Além de contribuir para a diminuição da erosão, a manutenção da palha da cana-de-açúcar na superfície de plantações que adotam o sistema de colheita mecanizada – a chamada cana crua ou verde – contribui significativamente para a redução das emissões de carbono do solo para a atmosfera na forma de gás carbônico.
A descoberta, feita por pesquisadores da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Jaboticabal, foi apresentada no Workshop do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).
O evento, que ocorreu nos dias 11 e 12 de maio, foi destinado aos coordenadores, pesquisadores principais, colaboradores associados e estudantes de cada um dos 17 projetos atualmente apoiados pelo PFPMCG e equipes de projetos apoiados pelos programas FAPESP-BIOEN e BIOTA-FAPESP.
Por meio do projeto de pesquisa “Impact of management practices on soil CO2 emission in sugarcane production areas, southern Brazil”, apoiado pela FAPESP, os pesquisadores da Unesp realizaram entre 2008 e 2010 quatro estudos de campo em lavouras de cana-de-açúcar, após a colheita mecanizada e por queimada na região de Jaboticabal, para entender melhor o balanço de emissões de gases de efeito estufa em áreas de plantação canavieira.
Os estudos de campo e os testes em laboratório com amostras de solo demonstraram que os valores médios de emissão de carbono do solo de áreas cuja colheita da cana foi realizada pelo sistema mecanizado foram significativamente menores do que aqueles onde a cultura foi colhida pelo sistema de queima, em que se elimina a palha.
Em um experimento realizado ao longo de 50 dias em uma plantação que foi dividida em três áreas – sendo uma coberta por 50% de palha, a segunda por 100% do resíduo e a terceira sem palha –, os pesquisadores observaram que as áreas cobertas por palha emitiram 400 quilos a menos de carbono (correspondente a quase 1,5 mil quilos de gás carbônico) do que as áreas onde a palha foi retirada.
“A retirada da palha da superfície de plantações de cana-de-açúcar causa emissões adicionais de carbono bastante significativas. Em um agrossistema que emite, no total, 3 mil quilos de dióxido de carbono, o aumento de mais 1,5 mil quilos do gás pela simples retirada da palha representa muito, e o solo seria a maior fonte de emissão”, disse o professor da Unesp e coordenador do projeto, Newton la Scala Júnior, à Agência FAPESP.
Segundo o pesquisador, que é membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais, uma das hipóteses para explicar por que a palha da cana-de-açúcar contribui para diminuir as emissões e reter o carbono do solo é que sua presença interfere nos ciclos de temperatura e umidade. Isso faz com que a temperatura no interior do solo caia e a umidade aumente, diminuindo a oxigenação e conservando a matéria orgânica no interior do solo.
Consequentemente, a umidade, a temperatura e as emissões de carbono em solos cobertos por palha costumam ser mais uniformes, enquanto nos solos sem palha as emissões variam mais, conforme demonstrou o experimento em campo. No experimento, a plantação de cana-de-açúcar foi dividida em três áreas com diferentes níveis de cobertura de palha e foram espalhados anéis de PVC em diferentes pontos para medir as emissões.
“Nas áreas de cana crua, onde havia palha sobre a superfície, o solo apresentou uma clara uniformidade de emissão de carbono. Já nas áreas de cana queimada foi observada maior variabilidade nos índices de emissão”, disse Scala.
De acordo com o pesquisador, era sabido que preparo do solo para o plantio da cana-de-açúcar, em que se faz uma intensa aração do terreno onde a cultivar será plantada, acelera muito as emissões de carbono do solo para a atmosfera. Mas não se sabia que a simples remoção da palha da superfície do solo também provocava emissões tão altas quanto as induzidas pelo preparo.
“No início do projeto, não achávamos que a magnitude da emissão seria tão grande”, disse Scala. Em plantações de cana-de-açúcar em que a colheita é feita da maneira mecanizada, de acordo com cálculos do pesquisador, a produção de palha pode chegar a 15 toneladas por hectare.
Algumas das alternativas de uso desse resíduo do cultivo da cana que estão sendo estudadas são utilizá-lo para produzir energia, usá-lo como matéria-prima para o etanol de segunda geração ou na alimentação animal. Mas, para os pesquisadores, a melhor utilidade seria mantê-lo mesmo sobre a superfície do solo dos canaviais, devido aos seus impactos no balanço geral de emissão de gases de efeito estufa no agrossistema canavieiro.
“É preciso tomar um certo cuidado com a remoção da palha porque, definitivamente, ela pode causar emissões adicionais de carbono do solo. E isso é algo que nos preocupa bastante”, disse.
(Por Elton Alisson, da Agência FAPESP, EcoDebate, 17/05/2011)