Nesta quarta-feira, o dia começou cedo no Congresso. Às 9h da manhã, o plenário já estava cheio: foi quando teve início a sessão extraordinária na qual seria votada a proposta dos ruralistas para o Código Florestal. Deputados, jornalistas e sociedade civil estavam lá em peso, e os parlamentares começaram a subir, um a um, no palanque para discursar sobre o assunto. Só uma ausência chamou atenção: a do próprio projeto que seria votado. Ninguém ali tinha a mais vaga ideia do que estava escrito no texto final.
A cena fala por si só: pouco importa o que está escrito na proposta. Maioria na Câmara, a bancada ruralista arbitrariamente deu por encerrado o debate sobre o Código Florestal e tentou, mais uma vez, votar na marra a lei que vai definir o futuro do Brasil. Construída por seus pares e redigido pelo neoruralista deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), a proposta original abre espaço para mais desmatamento e garante impunidade a quem cometeu crimes ambientais.
Olhando de longe, parece que todos os lados conseguiram um acordo. Mas basta chegar mais perto para ver que o assunto ainda gera infinitas perguntas e críticas de todos os lados. Inclusive do governo. Desde a semana passada, alguns braços direito da presidente Dilma Rousseff são vistos com frequência pelos corredores da Câmara. Os ministros Antônio Palocci, da Casa Civil, Izabella Teixeira, do Meio Ambiente, e o vice-presidente Michel Temer entram e saem de reuniões tentando um consenso na proposta.
A ciência fez seu papel. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) entregaram aos parlamentares um extenso estudo que mostra como a produção agropecuária depende da preservação das florestas. A agricultura familiar também se posicionou, pedindo o fim do desmatamento e o tratamento diferenciado a eles.
Relator do projeto, Aldo Rebelo encontrou com cada um desses atores. Mas, ao que parece, as conversas entraram por um ouvido e saíram pelo outro. Ele reescreveu umas linhas na proposta, mas continuou recebendo uma saraivada de críticas: a anistia aos desmatadores e as brechas para mais destruição não saem das entrelinhas. A teimosia de Aldo fez com que o processo emperrasse uma série de vezes. Uma mostra clara de que essa discussão atropelada está para lá de imatura e que o país está sendo vítima de uma temeridade, com a Câmara aprovando de forma açodada uma mudança na legislação ambiental que pode trazer impactos negativos ao Brasil pelos próximos 1000 anos.
Muito mais que um emaranhado de artigos, parágrafos e letras, o Código Florestal diz respeito ao Brasil que queremos ser no futuro: uma nação que devastou seus recursos naturais em nome do lucro de poucos ou a primeira potência econômica e ambiental do planeta?
Nos últimos anos, demos alguns sinais de que podemos alcançar a segunda opção. O desmatamento na Amazônia teve uma queda jamais vista, e assumimos internacionalmente o compromisso de reduzir nossas emissões – que vêm principalmente da destruição das nossas florestas.
Caso o Código Florestal dos ruralistas seja aprovado e o desmatamento volte a subir, Dilma vai ter que se explicar não só para os brasileiros, mas para o mundo. Ela já percebeu isso, tanto que enviou seus ministros para acompanhar a discussão no Congresso. Mas não adiantou. É hora de a presidente desligar, de vez, a motosserra do Congresso e puxar o Brasil para um futuro verde, limpo e rico. Para nós mesmos e para as próximas gerações.
(Greenpeace Brasil, 11/05/2011)