo-se à morte do casal de extrativistas do Pará. Segundo ele, não há evidências de que o assassinato do agricultor tenha sido resultado de conflitos por terras.
Tragédia
A agonia de Gomes da Silva começou na tarde de anteontem, quando ele construía uma ponte sobre um córrego perto do local onde morava com a família. Dois encapuzados chegaram atirando. Atingido no abdome, ele saltou no rio e se escondeu no matagal, segundo Djesus Martins de Araújo, coordenador do acampamento.
Após a saída dos agressores do local, o agricultor procurou ajuda na casa de um vizinho. Eram cerca de 16h, e somente cinco horas depois os acampados conseguiram um carro para transportá-lo até Eldorado dos Carajás - cidade que foi palco de um massacre de 19 sem-terra em 1996.
No caminho, porém, os acampados tiveram de parar, pois a estrada estava bloqueada com estacas. Os encapuzados surgiram, retiraram Gomes da Silva à força do carro e atiraram. Os acompanhantes, sob a mira de uma pistola e de uma espingarda, deram meia volta.
Somente no dia seguinte os agricultores puderam resgatar o corpo e avisar a polícia, já que não há telefone no acampamento. Depois de resgatar o corpo, a polícia o transportou até Marabá, onde as testemunhas prestaram depoimento. Além da orelha decepada, Gomes da Silva teve ferimentos no pescoço que, em um primeiro momento, a polícia interpretou como uma tentativa de degola. Mais tarde, o delegado Teixeira disse que os cortes poderiam ter sido provocados pelos próprios tiros.
O coordenador do acampamento disse que as cerca de 25 famílias que ocupam o local desde 2009 nunca sofreram ameaças ou foram importunadas por pessoas que reivindicassem a propriedade das terras.
José Batista Afonso, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Marabá e ativista pela reforma agrária, afirmou que é "precipitado" descartar conflitos agrários como possível causa para o assassinato. "Os acampados reivindicam a posse de áreas que haviam sido compradas para a formação de uma fazenda", afirmou o advogado.
Planalto
Em Brasília, Dilma convocou os ministros José Eduardo Cardozo (Justiça), Nelson Jobim (Defesa), Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) e Maria do Rosário (Direitos Humanos), além dos governadores Simão Jatene (Pará), Omar Aziz (Amazonas) e Confúcio Moura (Rondônia) para discutir as mortes recentes na região. A única medida anunciada foi o envio de tropas à área de conflito, uma operação conjunta das Forças Armadas, da Força Nacional de Segurança e das Polícias Federal, Rodoviária Federal, Civil e Militar. A operação não tem data para começar.
O ministro da Justiça admitiu, após o encontro, que a montagem de uma operação militar é uma receita tradicional. Insistiu, porém, que , o governo não está "jogando palavras ao vento". "O momento é diferente. Apesar de ser uma ação do governo federal, estão envolvidos desta vez a Justiça e o Ministério Público", afirmou. Cardozo fez cobranças ao Judiciário e admitiu a necessidade de investimentos no Ministério Público e nas delegacias. "É preciso fazer inquéritos policiais e ações judiciais rápidos".
"Não é a primeira vez que se discute isso. Os crimes precisam ser esclarecidos e os culpados punidos", disse o governador do Pará, Simão Jatene, que era vice-governador em 1996 quando ocorreu o massacre de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás e governador em 2005, ano do assassinato da religiosa Dorothy Stang.
(Por Daniel Bramatti, O Estado de São Paulo, MST, 05/06/2011)