Acampamento segue até quinta-feira (5), quando povos definirão lista de reivindicações para apresentar ao governo federal
Povos indígenas de todo o país ocupam a Esplanada dos Ministérios, em Brasília, no Acampamento Terra Livre 2011. Local de manifestação e abrigo para os índios brasileiros, o evento, organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), está em sua oitava edição.
A principal mobilização do Movimento Indígena Brasileiro teve início na madrugada desta segunda-feira, 2 de maio, e segue até a próxima quinta-feira. Integrantes de pelo menos 70 povos levantaram barracas para exigir do governo federal e da Fundação Nacional do Índio (Funai) que as leis protetoras dos direitos indígenas sejam respeitadas.
O secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), José Éden Magalhães, frisou o apoio da entidade ao Terra Livre como espaço de unidade do movimento indígena preocupado com as mais variadas formas de agressão aos territórios das comunidades.
“Acreditamos que outro mundo é possível com os indígenas”, disse. Para ele, os grandes empreendimentos, como a usina de Belo Monte, no Pará, a falta de demarcações das terras indígenas e a criminalização das lideranças são formas de alienar direitos tradicionais e constitucionais dos povos.
A sociedade envolvente cada vez mais encara a construção de barragens e a expansão do agronegócio como sinais de desenvolvimento nacional. No entanto, os indígenas não veem dessa maneira. “A construção de uma hidrelétrica faz com que tudo o que esteja ao redor fique debaixo da água. Como poderemos viver sem nossas florestas? Todo um ciclo da cultura indígena está ali. Desde os nossos antepassados aos animais e aos remédios naturais”, disse Kretã Kaingang.
Vida sob a lona
O ataque aos povos indígenas afeta de maneira semelhante comunidades de todo o Brasil. Algumas situações, porém, revelam o tamanho do descaso das autoridades governamentais, sobretudo da Funai. Os Guarani do Rio Grande do Sul, por não terem terras suficientes demarcadas e homologadas, sobrevivem à beira das rodovias sob barracos de saco preto e lona. Cerca de três mil Guarani estão espalhados pelo estado. Situação também vivenciada pelos Guarani do Mato Grosso do Sul.
Maurício Guarani é uma das lideranças de seu povo. Ele explica que algumas terras foram demarcadas, “mas são muito pequenas e nossa população aumentou (...) nessas terras meu povo também não consegue plantar o alimento”. A vida dos Guarani sob a lona no estado está às margens das rodovias BR-101, BR-116, BR-290 e BR-040. O povo sobrevive sem água potável, assistência médica, o alimento é escasso e falta saneamento básico.
“O Terra Livre é um momento importante de mostrar tudo isso para a presidente Dilma (Roussef) e exigir que nossos direitos sejam respeitados. É o grito Guarani e de todos os povos do país”, afirmou Maurício.
Belo Monte, Bela Morte
No Pará, o desafio dos povos é combater a construção da usina de Belo Monte. Josinei Arara vive com sua comunidade na chamada Volta Grande do Xingu. O empreendimento acabará com a aldeia onde vive, além de outras 29 na região. Para ele, a usina irá destruir a floresta e isso afetará inclusive comunidades que não irão para debaixo da água.
“Não queremos nada que venha destruir nossa Amazônia, nossa floresta. Dela tiramos nossa cultura. Temos de preservá-la para nossos filhos e netos. Vamos lutar até o fim”, salientou. Belo Monte é outra pauta na lista de reivindicações do Terra Livre. A usina se tornou um símbolo, ao lado das prisões e assassinatos de lideranças indígenas, do quanto o governo federal passa por cima de direitos garantidos por lei. A Funai chegou a forjar uma consulta aos povos para a construção da usina.
Josinei Arara relata ameaças sofridas por colonos: “Falam que vão incendiar a aldeia”. Toda pressão sofrida pelos indígenas, inclusive da Polícia Federal como na Serra do Padeiro, sul da Bahia, local onde vive o povo Tupinambá, aumenta cada vez mais. Na plenária do Terra Livre, depoimentos de várias lideranças corroboram com as notícias de assassinatos, mandados de prisão e ameaças de morte.
Neguinho Truká vive com seu povo em Pernambuco. A transposição do rio São Francisco é o empreendimento que põe em risco as aldeias Truká. “Desde 2005 estamos lutando pela demarcação. Com a transposição estima-se que 385 mil hectares de caatinga serão desmatados”, diz. Neguinho relata que uma base do Exército Brasileiro está instalada nas terras Truká como forma de intimidar seu povo.
A resistência acaba sendo a única saída dos povos contra o ataque aos seus direitos. “Os federais somos nós (indígenas). Mas se os federais quiserem vir nos tirar das terras, nós temos as bordunas (espécie de bastão de madeira) para eles”, afirma Isabel Apinajé, do Tocantins.
Evento ao vivo na internet
O Terra Livre pode ser acompanhado, ao vivo, pela internet no endereço eletrônico http://www.ustream.tv/channel/atlindigena
Veja fotos na página do Cimi http://www.cimi.org.br/modules/gallery/show.php?id=1069
(Brasil de Fato, 04/05/2011)