Cerca de 2000 moradores da cidade de Caetité realizaram neste domingo no inicio da noite uma vigília em protesto, “contra o lixo atômico e em defesa da vida”. O protesto foi uma iniciativa da Comissão Paroquial de Meio Ambiente de Caetité (Ba), da Comissão Pastoral da Terra, da Cáritas e do Movimento Paulo Jackson – Ética, Justiça, Cidadania após informação de que um comboio com containers de material radioativo estaria se deslocando de São Paulo com destino à região da mina de urânio em Caetité – Bahia.
A população, revoltada com o descaso e com a total desinformação por parte da INB acerca do conteúdo da tal carga radioativa, bloqueou a rodovia que liga Caetité ao distrito de Maniaçu, principal rota de acesso à área da mina de urânio, impedindo a passagem das carretas com os containers. Com o bloqueio da rodovia, as carretas se deslocaram partindo algumas em sentido a cidade de Lagoa Real e outras por estradas vicinais que dão acesso ao local da Mina. A população se manteve no local em vigília e com gritos de protesto.
Segundo os manifestantes, a preocupação agora é quanto ao caminho alternativo que está sendo buscado pelo comboio para desviar dos manifestantes, uma vez que as demais estradas de acesso à mina não oferecem condições que garanta a chegada do material com segurança, expondo ainda mais a população ao risco com um possível acidente.
As organizações envolvidas com o ato informaram que foi feito comunicado ao Ministro da Ciência e Tecnologia, ao Governador da Bahia, à Ministra de Meio Ambiente, ao Presidente do IBAMA, à Diretoria de Licenciamento Ambiental – DILIC, ao Superintendente do IBAMA / Bahia, à Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia, à Comissão Nacional de Energia Nuclear, à INB – Indústrias Nucleares do Brasil, à Polícia Federal, ao Ministério Público Federal da Bahia e ao Ministério Público Estadual da Bahia solicitando pedido de explicações e providências de acordo à competência de cada um, porém ainda não obteve nenhuma resposta.
Por volta das vinte e uma horas o Prefeito da cidade, José Barreira, compareceu ao local da manifestação e declarou publicamente que o mesmo não tinha nenhum conhecimento acerca da carga que estaria chegando ao município e afirmou que não permitirá que a mesma seja descarregada sem antes ter conhecimento do tipo de material transportado de quais os riscos oferece à população.
Antes cogitado para chegar na próxima semana, tudo indica que o comboio radioativo, possivelmente vindo de São Paulo, que chegaria à Bahia na próxima semana, foi antecipado para hoje, revoltando a população local que está se mobilizando para rejeitar a carga nuclear, que deverá passar pela sede do município, rumo ao distrito de Maniaçu. Os sindicatos de trabalhadores do Rio de Janeiro e de Brumado estão questionando a insegurança com que este transporte está sendo feito e os riscos que isto representa para os trabalhadores, as populações e o meio ambiente.
Na última quinta-feira, a Rádio Educadora Santana de Caetité tratou do assunto, levantando a possibilidade da carga radioativa, ser a mesma que saiu da cidade de Poços de Caldas (MG), na década de 1990, destinada a São Paulo a ser utilizada pela Marinha Brasileira em um projeto de submarino nuclear. Ainda segundo informações extra-oficiais, depois de usado no projeto, esse material ficou confinado em algum lugar da capital paulista (Interlagos?), até ser liberado para voltar a Poços de Caldas.
