A presidente da República, Dilma Rousseff, determinou na tarde desta quinta-feira (26) a seus assessores que tomem providências para resolver os problemas decorrentes da contaminação por chumbo na cidade baiana de Santo Amaro da Purificação. Conforme o gabinete do senador Walter Pinheiro (PT-BA), Dilma se sensibilizou ao receber do parlamentar, e de seu colega Paulo Paim (PT-RS), um dossiê que mostra o quadro dramático vivido pela população de Santo Amaro.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado, Paim coordenou pela manhã, uma audiência pública destinada a ouvir vítimas da tragédia, estudiosos e políticos ligados à região do Recôncavo Baiano. Todos foram unânimes em descrever os aspectos trágicos de um processo de contaminação que se iniciou ainda nos anos 60 e se desdobra até hoje: cidadãos doentes e marginalizados, crianças com deformações, águas e subsolo comprometidos por chumbo e outros metais.
Calcula-se que a população da cidade está em 80% atingida pelos resíduos deixados por uma mineradora francesa, o que levou o deputado federal Luiz Alberto (PT-BA) a comparar o acidente ao vazamento na usina nuclear de Chernobyl, na Ucrânia.
Walter Pinheiro se disse tão chocado com um vídeo passado durante a reunião, ao ponto de desviar os olhos diante de algumas imagens. Ali mesmo anunciou, com o apoio de Paulo Paim, a intenção de levar a Dilma um dossiê sobre o desastre. À tarde, o documento foi repassado à presidente da República durante encontro com a bancada dos senadores do PT.
O dossiê entregue a Dilma inclui vídeo com imagens de pessoas acamadas e de recém-nascidos com graves deformações físicas. O senador Paim chegou a dizer que, em seus 65 anos de vida, nunca viu nada semelhante. Walter Pinheiro admitiu ter sido impactado pela contundência das imagens e que, por isso, evitou acompanhar todos os slides.
- São imagens que não dá para esquecer. Imaginem a situação de quem tem que lidar com isso no seu próprio corpo – exclamou.
Santo Amaro é considerada a cidade mais poluída por chumbo no mundo, de acordo com estudos da Universidade Federal da Bahia e outras instituições. Por mais de três décadas, a Companhia Brasileira de Chumbo (Cobrac), subsidiária da empresa francesa Penarroya Oxyde, despejou na cidade 490 mil toneladas de rejeitos contaminados por esse e outros metais perigosos (cádmio, mercúrio e outros). O chumbo é associado ao saturnismo, doença que afina braços, provoca dores agudas por todo o corpo, causa impotência sexual nos homens, além de aborto nas mulheres ou malformações severas nos filhos nascidos.
Desativada em 1993, a fábrica deixou um histórico de poluição e doença ainda sem o devido enfrentamento, como ficou patente nos depoimentos de diversos expositores. Mas Walter Pinheiro e Paim, que preside a CDH, se comprometeram em encaminhar agora um conjunto de medidas para que a questão de Santo Amaro passe a ser uma prioridade do governo federal, com ações que devem envolver as áreas de meio ambiente, saúde, justiça e até mesmo esforços no campo das relações exteriores.
- Nem Santo Amaro nem o estado da Bahia têm condições de resolver o problema. É um legado nefasto que só a União tem condições de assumir – argumentou Walter Pinheiro.
Um “PAC pela vida”
O senador foi o propositor da audiência, junto com os colegas da bancada da Bahia, Lídice da Mata (PSB) e João Durval (PDR). Além da entrega do dossiê a Dilma, ele defendeu ainda um debate com o “núcleo central” do governo diante da magnitude dos problemas que precisam ser enfrentados. Sugeriu para o caso um “PAC pela vida”, numa alusão ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que destaca os investimentos federais em infraestrutura. Depois, em entrevista, ele citou estudos que indicam a necessidade imediata de destinar cerca de R$ 300 milhões para as ações de descontaminação da cidade, atendimento em saúde, indenizações e aposentadorias especiais, entre outras.
Já para o senador Paim, se a Previdência já concedeu anistia a devedores, até mesmo para maus pagadores, não pode agora negar aposentadoria especial aos que estão contaminados e sem condições de trabalho. Paim é autor também de sugestão para que o Ministério das Relações Exteriores seja acionado para examinar possíveis responsabilidades do governo da França. O senador considerou a hipótese porque a Cobrac, a empresa contaminadora, que produzia lingotes de chumbo, pertencia à empresa francesa Penarroya Oxyde. A subsidiária foi depois incorporada ao Grupo Trevo e a multinacional Penarroya Oxide passou a fazer parte do Grupo Metaleurop.
- Quero que o presidente da França [Nicolas Sarkozy] venha ao Brasil e vá a Santo Amaro ver a realidade, e o Brasil tem igualmente de ver a situação. Não dá para manter a invisibilidade em relação a esses fatos – cobrou Paim.
(Por Gorette Brandão, Iara Farias Borges, Marco Reis e Nelson Oliveira, Agência Senado, EcoDebate, 01/06/2011)