O “Slow Fish”, em Gênova, na Itália, luta contra o empobrecimento do Mediterrâneo e pela biodiversidade gastronômica. Na mesa, os peixes “esquecidos” salvam o mar.
Três em cada 10 peixes são mortos por engano e são jogados de volta na água. Todos os anos, 250 mil tartarugas são mortas pelos ganchos destinados aos peixes-espada. Mais de 70% dos estoques populacionais de peixes da Europa progressivamente são empobrecidos pelo uso excessivo das redes.
Esse é o retrato de uma pesca insana que despovoa os mares, fazendo desaparecer as espécies mais procuradas, como o atum. Para curar os oceanos, a receita que será proposta nesta sexta-feira no Slow Fish, o evento organizado em Gênova pelo Slow Food, baseia-se no retorno à biodiversidade gastronômica, às tradições mediterrâneas que, ao longo dos séculos, criaram milhares de receitas para cozinhar os peixes que hoje foram esquecidos.
“No Mediterrâneo, há mais de 500 espécies de peixes, crustáceos e moluscos, mas o esforço de pesca está se concentrando em um leque restrito, dos atuns aos linguados, das lula aos robalos, que justamente por isso correm o risco de desaparecer”, diz Silvio Grego, biólogo marinho comprometido também no fronte da Academia Italiana da Cozinha. “Trazer novamente para a mesa as sardinhas, o peixe-espátula, o peixe-espada, os pequenos peixes significa voltar aos aromas e aos sabores da tradição, obtendo muitas vantagens”.
Romper a monocultura do atum e do robalo significa permitir que os animais com um ciclo de vida mais longo tenham o tempo de se reproduzir. Além disso, se obteria um claro benefício para a carteira, já que os peixes pobres custam quatro ou cinco vezes menos. E se limitaria o consumo das espécies maiores e mais longevas que, com o passar do tempo, acumulam nas suas carnes poluentes como os metais pesados.
Para se ter uma ideia do que perdemos, enquanto destruímos a riqueza do mar porque esquecemos do uso sábio, basta pensar que o peixe-sabre, ou peixe-espátula, base preciosa para os enroladinhos de peixe, é jogado fora na Sardenha, enquanto os pequenos peixes, muito apreciados na Sardenha, são jogados fora na Sicília.
No Slow Fish, será apresentada uma lista de peixes com o sinal vermelha e uma outra lista com o sinal verde. Serão rejeitadas as criações de camarões tropicais, porque contribuem para a destruição das florestas de mangue que defendem as costas dos ciclones e dos maremotos, e o salmão de criação (são necessários cinco quilos de ração para cada quilo de salmão, e os resíduos produzidos por uma criação de 200 mil animais são equivalentes aos esgotos de uma cidade de 60 mil pessoas). Serão promovidos, ao contrário, como exemplo de aquicultura sustentável, mexilhões e ostras, carpas e tainhas.
O alerta sobre o empobrecimento dos mares será relançado em Gênova também por Maria Damanaki, comissária europeia para a pesca. “Apresentaremos em julho a nossa proposta para tornar rastreável toda a cadeia de peixes”, declarou a comissária. “Quem for pego pescando ilegalmente perderá a licença. Além disso, daremos incentivos para melhorar os sistemas de detecção dos navios pesqueiros, a fim de favorecer os controles e os comportamentos responsáveis”. Haverá também a possibilidade de aumentar em 5% as cotas de pescado para os barcos que aceitarem ter a bordo câmeras de vídeo para controlar o conteúdo das redes.
“No Mar do Norte, metade do pescado é descartado no mar por ser considerado inutilizável”, lembra Domitila Senni, do Ocean 2012, coalizão de associações ambientalistas. “As novas propostas da Comissão parecem estar indo na direção certa, mas o tempo já expirou”.
“Sem uma ação coordenada dos 22 países às margens do Mediterrâneo, não podemos esperar para estancar a hemorragia de vida que atinge toda a bacia. Chegou o momento de estabelecer as regras para um governo da pesca”, propõe Carlo Petrini, presidente do Slow Food.
(La Repubblica, IHU On-line, Ecodebate, 30/05/2011)