Em 2000, quando que a carga voltaria a Minas, o então governador, Itamar Franco, proibiu a entrada da carga radioativa no Estado, inclusive colocando um helicóptero para sobrevoar a área da INB, impedindo a entrada ou saída de caminhões com contêineres. Na quinta-feira passada, os microfones da Educadora de Caetité foram colocados à disposição da direção da INB e reservado o horário da sexta-feira para esclarecimentos, mas ninguém se pronunciou até o momento (http://www.icaetite.com.br). Organizações e movimentos sociais e populares de Caetité enviaram por e-mail e telefone a mensagem, transcrita abaixo, com pedido de explicações e providências às autoridades federais, estaduais e municipais dos três Poderes:
Salvador, 12 de maio de 2011
Ilmos. (as):
Sr. Aluisio Mercadante, Ministro da Ciência e Tecnologia
Sr. Jaques Wagner, Governador da Bahia
Sra. Izabella Mônica Vieira Teixeira, Ministra de Meio Ambiente
Sr. Curt Trennepohl, Presidente do IBAMA
Com cópia:
Diretoria de Licenciamento Ambiental – DILIC
Sr. Célio Costa Pinto, Superintendente do IBAMA / Bahia
Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia
Prefeitura Municipal de Caetité
Câmara de Vereadores de Caetité
Comissão Nacional de Energia Nuclear
Indústrias Nucleares do Brasil
Sindicato dos Mineradores de Brumado
Polícia Federal
Ministério Público Federal da Bahia
Ministério Público Estadual da Bahia
Ref: CHEGADA DE CARGA RADIOATIVA A CAETITÉ, NA BAHIA
Tomamos conhecimento de que chegará a Caetité uma carga de material radioativo, vindo de outro estado, que não sabemos a quê se destina.
Será lixo radioativo para ser depositado em Caetité?
Estarão trazendo material das antigas usinas paulistas, a USIN – que guarda cerca de 1.500 toneladas de Torta II (concentrado de urânio e tório) – e a USAM, que também guarda toneladas desse material atômico – ou do Planalto de Poços de Caldas, que estoca cerca de 12.500 toneladas de Torta II?
Estarão vindo lixo atômico das experiências da construção do submarino nuclear e mais toneladas de material radioativo de urânio, em diversas formas, do Centro Tecnológico da Marinha (Iperó-SP), para reprocessamento em Caetité?
Será que, devido ao gasto de 40 milhões de dólares com a importação de urânio, por causa da queda da produção de Caetité, querem “misturar” o minério caetiteense, de alto teor, com a Torta II (urânio de baixa qualidade), e, assim, colocar o produto no mercado externo, diminuindo o prejuízo?
Por que este material está vindo para Caetité?
Será Caetité um dos três municípios brasileiros que, segundo a CNEN, já se dispuseram a receber lixo atômico do Programa Nuclear Brasileiro, em troca de royalties e outras compensações financeiras, mistério mantido a sete chaves, pela CNEN, que não informa quais são esses municípios?
Quais riscos esta carga trará para o Município e os moradores da região?
Por se tratar de uma empresa federal, este material pode ser trazido sem que a comunidade seja previamente informada?
Autoridades rodoviárias dos estados, municípios e da União autorizaram o transporte, como define a Lei, e tomaram as providencias cabidas?
E a Prefeitura Municipal e o Estado da Bahia autorizaram a importação deste lixo?
Os órgãos fiscalizadores federais, estaduais e municipais não devem explicações à população de Caetité?
Porque o IBAMA ainda não divulgou o relatório da inspeção feita na Unidade de Concentração de Urânio, realizada em 4 e 5 de abril passado? O que será que viram os inspetores? Ou nada viram?
Tendo em vista a falta de transparência que caracteriza o setor nuclear, e considerando que o vazamento desta noticia levou grande intranqüilidade aos trabalhadores da INB e às populações da região, estamos solicitando a Vs. Sas., respostas urgentes a estas perguntas, que atormentam a comunidade, bem como pedimos esclarecimentos à Comissão Nacional de Energia Nuclear, à INB, ao Sindicato dos Mineradores de Brumado, ao Prefeito Municipal e Câmara de Vereadores de Caetité, ao Ibama e Superintendência desse órgão na Bahia e à Policia Federal, aos quais estamos enviando cópia desta mensagem.
Atenciosamente,
Adélia Alves de Brito Nunes
Comissão Paroquial de Meio Ambiente de Caetité
Zoraide Vilasboas
Associação Movimento Paulo Jackson- Ética, Justiça, Cidadania
Textos de Diacisio Ribeiro Leite, CPT Sul/Sudoeste-BA e Zoraide Vilasboas, Associação Movimento Paulo Jackson- Ética, Justiça, Cidadania, editados por Henrique Cortez, do Portal EcoDebate
(EcoDebate, 16/05/2011)